Duas nódoas no colarinho branco
O primeiro problema é o défice estrutural de conhecimento técnico e financeiro do Ministério Público e dos magistrados. Há uma década, uma vaga de acusações de abuso de informação privilegiada - levantada pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) - desaguou em poucas acusações e, no início, em punições ridiculamente simbólicas. Entretanto, o enquadramento foi sendo revisto, sobretudo nas punições, mas sobraram episódios em plenas salas de audiência que deixaram à mostra a falta de preparação de toda a estrutura judicial para lidar com este tipo de crime financeiro. Em quase todos os casos, mais de metade dos processos era passada a explicar aos juízes os conceitos económicos associados à prática criminosa.
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O outro dos problemas destes processos - e o mais determinante - tem a ver com o trabalho de investigação e produção de prova. Os melhores advogados dos crimes de colarinho branco usam como arma principal de defesa a falta de prova ou os problemas na sua obtenção, que conduzem por vezes a abusos ou a extrapolações sem fundamento. O trabalho da CMVM esteve sempre na mira da defesa, deixando o Ministério Público refém da primeira etapa destes processos de "inside trading". Este segundo problema - comum a outros processos de colarinho branco - só se resolve com o regime de protecção de testemunhas. É esse regime - que constitui a figura do delator através da troca de punições mais leves ou mesmo absolvições - que permite ver figuras como Madoff condenadas de forma célere nos Estados Unidos. A prova é real, e não apenas um resultado de esquemas complexos de dedução (algum do trabalho da CMVM no "inside trading", por exemplo, era cruzar datas de transacções financeiras com as horas de telefonemas entre os envolvidos), e o testemunho é credível de pessoas directamente envolvidas.
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Enquanto os tribunais não estiverem dotados das mesmas competências (internas ou externas) dos alegados criminosos, a Justiça em Portugal ficará sempre refém da inexorável marcha do tempo.
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