O desassossego do Montepio
O Montepio é notícia por causa da entrada, ou não, da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa no capital da caixa económica. É notícia por causa da venda de 60% da "holding" Montepio Seguros aos chineses da CEFC e de uma putativa desistência destes entretanto desmentida. É notícia por causa de Nuno Mota Pinto, futuro CEO da caixa económica, ter tido no seu currículo (segundo dois conselheiros da associação mutualista), até 2017, uma dívida em atraso à banca, condição que o diminui para o exercício do cargo. Sem esquecer, claro está, a supervisão da associação mutualista que há-de passar para o regulador dos seguros, mas que até ao momento se encontra num limbo.
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Estas notícias têm o condão de levantar dúvidas sobre as duas instituições (associação e caixa económica) e os seus líderes, actuais e futuros. Neste afã, naturalmente, destrói-se valor, emergindo anátemas que se irão perpetuar no tempo.
Trata-se de uma guerra calada em que há apenas perdedores e que só não causou, até agora, mais danos, porque o Montepio está protegido pelo manto da economia social e pelo cuidado com que o Governo está a lidar com o tema da capitalização da caixa económica. Pelo caminho, o Banco de Portugal tem transmitido a mensagem de que os rácios do banco são estáveis, sendo até capaz de tentar captar o interesse de um "joão ratão" para a "carochinha": "A quota de mercado da caixa económica é uma quota de mercado que pode ser interessante – e é seguramente interessante – num processo de consolidação do sistema financeiro português", Carlos Costa dixit.
Estes desvelos na abordagem ao Montepio não têm sido suficientes para apaziguar os ânimos internos, uma luta que tem muito de parecido com o que aconteceu recentemente noutros bancos nacionais. É um jogo perigoso e de elevado risco que, no fim, os pode encurralar no desabafo escrito por Fernando Pessoa (através do heterónimo Bernardo Soares) no "Livro do Desassossego": "Nós nunca nos realizamos. Somos dois abismos – um poço fitando o céu."
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