OPA: comprar uma empresa e só saber o preço depois
Quando um investidor adquire o controlo de uma sociedade cotada pela compra, a um acionista, de um importante lote de ações, é obrigado a partilhar o preço que pagou por essa aquisição com todos os restantes acionistas, de modo a providenciar-lhes um tratamento equitativo.
A CMVM anunciou recentemente a sua intenção de propor uma revisão pontual do regime das Ofertas Públicas de Aquisição (OPA) em 2014, indicando alguns pontos que mereceriam atenção prioritária.
O regime das OPA carece de uma revisão aprofundada ao nível europeu. Mas convém alertar que há uma especificidade nacional que constitui um sério entrave à mudança de controlo das empresas e que conviria ser objeto de reponderação urgente: o âmbito da intervenção do designado auditor independente na fixação do preço de uma OPA obrigatória.
Quando um investidor adquire o controlo de uma sociedade cotada pela compra, a um acionista, de um importante lote de ações, é obrigado a partilhar o preço que pagou por essa aquisição com todos os restantes acionistas, de modo a providenciar-lhes um tratamento equitativo, porque se considera que o valor da aquisição do lote de controlo encerra um sobrepreço em relação ao preço de cotação (o chamado "prémio de controlo"). Este tratamento equitativo obtém-se através da imposição ao investidor do lançamento de uma OPA obrigatória.
Normalmente, o acionista vendedor do bloco de controlo consegue esse sobrepreço no âmbito da negociação particular que levou à celebração do contrato de compra e venda desse lote de controlo.
Podia pensar-se, por isso, que o preço a que o investidor terá de lançar posteriormente a OPA obrigatória corresponda ao valor unitário, por ação, que o vendedor do lote de controlo obteve no âmbito da referida negociação particular, quando esse valor seja mais alto do que a cotação vigente no mercado.
Só que, paradoxalmente, o Código dos Valores Mobiliários diz precisamente o contrário: se o preço resultante da negociação particular for superior ao da cotação, ele presume-se não equitativo para efeitos de OPA, e pode a CMVM, em consequência, nomear um auditor para fixar o preço a que a OPA será lançada.
A incógnita sobre essa nomeação e o resultado da avaliação desse auditor são fatores de incerteza para o mercado e uma espada de Dâmocles sobre o comprador, pois este, tendo já adquirido o lote de controlo e lançado já a OPA, nunca sabe qual a fatura final que terá de pagar para adquirir a empresa, já que o preço da OPA só será determinado pelo auditor após ela ter sido anunciada.
Trata-se, pois, de um obstáculo real que desincentiva a mudança de controlo e o investimento nas empresas cotadas, e que resulta além disso, em nossa opinião, de uma interpretação e transposição equívocas da Diretiva comunitária das OPA.
O que a Diretiva da OPA permite, a nosso ver, é um ajustamento de preço da OPA em função dos próprios mecanismos de ajustamento de preço que possam constar do contrato de compra e venda de ações resultante da negociação particular (veja-se, por exemplo, neste sentido, o regime belga), e não a nomeação de um terceiro (o auditor) que, "ex machina", fixa um preço abstrato a que deve ser lançada a OPA, alheio ao enquadramento contratual que vinculou o comprador e o vendedor do lote de controlo.
Of Counsel da Vieira de Almeida & Associados
Este artigo de opinião foi escrito em conformidade com o novo Acordo Ortográfico.
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