No Dia Nacional da Água, assinalado esta quarta-feira, a associação Zero revelou que Portugal está em “incumprimento grave e persistente” das suas obrigações europeias em matéria de gestão hídrica. A associação apresentou, a 29 de setembro, uma queixa formal à Comissão Europeia, pedindo o início de um procedimento de infração contra o Estado português pela não implementação dos caudais ecológicos, o regime legalmente exigido para assegurar o fluxo mínimo de água a jusante das barragens.
Segundo a análise aos Planos de Gestão de Região Hidrográfica 2022-2027, 64% das albufeiras associadas a grandes barragens não cumprem os requisitos da Diretiva-Quadro da Água. “Verificámos que 50 albufeiras não possuem qualquer regime de caudal ecológico definido e que, em 28 casos, este existe, mas não é libertado de forma efetiva e verificável”, denuncia a Zero.
Com impacto nos ecossistemas aquáticos, apenas 7,4% das albufeiras dispõem de dispositivos de transposição de peixes, e espécies como a toupeira-de-água estão em risco acrescido. “A sobrevivência da toupeira-de-água está diretamente ameaçada pela fragmentação fluvial e pela alteração do regime hidrológico”, alerta a associação.
A Zero considera que a situação é incompatível com os objetivos de alcançar o bom estado ecológico dos rios até 2027 e alerta para a contradição das atuais políticas públicas. “É inadmissível que o Governo continue a financiar ativamente projetos de novas barragens enquanto falha no cumprimento da Diretiva-Quadro da Água em mais de 60% das infraestruturas já existentes”, acusa a organização.
A associação exige, por isso, uma moratória imediata à construção de novas barragens, incluindo o projeto do Pisão, no Crato, que transita do PRR para o Orçamento do Estado com um financiamento de 222 milhões de euros. Para a Zero, “a construção de novas barreiras, que aumentam a fragmentação e a pressão sobre ecossistemas já degradados, é manifestamente incompatível” com os objetivos ambientais assumidos por Portugal e pela União Europeia.
Na queixa apresentada em Bruxelas, a organização pede que a Comissão Europeia condicione o financiamento europeu ao cumprimento integral da Diretiva da Água. Em paralelo, exige ao Governo português e à Agência Portuguesa do Ambiente a libertação imediata dos caudais ecológicos em falta e a adoção de uma política de gestão hídrica que coloque “a saúde dos ecossistemas e a resiliência climática no centro das decisões”.