Os antigos ex-ministros da Economia Carlos Tavares e Manuel Caldeira Cabral defendem que a reindustrialização da Europa se afigura "urgente" no contexto geopolítico, com o primeiro a chamar a atenção que Portugal precisa de "aumentar a produtividade" e abandonar "políticas contraditórias" e o segundo a afirmar que o país pode destacar-se pela "diferenciação" e via serviços associados.
"Não diria que a reindustrialização é mais urgente, a reindustrialização é urgente há pelo menos 30 anos", atirou Carlos Tavares no arranque de um debate subordinado ao tema, no primeiro de dois dias da Grande Conferência Negócios Sustentabilidade 20 |30, que decorre na Nova SBE, em Carcavelos.
Carlos Tavares apontou ser preciso "não esquecer que a Europa não é homogénea" e fechando o ângulo à indústria transformadora apontou que tem "um peso significativo" em países como a Alemanha, Polónia e Itália, enquanto em Portugal, a par com Espanha, representa entre 11 e 12% da economia, abaixo da média do bloco dos 27 que anda nos 14%.
O peso "insuficiente" comparando, por exemplo, com o de setores como o turismo pode ligar-se também, ainda que de forma indireta, às condições dadas aos empresários para investir. "Temos objetivos e politicas contraditórias": É que, se por um lado, as da tutela Economia vêm dizer que "precisamos de empresas de maior dimensão", por outro, a das Finanças prescreve que "quanto mais sucesso tiverem mais pagam" de impostos, sinalizou, advogando por "reformas".
Carlos Tavares fez ainda um parêntesis para apontar que o "tema da estrutura da economia portuguesa e da qualidade do crescimento económico tem sido subestimado". "Sempre que crescemos um bocadinho mais do que outros ficamos muito satisfeitos (…) , mas 2% ao ano não dá para fazer convergência efetiva com a UE. Temos défice de produtividade que é de cerca de 20% inferior à média europeia" e "não pode haver convergência de salários sem convergência de produtividade".
A solução para a reindustrialização tem de passar por um encontro de vontades de Governos e empresas e Bruxelas lançou medidas nesse sentido, mas será que ainda vamos a tempo? Manuel Caldeira Cabral não tem dúvidas de que não só "vamos a tempo", como Portugal, em concreto, até pode destacar-se pela "diferenciação" e pelos serviços, em que "muitas vezes consegue ser competitivo", dando o exemplo de que na exportação de máquinas - a indústria do metal é o maior exportador nacional - 30 a 40% do valor acrescentado corresponde a serviços.
E, neste contexto, referiu, a sustentabilidade pode também ser um fator de competitividade: "Se conseguirmos oferecer soluções de sustentabilidade é uma área em que podemos ser competitivos e que pode valorizar os produtos".
"É uma área que tem futuro. Não podemos é ter sustentabilidade apenas nos custos, na regulação e em taxas", vincou o economista, apontando que, embora a UE tenha até "calibrado" em parte as suas políticas, com exigências mas também incentivos, "não pode avançar rápido na regulação ao ponto de ferir a competitividade das empresas".
Indissociável à indústria é a energia, um ponto nevrálgico na UE particularmente após a guerra na Ucrânia, que veio colocar o dedo na ferida da dependência europeia do gás russo. "É uma inevitabilidade falar da energia no contexto industrial", realçou o diretor de sustentabilidade da Siemens Portugal, Luís Marçal, para enfatizar que os grandes investimentos que o país tem atraído têm em comum o facto de serem eletrointensivos, desde as fábricas de baterias aos "data centers", à boleia da "mais-valia" das energias renováveis, que precisam de ver atendidas condições para operar.
"Se queremos estas indústrias eletrointensivas temos de garantir que têm essa energia disponível, de criar condições para as nossas redes se adaptarem, ter mais capacitação tecnológica (...) e o papel de uma empresa como a Siemens é estar ao dispor para disponibilizar a tecnologia que lhes permita fazer esse caminho", afirmou, apontando que "por vezes se ignora aquilo que é a complexidade" por detrás do acesso à energia.