Notas da semana de Marques Mendes
As notas da semana de Marques Mendes no seu comentário na SIC. O comentador fala sobre as eleições europeias,o estudo sobre o futuro da Segurança Social, a entrevista de Centeno ao Financial Times e a sua manutenção no Governo na próxima legislatura, entre outros temas.
ESTUDO SOBRE AS PENSÕES
A respeito do estudo anteontem divulgado, há que dizer:
- Primeiro: o debate é útil, porque este problema é sério e toca a todos;
- Segundo: podemos discordar das soluções para o futuro da Segurança Social – e há várias soluções possíveis – mas é impossível não ver que há um problema centrado em quatro realidades:
- O envelhecimento crescente da população – logo, mais pessoas a receber pensões de reforma;
- O aumento da esperança de vida – logo, mais pensionistas a receber reformas durante mais tempo;
- A diminuição da população – logo, menos activos e descontar e consequentemente menos receitas para a Segurança Social;
- O estado da economia – basta um pequeno arrefecimento da economia e uma subida do desemprego para logo termos mais despesa social e menos receita.
Posto isto, há que acrescentar duas coisas: primeiro, se há matéria que justifica um Acordo de Regime é esta da reforma da Segurança Social (porque é reforma para uma ou mais gerações); segundo, o tempo certo para tratar desta matéria é no início e não no fim de uma legislatura. Este tema requer serenidade e não excitação eleitoral.
AS DECLARAÇÕES DE CENTENO AO FT
Surpreendentemente, Mário Centeno veio dizer ao Financial Times que, afinal, não houve uma mudança grande e radical na política de austeridade. Houve, sim, segundo ele, uma mudança mas pequena. Tudo ao contrário do discurso oficial do Governo.
- Primeiro: estas declarações provam que, como tenho dito, este é um Governo bicéfalo. Há António Costa e há Mário Centeno. Um pensa uma coisa, o outro pensa coisa diferente.
- Segundo: do ponto de vista da geringonça, esta declaração é um disparate político e eleitoral. Primeiro, porque contradiz todo o discurso do PS, do PM, do PCP e do BE. Todos devem ter ficado à beira de um ataque de nervos; segundo, esta declaração só ajuda objectivamnete a oposição – quando em campanha eleitoral e em debates televisivos António Costa falar que virou a página da austeridade, Rio e Cristas vão atirar-lhe à cara estas declarações de Mário Centeno.
- Terceiro: porque é que Mário Centeno faz isto? Porque tem uma agenda própria, porque corre em pista própria, porque tem discurso próprio e timings próprios. E António Costa, como se vê, não controla Mário Centeno.
CENTENO FICA NO GOVERNO?
O Expresso diz que "Costa segura Centeno no próximo Governo". A este respeito diria:
- Primeiro: esta notícia mostra bem a força de Mário Centeno e a fragilidade de António Costa. António Costa é que precisa de Mário Centeno, não é Mário Centeno que precisa de António Costa.
- Segundo: não tenho qualquer dúvida que ao PM interessa muito que Centeno continue num próximo Governo do PS. Já o disse e hoje repito – Centeno é o maior trunfo eleitoral do PS. A dúvida é saber se ficar no próximo Governo também interessa a Mário Centeno. É que com o arrefecimento da economia ele não terá no futuro tão boas condições como teve até agora.
- Terceiro: Centeno, se quiser, pode ser vice-presidente da próxima Comissão Europeia. Um grande lugar, com um mandato alargado de 5 anos, o que não existe no Eurogrupo. Se optar por não ser e preferir continuar no Governo, então é legítimo pensar que as suas ambições no médio prazo podem passar por outros voos políticos, mais no plano interno e não no plano internacional.
LIGAÇÕES FAMILIARES PENALIZAM PS
- Segundo uma sondagem da Aximage, 62% dos portugueses criticam as nomeações de familiares feitas por vários membros do Governo. E este resultado leva a uma quebra do PS nas intenções de voto. Não é de surpreender.
