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Coca-Cola: "Movimento é Felicidade", "Beija Felicidade"

Os dois desejos mais viscerais do ser humano subjazem a praticamente toda a publicidade, qualquer que seja o produto ou o serviço propagandeado: o desejo de viver com companhia e o desejo de ser feliz.

A Coca-Cola anda há décadas em volta do mote da felicidade, mas na actual campanha faz dele o mote dos slogans.

 "Movimento é Felicidade", diz um anúncio com um homem pedalando na bicicleta. Vai de fato e gravata a sorrir. É executivo ou empregado de serviços, pois leva a pasta preta na bagageira. Segue veloz, só ele está focado: as rodas da bicicleta rodopiam sem deixar ver os raios; o fundo, mais desfocado ainda, mostra um aprazível ambiente, com relvado, uma árvore e um edifício espaçoso. A cabeça do homem foi fotografada quando passava com o céu em fundo, para podermos ver quão feliz o homem pedala.

A frase de entrada, tal como o slogan, refere movimento e felicidade: "Mover-se torna-o feliz." O resto da frase serve para dar um toque de bom humor ao conjunto: "Até mesmo nas manhãs de segunda-feira."

O anúncio associa a felicidade ao exercício físico, pois a Coca-Cola diz-se preocupada com a saúde e o bem-estar dos seus consumidores, como o revelam as iniciativas que propõe no seu site para nos "mexermos".

A chave para compreender a necessidade de tanto movimento para obter tanta felicidade está, entretanto, na frase em letras pequenas que remata o anúncio: "Calorias que entram e calorias que saem - ambas contam para um peso saudável." A função poética foi chamada à frase com a repetição do elemento "calorias que", com a oposição binária "entram/saem", com a rima "entram/contam" e a semelhança dos sons das sílabas "saem/saudável". Esta linguagem poética oculta a seguinte mensagem: eu bebo Coca-Cola; portanto, engordo; ser gordo é hoje um estigma; portanto, tenho de fazer exercício para emagrecer.

Assim, a Coca-Cola propõe a solução para o peso a mais ganho ao consumi-la: faça exercício, nós ajudamo-lo a perder o peso que nós lhe provocamos. Com "movimento" depois de nos beber, perderá peso e será "feliz".

Ser "feliz", é, portanto, beber algo gostoso que nos engorda - as "calorias que entram" - e, depois, fazer exercício para perder esse excesso de peso pela evacuação das "calorias que saem". A Coca-Cola sugere, assim, a solução para o problema que ela mesma cria: se a bebermos, temos de fazer exercício, o que não é um sacrifício, porque "é Felicidade".

Outros anúncios da marca insistem na felicidade e no desejo de companhia: no site, uma foto mostra uma família bebendo Coca-Cola à mesa, todos a rir de felicidade, ilustrando as "Histórias felizes para Comer" que a marca propõe. A ligação da felicidade e do estar juntos com o comer e beber de gente fisicamente bem transforma-se numa narrativa: a palavra "História" salta do logótipo desta iniciativa para o slogan "As Histórias Mais Felizes estão aqui".

Mas ainda não chega. Esta felicidade transborda, "é sempre a resposta", como se lê noutro slogan, ilustrado por duas crianças sorridentes. Depois do "movimento", depois de estarmos acompanhados, é preciso passar das ideias aos actos: num cartaz, vemos parte da cabeça duma rapariga já com o gargalo duma Coca-Cola nos belos lábios. Não lhe vemos os olhos, para não nos distrairmos com a pessoa concreta: apenas o acto de beber interessa aqui. O slogan diz tudo: "Beija felicidade". Beber Coca-Cola é meter "felicidade" dentro do corpo. Mas, não, não é beber - é "beijar". Um acto terno, um acto de felicidade que se faz a dois, eu e a garrafa. Estar acompanhado e estar feliz é, em conclusão, emborcar Coca-Cola.

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