Um dos temas que vai ser discutido neste congresso da CIRA é a gestão florestal qualificada. Assim, na sexta-feira vão debater-se soluções relativas à produção qualificada da biomassa, a investigação na área da floresta e a própria produção industrial, as quais se inserem na vida da região, que alberga no seu território estas três valências. Luís Sarabando, coordenador da Associação Florestal do Baixo Vouga (AFBV), é um dos oradores que vai fazer parte do painel para debater este tema.
Entrevistámos o responsável da AFBV e perguntámos o que está a ser feito na região de Aveiro para tornar a gestão florestal mais qualificada. Luís Sarabando responde que a qualificação da floresta passa sobretudo "pela qualificação dos agentes da fileira": produtores, empresas e entidades, pois são as suas ações futuras que promovem as melhorias na qualidade da floresta e do funcionamento do setor. Neste sentido, "a AFBV promove há 20 anos inúmeras ações de informação e formação dos proprietários, esperando que desenvolvam no terreno as práticas florestais mais corretas e adequadas, que compreendam a racionalidade dos seus investimentos e os impactos das suas ações ao encontro das exigências da sociedade atual".
Luís Sarabando informa que a região de Aveiro é igualmente das regiões mais dinâmicas ao nível da Certificação Florestal. Este processo garante que "as matas em questão são geridas de forma responsável, utilizando boas práticas e respeitando o contexto socioeconómico em que se inserem". "A AFBV é, desde 2009, dinamizadora da primeira iniciativa regional de Certificação Florestal no país", acrescenta.
A qualificação das empresas florestais tem sido igualmente aposta formativa já que "são elas que executam a maior parte dos serviços de gestão e exploração, desde a plantação até à colheita final das madeiras". E a região faz um bom percurso "no relacionamento interinstitucional" para que todos os envolvidos compreendam "a importância do seu papel e funções no melhor funcionamento da fileira". A sensibilização do público infantil e juvenil para a importância da floresta não está esquecida, existindo múltiplos projetos, como o Floresta Viva: Educação Florestal pelas Artes.
Sobre as novas apostas na produção na região para tornar a mesma mais sustentável, Luís Sarabando explica que a tendência é para uma "maior valorização das funções sociais da floresta, em que os serviços de recreio e ambientais se sobrepõem aos de produção". "Historicamente, a região de Aveiro possui uma influência forte da floresta de produção à base de eucalipto, motivada pela boa aptidão de solos e clima, boa organização dos produtores e empresas, e localização central no país e na bacia de abastecimento de uma das principais indústrias de pasta e papel".
O coordenador reconhece que houve "excessos na utilização massiva da espécie eucalipto", mas a região não deve menosprezar o seu potencial produtivo, pois não existirão condições socioeconómicas para alterar este contexto nos próximos 20 a 30 anos. Logo tem de se trabalhar na consolidação de novos conceitos que permitam "compartimentar a paisagem atual através da recuperação da rede ecológica e ainda da implementação de rede de proteção civil".
É preciso apostar no turismo ambiental, na introdução de espécies como o sobreiro, o pinheiro-manso, o medronheiro, os frutos secos e não só, diz, relembrando ainda que são os produtores florestais que mais valorizam a floresta, contudo a responsabilidade não pode ficar só nas suas mãos. "É necessário que os governos reconheçam essas mais-valias e criem condições justas para que possam ser uma realidade."
A investigação na área
Questionado sobre o que está a ser feito ao nível de investigação na área da floresta e qual tem sido o papel da AFBV, responde que um dos grandes desafios será "encontrar alternativas de utilização para os produtos da floresta, de base sustentável, em substituição de produtos com processos produtivos altamente poluentes - algodão, plásticos, combustíveis, entre outros".
A AFBV tem-se concentrado na participação em parcerias de investigação relacionadas com o processo de gestão florestal: melhoramento genético e melhoria de produtividade de povoamentos, redução ou mitigação de impactos negativos da gestão, redução de químicos no ciclo produtivo, controlo biotécnico de pragas e doenças, entre outros.
A Associação gostaria também muito de avançar no curto prazo com um projeto na área da sociologia, procurando estudar novos modelos de relacionamento e motivação dos proprietários que permitam ultrapassar uma das principais características da propriedade florestal da região: o Minifúndio.
"Possuímos já várias iniciativas de 'Áreas Florestais Agrupadas', que poderiam ser o ponto de partida. Nestes projetos, os proprietários compreenderam que a gestão das pequenas parcelas não é atrativa nem possível de gerir de forma consciente, responsável e eficiente, e ainda que é obrigatório passar para uma escala de gestão mais alargada, isto é, em conjunto com os proprietários confinantes".
Os três casos de sucesso em Águeda e Vagos deixam à AFBV o desafio de "procurar conhecer as razões e motivações diferenciadas destes conjuntos de proprietários".
No que diz respeito à importância da biomassa florestal para o ambiente, pode, na região, "constituir um importante recurso energético em substituição de outras energias poluentes, por se tratar de um abundante recurso endógeno".
Em determinados contextos, a biomassa poderá ainda ser um complemento de rendimento aos produtores permitindo viabilizar a gestão das suas florestas, com todos os benefícios que daí advém, nomeadamente ao nível da redução de risco de propagação de incêndios.
"Alertamos que a biomassa florestal não deverá nunca ser olhada como principal objetivo de gestão, nem deve ser encarada como a solução para os incêndios florestais, uma vez que os matos (principal condutor dos incêndios) não possuem potencial energético nem viabilidade económica na sua recolha". Luís Sarabando acrescenta que não se deve igualmente esquecer que os solos florestais são por natureza pobres e que a retirada total da biomassa pode comprometer as produtividades futuras bem como facilitar processos erosivos do solo.
O que é a AFBV?
A Associação Florestal do Baixo Vouga é uma instituição privada de proprietários florestais, sem fins lucrativos, cujo objetivo é promover a boa gestão e a defesa da floresta da região de Aveiro. Tem 1.300 associados, que representam mais de 20% da mancha florestal na região. A AFBV tem duas funções principais:
1. Representar os interesses dos associados junto de entidades públicas, mercados, empresas, e não só. Um papel difícil pois as políticas públicas e os mercados nem sempre têm seguido um papel lógico e nem se lembram que existe um ator principal na base do setor – o produtor florestal. Nesta via, a AFBV tenta valorizar e dignificar a figura do pequeno produtor florestal que gere a floresta, guarda a natureza, luta para subsistir e mantém as suas propriedades cuidadas, beneficiando a sociedade;
2. Dar apoio técnico na gestão das áreas florestais dos seus associados em toda a linha de gestão e exploração, desde a plantação até à venda final das madeiras.