Os nossos filhos que paguem a crise?
Convenhamos que se trata de um sério avanço para a esquerda não acreditar que, tal como nos finais do século XX caiu o muro socialista de Berlim, poderão agora ruir as paredes capitalistas de Wall Street, a caminho de uma sociedade sem classes ou sem "exploradores e explorados". Mas não se duvide que a esquerda viu na intervenção do governo federal norte-americano nos mercados, assim como no "plano Paulson", a vingança que aguardava desde 1989. Não me parece, porém, que a vingança venha a ser servida, quente ou fria. O capitalismo, como no passado, será capaz de se regenerar.
Para retirar lições da crise – e no lugar do "plano Paulson" – proponho um "Plano Paulo Pinto Mascarenhas" (PPPM).
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Primeira e principal lição: nunca tirar conclusões ou procurar soluções apressadas. Ensina-nos o passado que as crises do capitalismo são cíclicas. Só nas economias socialistas é que não há ciclos, porque a recessão é permanente. Os decisores políticos têm de contar sempre com as crises e, por isso, devem actuar com a racionalidade da formiga em tempos de crescimento económico e incentivar mais a poupança do que o crédito. Para não acabarmos como a cigarra quando chega o Inverno, tal como acontece na actual crise financeira, o Inverno do descontentamento ocidental.
Segunda lição no "Plano PPPM": para quem não é de esquerda e se considere liberal-conservador, o Estado deve ser pequeno, ágil e forte - e todas as três características são essenciais para conjunturas difíceis como a que enfrentamos. As "nacionalizações" de que se fala poderiam ser evitadas, mas aconteceram em grande medida por incompetência dos agentes de regulação. As soluções estáveis e duradouras continuam a encontrar-se no mercado – e não no Estado. Como pudemos assistir ainda há poucos dias, numa notícia aliás publicada no Negócios, das ruínas verdes do Lehman Brothers nasceram as cores azuis do Barclays. Falta saber o que irá acontecer aos cerca de 10 mil trabalhadores da empresa falida, mas o mais certo é que as vítimas sejam os principais responsáveis pela má gestão e consequente desaparecimento do Lehman. Ou seja, os "capitalistas" que dão mau nome ao capitalismo.
Terceiro e último ponto: nem todas as ilações que se podem retirar da crise financeira servem para economias e sociedades onde o Estado é gordo e omnipresente, como acontece em Portugal. A propósito das falências da Fannie Mae e da Freddie Mac – instituições que, atenção, foram criadas pelo Estado e só mais tarde foram privatizadas, depois de se tornarem num encargo incomportável para o orçamento federal norte-americano –, alguma esquerda afirmou-se satisfeita por os portugueses continuarem a ser obrigados a descontar para um sistema público de segurança social. Esta seria a única forma de contarem com reformas garantidas. A miopia ideológica é grave e perigosa. Num país onde se morre mais do que se nasce, a segurança social pública não tem dinheiro para pagar as reformas de todos. Confiar nas promessas do Estado será penhorar a vida dos nossos filhos.
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O plano da esquerda, que devemos evitar, é propor um capitalismo socialista planificado, regulamentado e taxado. Tudo para que não possa causar mais surpresas. Como resultado teríamos a estagnação económica, a redução de capitais disponíveis para novos investimentos e um acréscimo da corrupção na busca de favores estatais. A emissão de moeda e a concessão de crédito pelos bancos centrais seria o meio por excelência para estimular a economia, produzindo mais inflação, instabilidade cambial e, claro está, insegurança acrescida. A tal insegurança que acredito todos queremos evitar – à esquerda ou à direita – e que serão os nossos filhos que terão de pagar.
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