No nosso artigo anterior, estabelecemos a importância crucial de dimensionar a posição, incluindo regras práticas para modular o risco. Hoje discutimos a consequência extrema de ignorar tais regras: o risco de ruína. Não é um conceito meramente académico. É um risco real. No Jogo da Bolsa, perder 90% da carteira virtual na primeira ou segunda semana significa sair da corrida da classificação geral. Nos investimentos com capital real, as consequências podem ser permanentes. Por ruína, não entendemos necessariamente a perda total do capital investido; basta um “drawdown” suficientemente pronunciado para nos colocar, na prática, fora do jogo.
O risco de ruína resulta da interação de três variáveis: a taxa de acerto, a relação ganho/perda e a fração do capital arriscado por trade. Separadas, pouco dizem. Mas juntas, definem as expectativas e a trajetória. Um sistema que acerta “apenas” 40% das vezes pode ser viável desde que a média dos ganhos seja da ordem de duas vezes a média das perdas. De modo semelhante, um sistema que acerte 60% das vezes pode, na verdade, ser perdedor caso os ganhos sejam demasiado pequenos. A matemática da recuperação é assimétrica e brutal. Uma perda moderada de 10% requer um ganho de cerca de 11.1% para recuperar. Já uma perda de 50% exige ganhos de 100%, ou seja, duplicar o capital remanescente. E uma perda de 90%? Já serão precisos ganhos astronómicos de 900% para voltar ao ponto de partida. Finalmente, a terceira variável pode funcionar qual acelerador para a ruína. Mesmo com um sistema com taxas de acerto de 60%, uma sequência de 5 perdas consecutivas é estatisticamente “normal”. Se o trader arriscar 10% do capital em cada tentativa, essa série “normal” representa um “drawdown” de mais de 40%. E cenários ainda mais extremos são perfeitamente plausíveis.
A primeira defesa é, como já vimos, a regra de limitar o capital arriscado por trade (por exemplo, 1 ou 2%). Como segunda linha de defesa, pode (e deve) adicionar “disjuntores” de carteira. Por exemplo, introduzir um limite de perda total dentro de um período definido (semanal ou mensal). Se for atingido, é sinal para parar, afastar-se e repensar a estratégia. Uma regra deste tipo não protege apenas o capital de uma sequência fatal, mas também a componente emocional, forçando uma pausa estratégica.
Este é também o momento para expandir sobre o Critério de Kelly. A fórmula de Kelly procura maximizar a taxa de crescimento logarítmico do capital, calculando a fração ótima com base na probabilidade de ganhar (P) e no rácio entre ganho e perda (R). O problema prático é que, no contexto dos mercados, P e R nunca são verdadeiramente conhecidos. São estimativas. E um pequeno erro de estimativa pode levar a fórmula a sugerir uma fração de risco demasiado agressiva, fazendo explodir o risco de ruína. Aqui, a solução é adotar Kelly fracionado. O conceito é simples: em vez de aplicar 100% da fração do capital sugerido por Kelly, aplicar apenas uma porção (25 a 50%) desse valor. Trata-se de um compromisso: sacrificar alguma velocidade no potencial crescimento da carteira a troco de uma redução drástica na volatilidade da mesma e no risco de ruína.
No final, quando discutimos risco de ruína, o objetivo não é evitar todas as perdas. É evitar o tipo de perda que nos tira do jogo. No Jogo da Bolsa, sobreviver às primeiras semanas é a condição para poder ganhar um dos prémios da geral. Na negociação real, é a estratégia para garantir que os nossos investimentos têm futuro.