Merz junta-se à indústria automóvel e defende maior flexibilidade na transição elétrica
Concorrência chinesa, custos elevados e metas de emissões estão a acentuar a pressão sobre os fabricantes.
O chanceler alemão, Friedrich Merz, reforçou esta terça-feira, em Munique, o apelo da indústria automóvel para que a União Europeia adote uma maior flexibilidade regulatória na transição energética. Sem colocar em causa a meta europeia de eliminar a venda de novos carros a combustão em 2035, Merz defendeu que Bruxelas deve manter “abertura tecnológica” e não se limitar exclusivamente à eletrificação. “Estamos, obviamente, comprometidos com a transição para a mobilidade elétrica. Mas precisamos de mais flexibilidade na regulação”, afirmou, citado pela Bloomberg.
O líder alemão sublinhou que “compromissos políticos unilaterais com tecnologias específicas são o caminho errado” e insistiu que “queremos combinar competitividade com proteção climática eficaz através da abertura tecnológica”. O conceito de “abertura tecnológica” traduz a defesa da indústria de que a transição energética não deve limitar-se ao carro elétrico a bateria, mas incluir também híbridos, combustíveis sintéticos e outras soluções de baixas emissões.
A posição do chanceler surge após o alerta lançado em agosto por associações que representam fabricantes e fornecedores, como a ACEA e a CLEPA, que consideraram “impossíveis de cumprir nas condições atuais” os prazos da União Europeia para a neutralidade carbónica. Nessa carta enviada a Ursula von der Leyen, os líderes da Mercedes-Benz e da Schaeffler sublinharam que o plano europeu “tem de ir além do idealismo e reconhecer as realidades industriais e geopolíticas”.
Do lado da indústria, a pressão tem vindo a intensificar-se. Ola Källenius, presidente da ACEA e executivo da Mercedes-Benz, alertou recentemente que aplicar as metas da forma rígida como estão definidas colocaria em risco empregos e afastaria consumidores, defendendo que a Europa deve adotar um modelo semelhante ao da China, sem datas rígidas e com margem para tecnologias intermédias, avançou o Financial Times. A Mercedes é, aliás, o único construtor europeu que deverá falhar os objetivos de emissões entre 2025 e 2027, de acordo com um relatório citado pela Bloomberg.
As dificuldades não se limitam à procura abaixo do esperado pelos veículos elétricos, que representam apenas cerca de 15% das vendas na União Europeia. A dependência da Ásia no fornecimento de baterias, os custos de financiamento elevados e a concorrência crescente de fabricantes chineses, como a BYD, têm aumentado a pressão sobre grupos como a Volkswagen, a BMW e a própria Mercedes. A estas tensões somam-se os efeitos da política comercial norte-americana, que agravaram o ambiente externo do setor, lembrou a Reuters.
Ainda assim, a Comissão Europeia tem reiterado que o calendário de 2035 é fundamental para alcançar a neutralidade carbónica em 2050. A legislação aprovada em 2023 já inclui, no entanto, uma revisão intermédia em 2026. “O futuro da indústria automóvel é elétrico em quase todas as aplicações”, defendeu esta semana Armand Zorn, líder parlamentar adjunto dos sociais-democratas alemães, acusando os conservadores de alimentar incerteza e travar o investimento.
Merz, por seu lado, procura equilibrar as posições divergentes dentro da sua coligação. Os sociais-democratas, parceiros de governo, apoiam em grande medida o plano europeu, enquanto parte da sua bancada defende o adiamento ou mesmo o abandono da meta de 2035. Nesse sentido, o chanceler anunciou que irá reunir, nas próximas semanas, com executivos de fabricantes e fornecedores para discutir as perspetivas do setor, adiantou a Reuters.
Com a indústria a somar avisos de lucros em queda e a Comissão a preparar encontros com os principais líderes do setor, o debate promete intensificar-se nos próximos meses. Para já, a intervenção de Merz confere novo peso político ao coro de vozes que pede que a transição energética seja menos rígida e mais ajustada à realidade económica e industrial da Europa.
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