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Nuno Garoupa: “Portugal precisa de qualidade nas políticas públicas”

Nuno Garoupa considerou que todos os indicadores dizem sistematicamente o mesmo, “estamos iguais ou piorámos nestes 30 anos em matéria de custos de contexto”.

11 de Julho de 2025 às 15:30
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“Todas as economias têm custos de contexto, que são inerentes ao contexto social institucional onde a economia se desenvolve”, afirmou Nuno Garoupa, professor na Universidade George Mason, EUA, e presidente da European Association of Law & Economics, na sua intervenção intitulada “Persistência Estrutural dos Custos de Contexto”, na conferência Economia Sem Fronteiras: Portugal 2050, organizada pelo Now e pelo Negócios. Para Nuno Garoupa, seria importante perceber até que ponto os custos de contexto explicam “a estagnação económica dos últimos 25 anos”, em que Portugal registou “taxas de crescimento de 1% ou 1,5%”, contrastando com os desejáveis 3% ou 4%.

Os custos de contexto que, nas últimas três décadas, inibem o crescimento estão bem identificados e, para isso, recorreu ao relatório de Michael Porter, apresentado em maio de 1994, relativamente ao papel do Estado como agente que deve fomentar a competitividade na economia.

Este relatório elenca “o contexto legislativo, nomeadamente a legislação laboral e a estabilidade, e a legislação fiscal, que continuam recorrentemente a ser um problema, a questão da burocracia, licenciamentos e mecanismos de controlo ex-ante à atividade económica, a questão da resolução de conflitos e o problema da justiça e, finalmente, utiliza uma palavra que é: Portugal precisa de qualidade nas políticas públicas, em particular as políticas verticais, ou seja, aquelas que permitem coerência de longo prazo”.

Falhas de política pública

Nuno Garoupa assinalou que se faz a reforma dos mecanismos de controlo ex-ante, mas “ninguém sabe dizer ao país o que ganhámos em 30 anos com esses nove programas Simplex”, revelando uma cultura de formalismo legislativo, de legislação não regulamentada e de proliferação confusa de normas, incluindo as europeias. E concluiu que todos os indicadores dizem sistematicamente o mesmo, “estamos iguais ou piorámos nestes 30 anos em matéria de custos de contexto”.

O professor e invetigador salientou que a substituição do controlo ex-ante por um controlo ex-post implica mudanças no sistema de justiça, “porque se não vamos ter responsabilização ex-ante, temos que ter responsabilização ex-post”. Deu como exemplo a reforma da Autoridade Tributária em 2005, que não foi acompanhada pela reforma dos Tribunais Administrativos e Fiscais, o que agravou os problemas na área administrativa e legal. “É um exemplo de como uma boa ideia é mal executada por falhas de políticas públicas”.

Relativamente aos grandes problemas da criminalidade económica e financeira, proliferam os planos anticorrupção, mas os resultados continuam aquém do esperado. “Cinco planos, mais de 200 medidas, três instituições criadas”. Mecanismos alternativos de resolução de conflitos existem, mas são somente complementares. A criação de tribunais especializados também não revelou, até hoje, “impacto visível na qualidade da regulação” e “a avaliação legislativa, perspetiva e retrospetiva das políticas públicas e da legislação está prometida pelo Governo português na agenda de Lisboa em 2000, mas não existe”.

As reformas desaparecem sem ninguém as enterrar

“Não há nenhum momento de reflexão relativamente ao que já foi feito”, afirmou Susana Peralta, economista e professora da Nova SBE, durante a mesa-redonda sobre Custos de Contexto, com Nuno Garoupa, e que contou com a moderação de Miguel Frasquilho, curador da conferência.

Temos esta crença, um bocadinho de pensamento mágico, que conseguimos implementar novos planos sem recursos, ou seja, pessoas, dinheiro e sistemas de informação. Susana Peralta, Economista e Professora na Nova SBE

Susana Peralta deu o exemplo do Plano Nacional Anticorrupção 2020-2024, que “está cheio de boas intenções, mas nada daquilo está quantificado, não há prazos nem calendário de implementação. Depois temos esta crença, um bocadinho de pensamento mágico, que é que conseguimos implementar novos planos sem recursos, ou seja, pessoas, dinheiro e sistemas de informação”.

A explicação de Susana Peralta para esta situação é a existência de “uma grande captura do nosso sistema democrático por interesses a quem convém este Estado pouco transparente e pouco escrutinável das nossas políticas públicas”. Adianta que os custos de contexto que as empresas mais assinalam são o sistema judicial e os licenciamentos, designadamente o ambiental. Mas, como assinalou, “é um caso clássico em que há grupos que ganham muito e têm muito a ganhar com a manutenção do status quo”. Na sua opinião, os interesses instalados ou os lobbies setoriais “estão entrosados no próprio sistema político”.

Não estudamos nada e, portanto, não sabemos por que é que as políticas falharam no passado, respondemos com impulsos do momento. Nuno Garoupa, Professor na Universidade George Mason, EUA, e Presidente da European Association of Law & Economics

Nuno Garoupa reforçou a ideia de que Portugal sofre de uma “enorme ineficácia relativa, porque algumas das políticas que aplicámos não são muito diferentes de outros países. Mas houve países que fizeram melhor e não acompanhámos esse desenvolvimento”. A ausência de avaliação e continuidade das políticas públicas foi identificada como um problema estrutural. “Não estudamos nada e, portanto, não sabemos por que é que as políticas falharam no passado, respondemos com impulsos do momento”, concluiu Nuno Garoupa.

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