Cristina Casalinho 16 de Abril de 2015 às 20:30

Dentro do futuro

Num dos capítulos do World Economic Outlook (WEO) já divulgados pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), entra-se no futuro.

 

Técnicos e responsáveis do Fundo viram o futuro e não gostaram: o crescimento económico das economias desenvolvidas pode não regressar ao patamar pré-crise. Os principais fatores de preocupação encontram-se associados ao envelhecimento da população e à consistente queda da produtividade total dos fatores, ou seja, no decrescente contributo da inovação no desenvolvimento.

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Nas economias mais grisalhas, o envelhecimento populacional não tem sido contrariado pelo aumento da participação feminina, já elevada, ou pelo acréscimo da imigração. Existem, não obstante, casos de sucesso de combate ao inverno demográfico, como são: França e a maioria dos países nórdicos, com apoios financeiros e/ou em espécie à natalidade.

 

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Mais inquietantes são os argumentos listados para justificar o abrandamento da produtividade total dos fatores. As ondas de inovação, sobretudo após a proliferação das novas tecnologias de informação e comunicações entre o final da década de 90 e início da década seguinte, têm implicado menor incremento adicional do produto enquanto o contributo para o produto da melhoria da qualificação da mão de obra tem declinado.

 

Uma vez que, desde a Revolução Industrial, o mundo desenvolvido registou padrões regulares de crescimento de produtividade, refletido em rendimento e bem-estar, muito significativos, esquece-se frequentemente que nem sempre foi assim. A Idade Média, por exemplo, assinala um importante retrocesso económico e científico da Europa. Espaços como o Médio Oriente ou a China conheceram importante pujança económica, normalmente contemporânea de progresso tecnológico, durante a Idade Média e parte da Idade Moderna, assistindo a um considerável declínio nos séculos subsequentes. Normalmente, períodos de forte crescimento são seguidos de alguma desaceleração e somente a inovação permite mitigar as restrições físicas que o planeta impõe à expansão.

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Antes da crise financeira, já despontavam sinais de abrandamento económico, designadamente no que respeita à evolução da produtividade. As mais recentes inovações têm sido menos ampliadoras de geração de produto ou redução de custos. Ou ainda mais perturbador, segundo o FMI, assistiu-se a um deslocamento de recursos de setores com alta produtividade, como manufaturas e indústrias de informação e comunicações, para setores com baixa produtividade, como serviços não-transacionáveis (por exemplo, saúde, bem-estar, cultura) e construção. Por outro lado, a produtividade do trabalho estagnou pela queda do retorno marginal do acréscimo de qualificações da força de trabalho devido à generalização de níveis superiores de educação.

 

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O sucesso da Revolução Industrial ou o declínio científico do Médio Oriente servem de lições que poderão ajudar a explicar a realocação de recursos de indústrias transacionáveis para não-transacionáveis e para o menor investimento em inovação e desenvolvimento. Os recursos deslocam-se para os destinos onde conseguem apropriar-se das rendas geradas. Quais os esquemas de incentivos existentes nas sociedades desenvolvidas que empurram os recursos para áreas onde a competição é menor? O esforço com a criação de igualdade de oportunidades orienta os meios para setores de franja? Ou, alternativamente, o envelhecimento da população, por via da alteração de preferências, e a automação industrial, por via do espectro do desemprego maciço, fomentam o surgimento dos serviços não-transacionáveis mais trabalho-intensivos; e, portanto, esta realocação de recursos decorre de necessidades imanentes da sociedade?

 

A questão dos acréscimos declinantes da aquisição de educação é interessante, remetendo para algumas tendências emergentes: o decréscimo da participação da população masculina juvenil na educação terciária, com impacto no número de licenciados em cursos tecnológicos (por exemplo, na Alemanha). Esta inadequação entre oferta e procura de qualificações em áreas científicas pode levantar barreiras à inovação e suscita questões sobre adequação curricular aos interesses da população em idade escolar e às necessidades de mão de obra das empresas na vanguarda tecnológica. Afigura-se existir alguma evidência anedótica do descompasso entre necessidades empresariais e vocacionais e o sistema educativo (poderá ser interessante seguir a reforma escolar iniciada na Finlândia com criação de currículos à medida). Serão hoje ou a prazo uma restrição ativa ao sucesso das empresas tecnológicas?

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Finalmente, numa nota mais positiva, a despeito da enfâse nas tecnologias de informação e comunicações pelo FMI, no presente, observam-se desenvolvimentos interessantes nas áreas de energia e transportes, dois setores com fortes repercussões no incremento da produtividade total de fatores, que importa revelar. Noutro âmbito, é reconhecida a relevância da força das instituições como condição necessária para avanços da produtividade, sendo assinaláveis os progressos observados nesta vertente.

 

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Economista

 

Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico

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