
O debate “Como levar o luxo português para o mundo” contou com a participação de Américo Pinheiro, Claire Chung, Maria João Bahia, Margarida Correia, e Nuno Barra. A moderação foi da jornalista Marisa Caetano Antunes.
Portugal é um país com marcas de excelência, saber-fazer único e uma tradição artesanal de décadas, mas continua a lutar pelo reconhecimento global que tantas vezes parece escapar-lhe. O debate dedicado aos caminhos, obstáculos e oportunidades para levar o luxo nacional além-fronteiras, incluído na “Grande Conferência Negócios do Luxo”, organizada pelo Negócios e pela Must, com o apoio do município de Cascais como anfitrião e do Sheraton Cascais Resort como hospitality partner, contou com a participação de Américo Pinheiro, CEO das Tapeçarias Ferreira de Sá, Claire Chung, CEO da Ignae, Maria João Baía, designer, Margarida Correia, CEO da Amorim Luxury, e Nuno Barra, vice-presidente do Conselho de Administração da Vista Alegre Atlantis. A moderação foi de Marisa Caetano Antunes, jornalista do Now.
O produto existe. Mas basta isso?
A certeza de que Portugal tem produto de excelência esteve presente em todas as intervenções. “Somos o maior produtor europeu de tapeçarias de luxo”, afirmou Américo Pinheiro, CEO das Tapeçarias Ferreira de Sá, que trabalha com marcas como Hermès ou Chanel. “No segmento do home luxury, o tapete define o ambiente, e nós fazemos parte dessa definição.”
A mesma confiança partilhou Nuno Barra, vice-presidente do conselho de administração da Vista Alegre Atlantis, uma marca com mais de 200 anos de história. “O reconhecimento da qualidade nunca foi o problema. A dificuldade está na notoriedade fora de portas. Lá fora, começamos do zero.” A empresa exporta cerca de 60% do seu volume de negócios, mas, como explicou, esse crescimento foi fruto de persistência, investimento e uma base sólida. “O produto sempre foi muito bom. Mas a internacionalização exige também capacidade financeira e projeção.”
O desafio, no entanto, não é apenas externo. Também dentro de portas, o reconhecimento do valor do trabalho nacional continua frágil. Margarida Correia, CEO da Amorim Luxury, que detém as marcas Fashion Clinic, Paula e House of Capricorn, explicou que “é muitas vezes mais fácil para um estrangeiro reconhecer o valor do nosso trabalho do que para um português.” Segundo Margarida Correia, isso está ligado a uma certa familiaridade que desvaloriza o que é nosso: “Há quem veja certas peças como algo que já existia na casa da avó ou da tia.”
Esse desfasamento entre o valor simbólico e a perceção do consumidor nacional pode ser um entrave sério à construção de marcas com identidade forte e, consequentemente, à sua projeção internacional.
Ir para fora: entre vontade, estrutura e continuidade
Para quem já está presente noutros mercados, como Maria João Bahia, com pontos de venda em Gstaad, Zurique e Cannes, o maior desafio não está em chegar, mas em manter. “O acesso até pode ser facilitado por parcerias. O difícil é garantir a continuidade. Isso exige estratégia, comunicação e marketing dirigidos a cada mercado.”
Claire Chung, CEO da marca de cosmética de luxo sustentável Ignae, acrescentou uma nota importante: “Portugal é um país mais complicado para escalar marcas. Não basta ter bom produto, faltam infraestruturas básicas para apoiar este crescimento.” Claire defendeu a ideia de um trabalho conjunto: país e marcas a trabalharem como um ecossistema. “O potencial está cá. Mas tem de haver união. É o momento certo.”
Mudanças de perceção e novos hábitos
O conceito de luxo também está em mutação. Margarida Correia apontou para um dos efeitos mais claros da pandemia: “Houve um shift do luxo pessoal para o luxo na casa. As pessoas passaram a valorizar mais o conforto quotidiano.”
Já Maria João Bahia lembrou que o luxo continua a ter um papel simbólico importante. “Dá satisfação, segurança e confiança ao consumidor. É mais do que consumo, é também afirmação.”
Para marcas portuguesas que procuram afirmar-se globalmente, esta mudança nos hábitos de consumo pode ser uma oportunidade - se forem capazes de comunicar não apenas a qualidade dos produtos, mas também a sua história, autenticidade e ligação ao território.
Levar o luxo português para o mundo é possível, mas exige estratégia, colaboração e persistência. Não basta produzir com excelência: é preciso comunicar com consistência, educar o mercado e criar pontes culturais. Como ficou claro neste debate, o luxo português tem futuro, desde que Portugal o saiba reconhecer, dentro e fora de portas.