Reduzir ameaças como a destruição de habitats ou a caça é crucial para salvar as aves do mundo, mas não chega, aponta um estudo publicado na Nature Ecology & Evolution. Os investigadores alertam que, mesmo em cenários de conservação otimistas, mais de metade das extinções previstas para as próximas décadas são já inevitáveis. A investigação propõe, porém, uma combinação de ações globais com programas de recuperação focados nas espécies mais únicas para atrasar a extinção.
A equipa liderada por Kerry Stewart, da Universidade de Reading, analisou dados de cerca de 10 mil espécies de aves, utilizando uma abordagem baseada em características morfológicas que avalia o risco de extinção e a perda de diversidade funcional.
Segundo os autores, “ações globais — como a eliminação imediata de todas as ameaças em pelo menos metade da área de distribuição de cada espécie — só evitarão cerca de metade das extinções e da perda de diversidade funcional previstas” para os próximos 100 anos. No cenário base, estima-se a extinção de 517 espécies, cerca de 5,2% do total analisado, o que representa um número três vezes superior ao total de extinções registadas desde 1500.
Mesmo num cenário de “abatimento completo das ameaças”, os investigadores preveem a extinção de 254 espécies e uma redução de 1,5% da diversidade funcional porque “algumas extinções não são evitáveis, mesmo com a eliminação completa das ameaças atuais e futuras”.
Além disso, apontam, as ameaças não têm impacto uniforme. A perda e degradação de habitat é descrito como o fator mais facilmente evitável, nomeadamente através de ações específicas que podem impedir 141 extinções e preservar 0,9% da diversidade funcional global. Por outro lado, controlar a caça ou a perturbação humana teria menos impacto no número de espécies salvas, mas “proporcionaria ganhos desproporcionais em diversidade funcional”, destacam.
Ao identificarem as 100 espécies ameaçadas consideradas mais “funcionalmente únicas”, os cientistas concluíram que a sua proteção permitiria evitar 68% da perda funcional projetada.
“Prevenir a extinção de 100 espécies (cerca de 37 previstas para extinção) pode conservar até 2,2% da diversidade funcional global”, lê-se ainda no artigo. Para além do valor ecológico intrínseco, estas espécies são importantes para os seres humanos, por exemplo, na prestação de serviços de ecossistema como a polinização ou o controlo de pragas.
O estudo conclui que “as políticas de conservação não devem focar-se apenas na redução de ameaças” e que “programas de recuperação direcionados, que considerem explicitamente a unicidade funcional das espécies, têm grande potencial para conservar a diversidade funcional a nível global”.
Com a biodiversidade a desaparecer a um ritmo sem precedentes, os autores lançam um alerta: “é urgente decidir que dimensões da biodiversidade queremos proteger, consolidar a sua medição e incluí-las em todas as fases do planeamento e avaliação de impacto da conservação.”