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"Política de inclusão não é uma moda nem uma trend do TikTok"

Gonçalo Nascimento, da L’Oréal Portugal, garante que a empresa resistirá ao recuo norte-americano. Políticas DEI são vistas como imperativos éticos e estratégicos para atrair talento, defendem especialistas

08 de Maio de 2025 às 13:09
Pedro Ferreira
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O futuro da diversidade, equidade e inclusão (DEI) esteve esta quinta-feira em debate na grande conferência da Sustentabilidade organizada pelo Negócios, com os vários intervenientes, do setor privado à academia, a defenderem o compromisso com estas práticas.

Com moderação de Helena Garrido, o debate "A importância do capital humano e a DEI. Como atrair talento?" contou com quatro intervenientes que, apesar de representarem contextos diferentes partilham uma certeza: as práticas DEI não são apenas slogans, mas parte integrante da sustentabilidade nas organizações.

João Pinto, dean da Católica Porto Business School, sublinhou que as novas gerações "avaliam positivamente as empresas com DEI" e, por isso, "as empresas têm de se ajustar". No meio académico, sente que o desafio de atrair talento é semelhante ao do mundo empresarial. "O grande problema das organizações hoje é atrair e reter talento", afirmou, referindo que este é também o dilema de escolas internacionais como a que lidera. Ao nível da formação superior, o reitor destacou o papel das agências de acreditação internacionais, onde, apesar de pressões políticas, houve resistência a recuar nos critérios de diversidade. "Os deans escreveram uma carta a essa entidade que já recuou", revelou.

Do lado empresarial, Gonçalo Nascimento, "country coordinator" da L’Oréal Portugal, deixou claro que, para a multinacional francesa, a diversidade está no ADN. "A L’Oréal anda há 100 anos a tentar criar beleza. Para nós, DEI não é uma moda nem uma trend do TikTok", reiterou. Os quatro pilares da sua proposta de valor incluem propósito, crescimento das pessoas, empreendedorismo e diversidade. "Isto faz parte do nosso core value", afirmou, acrescentando que "é essencial para atrair e reter talento". A prova disso? Um programa de estágios com 15 vagas recebeu, no ano passado, três mil candidaturas.

Mariana Silva, "head of sustainability" da MC Sonae, reforçou que, na empresa, o caminho da DEI foi assumido com convicção e ambição. "Formalizámos a política em 2020 e definimos objetivos desafiantes. Queríamos 40% de cargos de liderança ocupados por mulheres — atingimos 41% no ano passado", partilhou. Para a responsável, "a diversidade permite responder mais rapidamente" aos desafios, como aconteceu durante o apagão que afetou várias áreas da empresa. "Independentemente da função, respondemos na mesma linha", destacou.

Mas nem todos os olhares foram otimistas. Graça Fonseca, professora da Nova SBE e ex-ministra da Cultura, alertou para os sinais preocupantes vindos de líderes globais. "As palavras são importantes e matam. Quando líderes que consideramos referências dizem que a cor da pele ou orientação sexual não devem ser critério, isso muda a forma como as pessoas se sentem autorizadas a ter opiniões diferentes", lamentou. Para a professora, o impacto das políticas norte-americanas já se sente fora do país e já chegou à Europa. "Os EUA não estão sozinhos no mundo, quando acontece algo estamos todos ligados", lembrou.

Apesar das divergências de tom, o consenso é claro: as organizações não podem abdicar da diversidade. Gonçalo Nascimento sublinhou que "não é só um imperativo moral, é uma necessidade", acrescentando que a empresa tem sido premiada "pelos consumidores e parceiros". Mariana Silva foi mais longe e disse sentir "que as pessoas são mais exigentes, participativas e fazem-se ouvir. É uma forma de reforçarmos a nossa proposta de valor enquanto empregador", sublinhou.

Graça Fonseca, embora mais crítica, reconheceu que a Europa pode ser um espaço de liberdade e resistência. "Os produtos que chegam a nossa casa passam por milhares de pessoas em todo o mundo", lembrou, defendendo que não é possível dissociar as políticas empresariais do contexto global.

No final, ficou a ideia de que as empresas e instituições que quiserem atrair talento e criar valor a longo prazo têm de manter o rumo, mesmo quando os ventos políticos soprarem em sentido contrário. Como afirmou João Pinto, até os professores norte-americanos estão "a virar-se para Portugal, para Lisboa e para o Porto", porque veem na Europa uma oportunidade. Afinal, como sublinhou Mariana Silva, "a desigualdade ainda impera" — e o desafio é justamente esse: cumprir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e fazer da DEI uma realidade permanente.

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