Xi Jinping critica excesso de projetos de IA e de veículos elétricos na China
Declarações do presidente chinês expõem crescente mal-estar em Pequim com a sobreposição de investimentos e a pressão deflacionista.
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O presidente da China, Xi Jinping, lançou uma crítica invulgarmente direta aos governos locais, questionando o investimento repetitivo em setores como a inteligência artificial, veículos elétricos e poder computacional. As palavras, proferidas na Central Urban Work Conference, vieram acompanhadas de um aviso claro: “Será que todas as províncias do país têm de desenvolver indústrias nestas áreas?”, citou a Bloomberg.
A crítica surge num momento em que Pequim tenta conter o excesso de capacidade produtiva e os riscos de deflação, ao mesmo tempo que enfrenta tensões comerciais crescentes com o ocidente. “Quando se trata de lançar novos projetos, são sempre as mesmas coisas: inteligência artificial, poder computacional, veículos elétricos”, apontou Xi Jinping.
A escassez de diversificação nos planos de desenvolvimento urbano é um dos sinais de alarme para a liderança central, que teme a criação de bolhas industriais em setores-chave da economia. A pressão das autoridades para evitar uma concorrência desordenada também tem aumentado. Num encontro recente do Conselho de Estado, o primeiro-ministro Li Qiang prometeu travar a “concorrência irracional” no setor dos veículos elétricos, um segmento que tem sido palco de guerras de preços violentas, afetando os lucros das empresas e as relações com parceiros comerciais externos.
Na mesma intervenção, Xi recorreu a uma expressão popular para criticar os chamados “quadros das três palmadas”: dirigentes que batem na cabeça para garantir que sabem o que fazem, batem no peito com confiança e depois limpam o pó das calças e desaparecem, deixando os problemas para trás, de acordo com o Financial Times.
Nos últimos anos, províncias em todo o país, incluindo regiões remotas como Xinjiang e a Mongólia Interior, lançaram-se numa corrida para construir centros de dados, na esperança de tirar partido do crescimento acelerado da IA. No entanto, muitos desses projetos têm sofrido com a falta de conhecimento técnico e o desperdício de recursos estratégicos, como chips especializados, segundo fontes do setor citadas pelo Financial Times.
A mesma lógica aplica-se ao setor automóvel. Apesar de o número de fabricantes de veículos elétricos ter começado a encolher no último ano, a indústria continua a operar muito abaixo da sua capacidade instalada. “Não devemos focar-nos apenas no crescimento do PIB ou no número de grandes projetos, mas também em quanto é que se está a dever”, sublinhou Xi, advertindo contra a prática de acumular dívidas públicas para sustentar obras de impacto imediato.
Xi já havia feito alertas semelhantes em março de 2024, defendendo que o desenvolvimento de “novas forças produtivas” devia assentar nas condições específicas de cada região, evitando “projetos desconectados da realidade” ou impulsionados apenas por ambição política. “A urbanização deve ser um processo gradual e natural”, insistiu agora. “Tem de estar em conformidade com as leis do desenvolvimento económico e social.”
A mudança de tom é significativa. Há pouco mais de um ano, durante uma visita a França, o presidente chinês negava a existência de um problema de sobrecapacidade na economia chinesa. Hoje, essa sobrecapacidade está no centro do debate político e económico em Pequim, numa altura em que o deflator do PIB está em queda há nove trimestres consecutivos, segundo o Financial Times.
Algumas indústrias já começaram a responder. Analistas do HSBC notam que empresas do setor do vidro fotovoltaico anunciaram uma redução coletiva de 30% na produção a partir de julho. Também associações do setor do cimento, aço e construção prometeram ajustamentos à oferta.
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