O responsável pelo serviço de consultoria do Banco Carregosa, Miguel Ricon Ferraz, propôs uma visão estruturada da cadeia de valor, sublinhando que “a inteligência artificial não é a Nvidia”. Apesar da importância da empresa de chips, com uma perspetiva de receitas de 200 mil milhões para 2025, salientou no debate “IA nos Mercados Financeiros: Revolução ou Risco?”, integrado na Grande Conferência ‘O Futuro dos Mercados Financeiros’, organizada pelo Jornal de Negócios e pelo Banco Carregosa, que teve lugar no ISCTE, que a oportunidade de investimento é muito mais ampla, identificando nessa cadeia de valor, “os AI enablers, os capacitadores e os capacitados. Do lado dos capacitadores, apontou três pilares fundamentais, os hyperscalers “Google Cloud, Azure e o AWS da Amazon”, as infraestruturas “ligadas à rede energética” e as plataformas “que conectam estas infraestruturas e os hyperscalers aos aplicativos”. Do outro lado, explicou, estão “os enabled, aqueles que são capacitados pela IA e que são empresas presentes na economia real, diretamente ligadas ao consumidor”, afirmou Miguel Ricon Ferraz. Estas empresas beneficiarão através de “dois fluxos principais, aumento de receitas e redução de custos”. Os números do investimento das grandes tecnológicas são impressionantes. “Quatro das cinco maiores empresas têm um Capex estimado por ano acima dos 300 mil milhões de dólares”, revelou, detalhando que “a Amazon ronda os 100 mil milhões, a Microsoft 80 mil milhões, a Google 90 mil milhões e a Meta um pouco atrás, com 72 mil milhões de dólares”. Este volume de investimento reflete “um certo receio por parte destas empresas de ficarem para trás”. No entanto, o analista traçou paralelos históricos tranquilizadores. “Se olharmos para a história, isto não passa de mais um processo natural de criação de uma infraestrutura que todos irão utilizar. Aconteceu o mesmo com os caminhos de ferro, tanto nos Estados Unidos como no Reino Unido, e também com os cabos de fibra ótica no início dos anos 2000”. Apesar das comparações com bolhas passadas, Miguel Ricon Ferraz defendeu que “desta vez existe uma noção de precaução muito maior relativamente à questão do investimento em IA”. E os números apoiam essa tese. “Os lucros têm acompanhado os índices, o que era a grande prova de que os investidores estavam atentos. As avaliações estão longe daquilo que foi a bolha dos anos 2000”.
Democratização tecnológica Sobre o impacto do ChatGPT desde outubro de 2022, Miguel Ricon Ferraz foi claro. “Acaba por democratizar uma tecnologia tão poderosa como a inteligência artificial, porque passa a estar disponível para toda a gente, não apenas para quem sabia programar, mas também para quem tem apenas a capacidade de ler, escrever, um telemóvel e acesso à internet”. Acrescentou ainda que desde então, “provavelmente não entrei em nenhuma reunião com um cliente que não me tivesse perguntado sobre a inteligência artificial. É um tema unânime, e as pessoas estão cientes de que veio para ficar”. Miguel Ricon Ferraz considerou que “a inteligência artificial é um tema estrutural, muitas vezes interpretado e apresentado nos títulos das notícias como cíclico, mas é importante perceber que a tecnologia não é uma bolha. Estamos já a assistir a ganhos de produtividade e a benefícios na economia real”. No plano regulatório, defendeu que “o foco deve estar em regular menos, porque estamos atrasados, e responsabilizar mais, de modo a permitir que as empresas invistam e se reduza a burocracia”. Só depois, acrescentou, se deve “responsabilizar e implementar a regulação quando já houver um plano bem definido”. Entre os riscos identificados, destacou “principalmente o risco de execução” e a questão energética. “É essencial perceber se a rede energética está preparada para responder à crescente necessidade de consumo e à capacidade de processamento destes novos data centers”. E alertou que “apenas um terço dos data centers a nível mundial está atualmente dedicado à inteligência artificial. Ainda estamos mesmo no início”.