Guerra ameaça domínio do dólar. Renmimbi e cripto são os novos candidatos, diz FMI

A guerra acelerou uma tendência que se vive nos últimos vinte anos, a procura de outras moedas em detrimento do dólar, um fenómeno com alguma expressão nas reservas em moeda estrangeira dos bancos centrais.
EPA
Fábio Carvalho da Silva 31 de Março de 2022 às 18:59

As sanções impostas pelo Ocidente contra a Rússia ameaçam fragmentar o mercado monetário, diluindo o domínio do dólar norte-americano, alertou esta quinta-feira Gita Gopinath, que é primeira vice-diretora do Fundo Monetário Internacional (FMI). 

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"Neste cenário [de imposição de sanções], o dólar irá permanecer como a principal moeda a nível global, no entanto é bem possível [que se assista a] uma fragmentação do mercado", começou por explicar Gita Gopinath, que recordou que "já estamos a assistir a isto em alguns países que estão a renegociar a moeda em que são pagos [pelos serviços e bens exportados]", disse em entrevista ao Financial Times (FT).

Há anos que a Rússia tenta reduzir a dependência face à "nota verde", mas a anexação da Crimeia em 2014 e a invasão à Ucrânia que começou a 24 de fevereiro intensificaram esta vontade e aceleraram este processo, sendo que já a partir do dia 1 de abril o gás de Moscovo será pago em rublos.

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Antes da guerra que assolou a Europa, a Rússia detinha um quinto das reservas estrangeiras denominadas em dólar, estando uma notável parcela destas reservas armazenadas em países agora considerados "hostis" pelo Kremlin, como a Alemanha, França, Reino Unido e Japão.

Para Gopinath, o facto de o mercado global recorrer a outras moedas para suprir a lacuna gerada pela ausência do dólar tem o potencial de diversificar os ativos dos bancos centrais.

"Os países tendem a acumular reservas nas moedas com as quais negoceiam e com que pedem empréstimos ao resto do mundo, pelo que é possível assistir a uma tendência, ainda que lenta, de adoção de outras moedas que irão desempenhar um papel maior [nas reservas dos bancos centrais]", sublinhou a número dois do FMI.

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Gopinath lembrou ainda que a diminuição da presença do dólar nas reservas dos bancos centrais não é um fenómeno novo, tendo caído de 70% para 60% nas últimas duas décadas com a adoção de outras moedas, como o dólar australiano ou do renmimbi.

Segundo os dados do FMI apresentados pelo diário britânico, cerca de um quarto da queda da moeda oficial do EUA deve-se ao uso cada vez mais generalizado da moeda chinesa, o renmimbi. No entanto, menos de 3% das reservas globais dos bancos centrais são denominadas na divisa chinesa.

Para Gopinath, é claro que Pequim está a tentar a internacionalizar ao máximo a sua moeda, até no plano digital, tendo criado o yuan digital, uma réplica virtual da moeda chinesa. Porém, para a vice-diretora do FMI, é pouco provável que o renmimbi substitua o dólar norte-americano no seu papel de moeda dominante nas reservas dos bancos centrais.

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"Isso exigiria que fosse possível um câmbio total e ter mercado de capitais aberto e esse é um processo que leva tempo, pelo que o dólar continuará a ser dominante nos próximos tempos", antecipou a número dois do FMI.

Por fim, Gopinath constatou ainda que a guerra impulsionou os investidores a virarem-se para o mercado das criptomoedas. "[Este mercado] vai receber mais atenção nos próximos tempos, o que nos leva à questão sobre a regulação internacional", alertou. "Há uma lacuna que deve ser preenchida", acrescentou.

Atualmente, tanto os EUA como a Europa ainda estão a meio caminho no processo legislativo sobre criptoativos.

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