Michael Boskin 10 de Janeiro de 2013 às 23:30

Uma nova agenda para os líderes da China?

As transições de lideranças políticas sinalizam, tipicamente, ou uma mudança de direcção, ou uma continuidade. Mas a simples perspectiva de uma transição geralmente adia decisões políticas importantes e congela, em certa medida, a actividade económica, enquanto se aguarda pela resolução da incerteza.

A transição de liderança na China (ocorre a cada dez anos), e que culminou com a celebração do 18º Congresso do Partido Comunista, é um claro exemplo. Contudo, há quem ainda recorde os velhos tempos em que a transição do poder na China era uma curiosidade política e cultural que tinha poucas implicações económicas directas nas maiores potências mundiais. Mas esses tempos já lá vão.

 

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A China é agora a segunda maior economia do mundo e, apesar do recente abrandamento no crescimento anual do PIB para os 7%, supera o dos outros grandes actores. O país continua a ser o grande centro de montagem da cadeia global de abastecimento, para uma grande variedade de produtos (por exemplo, computadores e telemóveis), permitindo preços mais baixos para os consumidores de todo o mundo. Isto transformou a China num parceiro económico fundamental para os Estados Unidos, para a maioria dos países europeus, e muitas outras economias, além de ser o centro da dinâmica comercial e da cadeia de fornecimentos dentro do continente asiático. 

 

Além disso, a China possui cerca de 3,3 biliões de dólares em reservas cambiais estrangeiras – a maioria em dólares, mas também noutras divisas – graças ao elevado superávit comercial que registou nas últimas décadas. Isso ajuda a financiar os défices comerciais de outros países e o investimento interno (muitos dos seus beneficiários têm elevados défices orçamentais, que reduzem a poupança interna para um nível inferior ao do investimento doméstico).

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As reformas de Deng Xiaoping deram início à mais rápida melhoria económica da história da humanidade e, com isso, ao surgimento de uma classe média numerosa e crescente. Isso torna a China num importante mercado para um sem número de empresas estrangeiras – incluindo fabricantes automóveis, empresas de tecnologia, instituições financeiras, empresas de energia e de exportação agrícola. E as empresas chinesas – muitas vezes estatais – estão cada vez mais à procura de oportunidades de investimento no estrangeiro, em sectores económicos importantes, como é o caso da energia.

 

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Contudo, o espectacular crescimento da China resultou também num aumento das tensões económicas com outros países. A política de taxa de câmbio da China e o superávit comercial bilateral com os Estados Unidos foram temas importantes na última campanha presidencial norte-americana, e os investimentos da China despertam uma inquietude generalizada em todo o mundo. A Organização Mundial do Comércio aprovou as tarifas alfandegárias dos Estados Unidos para a importação de pneus chineses, e o Canadá estendeu o prazo para analisar a oferta de aquisição da Nexen, uma empresa petrolífera canadiana, à China National Offshore Oil Corporation. Apesar de a China ser membro da Organização Mundial do Comércio, muitas empresas estrangeiras enfrentam restrições à expansão na China, ou são obrigadas a operar, em conjunto, com alguma empresa local.

 

Os chineses, por seu turno, queixam-se das práticas comerciais de outros países e levaram alguns casos (como a prolongada disputa sobre painéis solares com a União Europeia) à Organização Mundial do Comércio), onde começam também a chegar cada vez mais denúncias de outros países contra a China. Contudo, todas as partes devem ter presente que a China é demasiado importante na economia global e no sistema de comércio internacional, para que se permita que estas disputas fiquem fora de controlo.

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Entretanto, a desaceleração económica na China – resultado do enfraquecimento económico global, das medidas para reduzir a inflação na China e do sobreaquecimento dos mercados de activos – ameaça reduzir o ritmo de criação de emprego e criar problemas aos milhões de pessoas que todos os nãos deixam para trás a pobreza rural e vão à procura de maior prosperidade nas crescentes áreas urbanas da China. E vem numa altura em que o processo de abertura do mercado e a redução do controlo estatal está a perder o ímpeto inicial, que se verificou depois das reformas substanciais implementadas pelo ex-presidente Jiang Zemin, e o primeiro-ministro Zhu Rongji. Ainda que o presidente Hu Jintao e o primeiro-ministro Wen Jiabao tenham atingido acordes reformistas em declarações públicas e no 12º Plano Quinquenal da China, muitos dentro do país – incluindo Jiang – estão decepcionados.

 

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Daí que todos observem com atenção o novo presidente Xi Jinping e o novo primeiro-ministro Li Keqiang, para ver quais serão os seus próximos passos. Mas, tanto na política como nos negócios, é raro um sucessor mostrar as suas cartas logo no início, porque isso pode colocá-lo numa situação de desgaste político semelhante ao do líder que está de saída. É demasiado cedo para saber se a nova liderança vai apostar num salto reformista ou manter o status quo. 

 

Para além do presidente e primeiro-ministro novos, a transição de poder inclui a designação de outros membros do Comité Permanente de Politburo, e uma vasta quantidade de posições ministeriais estão a ser preenchidas. Com o sistema chinês de “tudo ou nada”, os líderes que não são promovidos, são substituídos. Desde o novo governador do Banco Popular da China aos principais reguladores, o novo grupo de dirigentes tem a oportunidade de dar um novo impulso à China através da promoção da concorrência, diminuição do poder das empresas estatais, reforço do consumo doméstico, e redução da dependência das exportações.

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No início deste ano, o Centro de Pesquisa para o Desenvolvimento da China e o Banco Popular publicaram um relatório excelente sobre as oportunidades e os desafios que enfrenta a agenda política da China. A conclusão do relatório é que a China deve completar a sua transição para uma economia de mercado, mediante reformas nos sectores financeiro, empresarial, do trabalho e da terra. A abertura dos mercados a uma maior concorrência e o reequilíbrio do sector público é a estratégia mais promissora para converter a China num país de maiores rendimentos nas próximas décadas. Seria difícil encontrar um melhor enquadramento para Xi e Li deixarem a sua marca na política económica da China.

 

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Um problema particular é o consumo, que na China representa uma percentagem muito baixa do PIB, segundo os padrões internacionais, e em comparação com a experiência histórica de outros países no mesmo estágio de desenvolvimento. Duas ferramentas importantes para aumentar o consumo são a segurança social – que está a desenvolver-se, mas muito lentamente – e a redução das enormes poupanças das empresas estatais, através do pagamento de dividendos aos cidadãos (como as empresas privadas que pagam dividendos periódicos aos seus accionistas).

 

Gestores, trabalhadores, consumidores investidores e governos de todos os cantos do mundo, que têm os seus próprios problemas económicos estão, em certa medida, condicionados pela forma como a nova liderança chinesa conseguir implementar e gerir as reformas, hoje e nos anos vindouros. Em breve o mundo saberá melhor aquilo que pode esperar.

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Michael Boskin, professor de Economia na Universidade de Stanford e membro sénior do Hoover Institution, foi presidente do Conselho de Assessores Económicos de George H. W. Bush de 1989 a 1993.

 

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© Project Syndicate, 2013.

www.project-syndicate.org

Tradução: Rita Faria

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