- O que surpreende é outra questão: sempre considerei, como vários outros, que o PM era um exemplo de inegável habilidade política. Mas com tantos erros nos últimos tempos importa perguntar: o que se passa com António Costa? Onde está a sua habilidade política? O PS já teve 21 pontos de diferença para o PSD. Agora tem apenas 7. Porquê tantos erros? Vejamos:
- Geriu mal os incêndios de 2017;
- Geriu mal o dossier de Tancos;
- Está a gerir mal a questão das relações familiares no Governo;
- Escolheu um cabeça de lista às Europeias que deixa muito a desejar;
- Valorizou as Europeias que são as eleições mais difíceis para os Governos.
- Tem um comportamento errático, como ainda se viu esta semana com as incompatibilidades dos advogados/deputados.
- Por que é que isto sucede? Porquê tantos erros? É por deslumbramento? É por arrogância? É por cansaço? É por falta de um efectivo número dois no Governo? É um pouco de tudo isto?
- A verdade é esta – António Costa é capaz do 8 e do 80, do melhor e do pior. É capaz de apear António José Seguro e a seguir perder com Passos Coelho. É capaz de fazer a geringonça e depois deitar a perder uma maioria que estava ao seu alcance.
QUEM VAI GANHAR AS EUROPEIAS?
- Até há pouco tempo, os dados apontavam para que genericamente todos os partidos tivessem condições para cantar vitória: o PS porque ganhava de forma fácil; o PSD porque ganhava às expectativas; o CDS e o Bloco porque subiam; o PCP porque mantinha a sua posição.
E este cenário, manda a verdade que se diga, continua a ser o mais provável.
- Mas atenção! Os erros cometidos pelo Governo nos últimos meses e semanas mostram que está instalado o caldo de cultura para poder haver uma surpresa nestas eleições: e a surpresa seria o PS perder as eleições ou então ter uma vitória pífia, à tangente. Convém ter em atenção o seguinte:
- Primeiro: as eleições europeias são sempre difíceis para os Governos. A prova é que, nos últimos 25 anos, o partido que estava no poder perdeu quase sempre as eleições europeias. Só houve uma excepção em 1999, quando o PS ganhou, com Mário Soares à frente da lista. Fora isso, quem estava no poder em 1994, 2004, 2009 e 2014 perdeu sempre.
- Segundo: estas são, tradicionalmente, umas eleições em que há muito voto de protesto. E a verdade é que há neste momento um conjunto de irritantes que pode suscitar o protesto dos eleitores contra o Governo – seja na economia, seja nas reivindicações laborais, seja nas questões comportamentais.
ELEIÇÕES EM ESPANHA
- A duas semanas das eleições em Espanha, e segundo a última grande sondagem, há alguns dados categóricos:
- Grande favorito à vitória – o PSOE
- Grande queda eleitoral – o PP
- Grande novidade política – VOX
- Oportunidade de chegar ao Governo – Está eleitoralmente ao alcance quer do Podemos quer do Ciudadanos, em coligação com o PSOE.
- O sistema que durante décadas (não já nos últimos anos) foi bipartidário (com PSOE ou PP) passará a pentapartidário.
Para além destas, há outras relevantes conclusões:
- A esquerda apostou numa agenda social e já ganhou. Falta apenas saber se, em conjunto, PSOE e Podemos têm maioria absoluta.
- A direita apostou no discurso da unidade de Espanha e já perdeu. É quase impossível que PP, Ciudadanos e Vox tenham a maioria absoluta.
- A única grande dúvida mesmo, nestas eleições, é se vamos conseguir ter um governo estável. Já esteve mais difícil. Agora, parece ser mais fácil. Mas ainda não é um dado adquirido. E este é um elemento essencial para a economia. A espanhola e a portuguesa.
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