Pressão migratória está a "fracturar" a Europa
Alemanha, por um lado, e Hungria e Reino Unido, por outro, têm sido os rostos das posições mais antagónicas quando, na Europa, se discute como repartir a responsabilidade pelo acolhimento dos refugiados. Perceba o que os separa.
Donald Tusk advertiu nesta quinta-feira para o risco de uma nova linha de fractura se instalar na União Europeia, caso os Governos não encontrem uma solução para enfrentar juntos a vaga de refugiados, quando estes continuam a chegar aos milhares ao Velho Continente fugidos em particular da Síria e das guerras movidas pelos fundamentalistas islâmicos.
O aviso do presidente do Conselho Europeu foi seguido do apelo para que as capitais cheguem a acordo para repartir entre si 100 mil refugiados. Trata-se de um número muito superior aos 32 mil oriundos da Síria e Eritreia (países em guerra, alvo do "alerta vermelho" da ONU) que os Governos aceitaram repartir em Junho, com base em quotas voluntárias - e não pré-definidas, como queria Bruxelas.
E porque há tanta acrimónia? Alemanha, por um lado, e Hungria e Reino Unido, por outro, têm sido os rostos das posições mais antagónicas , não obstante existirem diferenças significativas entre todos eles, assim como pontos de contacto. Embora a Alemanha seja, de longe, o país que mais tem efectivamente concedido o estatuto de refugiado, partilha com a Hungria a liderança da tabela de pedidos de asilo recebidos: 40% e 18%, respectivamente, de um total de 185 mil só no primeiro trimestre deste ano (estes são os dados mais recentes do Eurostat), antes, portanto, do "pico" que, a partir do fim da Primavera, se terá instalado nas rotas do Mediterrâneo e dos Balcãs. (Segundo dados do Frontex, só a Grécia registou 230 mil candidatos a refugiados neste ano).
A discórdia tem sido alimentada pelo facto de muitos dos requerentes de asilo verem recusado o estatuto de refugiado por se constatar serem migrantes económicos. No ano passado, dos 357 mil pedidos de asilo entregues nos países da UE, 197 mil foram rejeitados. Ou seja, concluiu-se que mais de metade tentou entrar na Europa ao abrigo do estatuto muito específico de refugiado por saber de antemão ser muitíssimo estreita a porta da imigração legal – que Bruxelas também quer agora rever, até para reduzir o "défice demográfico" europeu.
Berlim, acompanhada de Estocolmo, Paris, Roma, Viena e Haia, está ciente desse risco mas considera que a Europa tem de se organizar, e de forma perene, para receber e repartir numa proporção "justa" quem foge hoje, em particular, do "Estado islâmico" e do seu cada vez maior raio de terror e morte. Nos cálculos de Bruxelas, considerando critérios como a população, PIB e desemprego, a Alemanha deveria receber 18% quando estará acolher mais de 70% depois de ter assumido que todos os sírios são, à partida, candidatos reais ao estatuto de refugiados.
Já a Hungria, que é uma das mais procuradas portas para o Espaço Schengen (a par da Grécia e de Itália), tendo, por isso, a obrigação de registar todas as entradas, defende que estabelecer quotas é um "convite à imigração ilegal" e não é solução para crises que radicam no Médio Oriente ou Corno de África. Viktor Orban, o primeiro-ministro húngaro que mandou erigir a vedação de arame na fronteira com a Sérvia, diz que a Europa tem de se proteger, incluindo a sua "identidade cristã", e o que "o problema é da Alemanha, porque é lá que os refugiados querem ficar".
Já o Reino Unido (e a Irlanda) tem um "opt-in" na sua relação com a UE nestes domínios, e decidiu não entrar nas quotas, depois de ter recebido 25 mil refugiados neste ano. A Dinamarca tem um completo "opt-out".
Situação muito diferente é a imigração por razões económicas, de pessoas que legitimamente procuram uma vida melhor, mas nesses casos a Europa não tem o dever de os atender, ficando a sua recepção dependente dos critérios e limites da sua política de acolhimento.
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