TCE pede auditoria externa a todas as despesas do próximo orçamento europeu
Auditor europeu concorda com proposta da Comissão Europeia de simplificar o acesso a fundos europeus, mas pede um reforço do controlo na sua aplicação. Foco no desempenho é elogiado, mas só com "relação clara entre financiamento e resultados".
Simplificar o acesso a fundos europeus e dar ênfase aos resultados são as grandes prioridades de Bruxelas para o próximo orçamento europeu de longo prazo. Mas o Tribunal de Contas Europeu (TCE) alerta que é preciso ir mais além no que toca à transparência e sugere uma auditoria externa a todas as despesas, numa altura em que a fatura a pagar pelos Planos de Recuperação e Resiliência (PRR) se avoluma.
O alerta consta de um relatório divulgado esta segunda-feira pelo TCE, a menos de um mês de ser conhecida a proposta da Comissão Europeia para o próximo quadro financeiro plurianual (2028-2034). No documento que visa contribuir para a discussão em curso sobre o orçamento europeu de longo prazo, o TCE apresenta uma lista de "oportunidades" que o novo orçamento pode trazer para um uso mais eficiente de verbas europeias.
O documento tem como ponto de partida as prioridades do executivo de Ursula von der Leyen, expressas num documento divulgado em fevereiro, e que assentam essencialmente na simplificação, flexibilidade e foco nos resultados. E, embora (em termos gerais) concorde com as alterações propostas pela Comissão Europeia, o auditor europeu alerta para a necessidade de seguir o rasto dessas verbas e definir bem a quem cabe o seu controlo.
"A auditoria externa independente é um elemento essencial para garantir a transparência, responsabilização e para melhorar a tomada de decisões", defende o TCE. Assumindo estar disponível para garantir esse maior controlo, o TCE pede aos decisores europeus que reforcem o seu mandato, de forma a poder "auditar gastos da UE em todos os níveis, até os beneficiários e destinatários finais" entre os 27 Estados-membros.
O auditor defende que o risco de irregularidades na aplicação de fundos europeus é maior quando as despesas estão sujeitas a "regras complexas" e, por isso, apoia que a proposta de simplificação da Comissão Europeia e antevê ganhos em termos de eficiência na absorção financeira, se houver uma junção de fundos e instrumentos europeus no mesmo bolo com as mesmas regras. "No entanto, essa simplificação não deve ser feita em detrimento da responsabilização na utilização dos fundos europeus", frisa.
A adoção tardia de normas regulamentares dos programas-quadro e operacionais, a sobreposição de períodos de programação e a implementação ao mesmo tempo de múltiplos instrumentos financeiros são outros aspetos que prejudicam a implementação dos fundos europeus nos Estados-membros e que, segundo o TCE, devem ser tidos em conta no próximo orçamento.
A juntar a isso, o TCE dá conta de que os procedimentos de contratação pública "demoram hoje mais tempo do que há dez anos". Simplificar ainda mais os acordos de contratação pública com vista a reduzir a carga administrativa e irregularidades deve ser, por isso, uma prioridade também da Comissão Europeia para garantir uma boa execução orçamental, diz.
Em relação à intenção da Comissão Europeia de dar maior ênfase ao desempenho no próximo quadro financeiro plurianual – à semelhança do que acontece nos PRR em que há um conjunto de metas e marcos, associados a investimentos e reformas pré-acordados –, o auditor europeu vê a medida com bons olhos mas diz que é preciso "conceber um quadro de desempenho baseado em informações fiáveis", que se concentre no impacto e resultados, e mecanismos de monitorização para acompanhar as despesas.
Se não for possível haver "uma relação clara entre o financiamento e os resultados", o TCE considera que deve ser "descartado" um sistema baseado no desempenho.
Equilíbrio com receitas
Apesar de grande parte das recomendações do TCE se centrarem na parte da despesa – onde a Política de Coesão e a Política Agrícola Comum (PAC) têm um peso muito significativo –, a entidade liderada por Tony Murphy aponta também para a necessidade de a União Europeia (UE) obter receitas "de forma estável e simples", assegurando "um equilíbrio adequado entre as prioridades para as despesas e os recursos com que podem ser financiadas".
O próximo orçamento europeu a sete anos terá ainda de cobrir uma lista de exigências cada vez maior, nomeadamente no que toca ao pagamento dos empréstimos dos PRR. A estimativa é de que, durante o próximo quadro financeiro plurianual, será necessário pagar "25 a 30 mil milhões de euros por ano", incluindo juros. Isso torna ainda mais urgente a procura por novos recursos próprios, para financiar o crescimento das despesas europeias.
A revisão das licenças de emissões e a tributação de emissões de carbono em certos produtos importados são alguns dos novos recursos próprios em cima da mesa, assim como a tributação de lucros das empresas no setor empresarial.
O TCE considera que a introdução desses novos recursos próprios traz consigo "desafios", entre os quais "receitas flutuantes" e a necessidade de mecanismos de contabilidade e auditoria robustos para garantir transparência e responsabilização. A criação de um "quadro jurídico consistente" e apoio técnicos às autoridades nacionais são algumas das recomendações do auditor europeu.
Em relação à despesa com o pagamento do chamada "bazuca" europeia, pede a Bruxelas que os novos empréstimos tenham em vista "uma redução dos riscos" e que seja elaborado "um plano de reembolso claro". Só devido à subida dos juros, estima-se que os custos com os reembolsos da "bazuca" tenham aumentado "entre 17 e 27 mil milhões de euros" até 2058.
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