pixel

Negócios: Cotações, Mercados, Economia, Empresas

Supervisão comportamental: a chave para um sistema financeiro mais justo e sustentável

Francisca Guedes de Oliveira, do Banco de Portugal, defende supervisão comportamental como eixo estratégico para estabilidade, inclusão e sustentabilidade no setor financeiro.

08 de Maio de 2025 às 15:45
Pedro Ferreira
  • ...

Na Grande Conferência Sustentabilidade do Negócios, que decorre desde quarta-feira na Nova SBE, em Carcavelos, Francisca Guedes de Oliveira, administradora do Banco de Portugal, apresentou uma visão abrangente e estratégica sobre o papel da supervisão comportamental na promoção de um sistema financeiro mais transparente, resiliente e centrado no consumidor.

Para a responsável do banco central, a construção de um sistema financeiro "estável, robusto, transparente e ao serviço da sociedade" é mais urgente do que nunca, num cenário de "instabilidade permanente e um futuro incerto". A supervisão comportamental, disse, é hoje um dos vetores fundamentais para alcançar este objetivo, porque garante que os interesses dos consumidores estão no centro da atuação das instituições financeiras.

Durante a apresentação, Francisca Guedes de Oliveira recordou que o Departamento de Supervisão Comportamental do Banco de Portugal foi criado na sequência da crise financeira global, precisamente para colmatar falhas na proteção dos clientes bancários. "A crise expôs de forma clara os riscos associados à assimetria de informação entre instituições financeiras e consumidores, à falta de transparência em alguns contratos e à enorme indiferença financeira por parte da população em geral", sublinhou.

Desde então, o trabalho da entidade tem sido norteado por uma missão clara: "promover o equilíbrio, a transparência e a confiança na relação entre instituições financeiras e os seus clientes". Para isso, o Banco de Portugal tem atuado em várias frentes — da regulação dos depósitos à proteção dos consumidores em contratos de crédito, passando pela supervisão dos serviços de pagamento e o combate às práticas de usura.

A administradora destacou ainda a importância da literacia financeira como eixo de longo prazo. "Aumentar a literacia financeira dos atuais e futuros clientes é um enorme desafio que tem de ser assumido como um desígnio nacional das políticas públicas", defendeu. Entre os exemplos positivos já concretizados, referiu o lançamento do Portal do Cliente Bancário em 2008, que será em breve revisto, e a realização de ações de formação por todo o país, com foco em professores e universidades.

A apresentação não ignorou os desafios colocados pela transição digital. Francisca Guedes de Oliveira reconheceu as oportunidades trazidas pela inteligência artificial (IA) e os canais automatizados, mas alertou para os riscos de exclusão digital e de falta de compreensão dos produtos por parte dos consumidores. "Como assegurar que os consumidores compreendem os produtos de contrato? Que proteção têm quando interagem com um robô em vez de um humano?", questionou. Para a responsável, é essencial garantir uma regulação "ambiciosa, mas flexível", que não iniba a inovação, mas que a oriente no sentido do benefício público.

No domínio da sustentabilidade, sublinhou o empenho do Banco de Portugal em integrar preocupações ambientais, sociais e de governação na sua estratégia institucional. "Avaliamos a integridade das alegações ambientais e combatemos o 'greenwashing', que compromete não apenas os consumidores, mas a própria credibilidade do mercado", partilhou. Uma das inovações mais recentes foi a inclusão de categorias específicas de crédito verde nas taxas máximas, como financiamentos para eficiência energética em habitações.

Outro eixo da intervenção abordou a exclusão financeira e a desigualdade de acesso aos serviços bancários. "A desigualdade pode advir de causas tão diversas como a idade, a condição social, o nível de literacia ou a existência de deficiências físicas ou mentais", afirmou. Neste campo, a supervisão comportamental pode desempenhar um papel decisivo para garantir o bem-estar financeiro de todos os cidadãos, nomeadamente através da regulação, da fiscalização e da literacia.

Francisca Guedes de Oliveira defendeu ainda a importância da colaboração entre todos os intervenientes do setor financeiro — bancos, associações representativas, entidades reguladoras e organizações de defesa do consumidor — para promover uma cultura de boas práticas e resolução eficaz de conflitos. "A resiliência do sistema financeiro não depende apenas da solidez dos seus balanços, mas também da confiança que inspira aos cidadãos", afirmou. "E essa confiança constrói-se com transparência, justiça e proximidade", completou.

A administradora do Banco de Portugal concluiu com uma mensagem clara sobre o papel da supervisão comportamental como instrumento estratégico não só para proteger os consumidores, mas também para assegurar a solidez e estabilidade do sistema financeiro. Numa altura de desordem global, considerou, esta é uma oportunidade para "renovar compromissos e construir um projeto europeu à altura dos desafios do século XXI". E garantiu que as empresas e os consumidores "podem, sem dúvida, contar com o Banco de Portugal".

Mais notícias