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Crise dos motores europeus ameaça futuro

França e Alemanha, os tradicionais pilares da construção europeia, atravessam crises estruturais profundas que colocam em risco o projeto de integração europeia.

16:00
António Mendonça alertou para o esgotamento do modelo económico alemão e para a crise simultânea da Alemanha e da França, que ameaça o motor económico da Europa.
António Mendonça alertou para o esgotamento do modelo económico alemão e para a crise simultânea da Alemanha e da França, que ameaça o motor económico da Europa. David Cabral Santos
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António Mendonça alertou para o esgotamento do modelo económico alemão e para a crise simultânea da Alemanha e da França, que ameaça o motor económico da Europa.

“O modelo alemão esgotou-se”, afirmou António Mendonça, bastonário da Ordem dos Economistas e professor do ISEG, no debate “Os Desafios da Europa num Mundo Dominado por Trump”, integrado na Grande Conferência ‘O Futuro dos Mercados Financeiros’, organizada pelo Jornal de Negócios e pelo Banco Carregosa. Explicou que este modelo “se desenvolve de forma corporativa, em que os setores industriais tradicionais estão associados aos bancos dos Länder e ao próprio poder político” e recomendou a leitura do livro “Kaput - O fim do Milagre Alemão”, de Wolfgang Münchau.

A Europa enfrenta uma encruzilhada existencial que pode definir a sua irrelevância no século XXI. António Mendonça, Bastonário da Ordem dos Economistas e professor do ISEG

A crise tem causas múltiplas. “A Alemanha dependia de energia barata, que tinha conseguido alcançar nas relações e nos Nord Streams e, de repente, passou a pagar energia quatro ou cinco vezes mais cara”, disse António Mendonça. Mas o problema vai além da energia. “O modelo alemão desenvolve-se com base na economia anterior à Segunda Guerra Mundial, projetou-se, evoluiu e acabou por se esgotar, contando hoje com poucas novas tecnologias”. E dá como exemplo sintomático que enquanto “Portugal apostou na fibra ótica”, os alemães “desenvolveram o fio de cobre” Por sua vez, “a França está numa crise também, que tem expressões políticas, mas que mais não são do que a expressão da crise económica”, diagnosticou António Mendonça. Os números são preocupantes. “O défice disparou, a dívida também”. E a conclusão é inevitável. “É evidente que eles não vão cumprir nada dos critérios da União Europeia”.

Dupla crise

Esta dupla crise é particularmente grave porque, como sublinhou o analista, “a Europa tem sido construída em função da conjugação do interesse da França e da Alemanha”. Com ambos os países em crise, o motor europeu está gripado. Afirmou ainda que a Europa, quando se olha para o mapa, “é uma península pequena da Ásia, um prolongamento”. A fragmentação de interesses agrava tudo, porque “temos os interesses do Norte, os interesses do Sul, os interesses alemães, os interesses franceses”. O orçamento comum é 2% do PIB europeu, o que é quase nada. Citando o relatório Draghi, António Mendonça identificou três necessidades críticas “velocidade, escala e intensidade”. O contraste com os Estados Unidos é gritante. “Donald Trump faz 10 decretos no fim de semana. A Europa demora anos a tomar decisões, assim não vai lá”. Esta procrastinação institucional de “empurrar com a barriga é fatal num mundo em rápida transformação”. O think tank Bruegel produziu três cenários possíveis para a Europa, segundo António Mendonça. O mais revelador é o segundo, “a constituição de três blocos”. É aqui que surge o problema. “A Europa nem sabe onde é que se posiciona. Depende de como os americanos nos tratem”. A conclusão, no seu entender, é clara. “Sem os seus motores tradicionais a funcionar, sem identidade comum, sem capacidade de decisão rápida e dependente das escolhas de outros, a Europa enfrenta uma encruzilhada existencial que pode definir a sua irrelevância no século XXI”.

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