Maria do Céu Patrão Neves: A ignorância converteu-se em opinião
Os movimentos negacionistas têm vindo a ganhar visibilidade, não são fenómenos isolados e movem-se nas redes sociais, onde a ignorância tem hoje “o estatuto de qualquer outra forma de conhecimento”. A análise é de Maria do Céu Patrão Neves, especialista em bioética. Nunca como hoje houve tanto acesso à informação, mas as pessoas têm de ser capazes de “converter a informação em conhecimento”, alerta a professora da Universidade dos Açores.
- Partilhar artigo
- ...
Como especialista em bioética, que fenómeno lhe interessa estudar nesta pandemia? O que tem chamado a sua atenção? Para mim, é particularmente importante fazer uma reflexão ética a dois níveis – individual e coletivo. No plano individual, preocupa-me a forma como têm sido tratados os doentes covid, e também não covid. Ao nível dos doentes covid, podemos destacar o isolamento face à família e os óbitos sem o calor humano. O mais importante no processo de morrer é o conforto de estar rodeado por aqueles que se ama. E estas pessoas ficaram privadas disso. Podemos acrescentar também a violência psicológica sobre os idosos institucionalizados. É muito difícil explicar a um idoso, que por vezes já tem algumas capacidades cognitivas deterioradas, que a ausência da visita da família não corresponde a abandono e desinteresse. O impacto na sua estabilidade afetiva é enorme. Creio que a reflexão bioética sobre estas matérias poderá levar a uma alteração de procedimentos, no sentido de nos prepararmos para outras emergências sanitárias.
Mais lidas