Catarina Jervell: "A Majora vai crescer para fora das nossas fronteiras"
Nascida em 1939, comprada pelo Edge Group em 2014, a Majora vai voltar a ser comercializada este ano. Em 2017, a meta é internacionalizar para Espanha. “Mas não queremos ficar por aí”, garante a CEO, Catarina Jervell.
Catarina Jervell não esconde as ambições de crescimento do accionista Edge Group, de José Luís Pinto Basto, em parceria com Miguel Pais do Amaral, para fazer crescer a Majora, da qual é presidente executiva desde 2015. Crescer em Portugal, em mercados para fora do país e, eventualmente, em estrutura accionista.
Formada em Economia, com sete anos na consultoria da Accenture e outros anos nas telecomunicações (PT Empresas), a gestora reconhece que o seu principal desafio foi corresponder à expectativa dos consumidores em torno do regresso da marca portuguesa nascida há 77 anos.
O que é hoje a Majora?
É uma empresa que se prepara para lançar um novo portefólio de 33 produtos no catálogo de 2016. É uma empresa que renovou a sua assinatura, e tenta transmitir os novos "moods" aspiracionais da marca. Vamos relançar um portefólio com 33 produtos, e destes, clássicos Majora muito conhecidos pelos pais de hoje, nomeadamente o Sabichão, o Jogo da Glória, o Loto, as Damas, o Ludo. O Mikado este ano não entra ainda, mas temos previsto lançá-lo brevemente.
E o logótipo da Majora também vai mudar?
Sim. Antigamente era só um menino a jogar sozinho à bola que quer ter uma inspiração do redesenho do nosso logotipo. Achámos muito importante manter aquilo que era a imagem do logótipo – que seria um triângulo e as cores mantêm-se todas as mesmas – mas este logótipo, que era inspirado no jogo chinês Tagram, permite-nos criar tantas figuras quantas a nossa imaginação o permitir. O que a marca vai promover é que brincar é um factor crucial para a comunidade das relações humanas – seja entre famílias, amigos, pais com filhos, avós com netos, amigos com amigos, irmãos com irmãos. E daí já deixamos de ter uma criança sozinha, mas duas crianças a brincar.
Foi feito por quem, o rebranding?
Pela BBDO.
Dos 33 produtos, quantos são clássicos reinventados e quantos são novos?
São 11 clássicos reinventados e o resto já são novidades.
O catálogo estará disponível no Natal [de 2016] – serão vendidos através da grande distribuição ou terão outros pontos de venda?
Não teremos lojas próprias. O que vamos apostar este ano, em termos de distribuição, é nas parcerias com o grande retalho, que é especializado e que consegue chegar aos consumidores com grande capacidade de resposta. Mas, também, alguns pontos de venda próprios em alguns estabelecimentos comerciais.
Consultores de palmo e meio
Como gestora vinda da área das telecomunicações, qual foi o maior desafio que encontrou para enfrentar a tarefa de recuperar e refundar a Majora como marca?
Uma grande expectativa por parte dos consumidores em relação ao que vem aí de novo. Houve muito suor e lágrimas, mas basicamente o maior desafio foi pensar e definir que jogos gostariam as crianças de jogar hoje, no Natal, da Majora. Porque a maneira como se brincava há 50 anos é completamente diferente da maneira como as crianças brincam hoje. As crianças hoje são muito mais exigentes, têm acesso a muito mais informação, não gostam de ter de aprender um jogo em que é preciso 45 minutos a ler as regras. Foi um grande desafio. Fizemos vários "focus group" com crianças para ter exactamente o "feed back" deles, porque eles são as pessoas mais importantes.
E fizeram com crianças de que idade?
Entre os sete e os 11 anos.
As conclusões a que chegaram nos 11 clássicos também foi um bocadinho trabalho deles?
Foi, foi. Foi pô-los a brincar com estes clássicos e perceber quais os jogos de que eles gostavam mais. "Se vissem estes [jogos] nas prateleiras, quais é que pediam aos vosso pais para comprar?"
Houve algum top 3?
Houve alguns top, nomeadamente devido às ilustrações. Uma das coisas que posso adiantar é que este Sabichão que vai voltar, que relembra muito do Sabichão vintage, do primeiro da Majora, vai trazer amigos. Vai ter companhia. E essas ilustrações foram um sucesso.
Os vossos fornecedores são nacionais?
Vamos trabalhar só com fornecedores europeus. Parte deles são nacionais, e outros polacos e ingleses. Em termos de fornecedores nacionais, foi uma agradável surpresa, até porque temos realmente bons fornecedores e com uma grande capacidade de adaptação e flexibilidade para abraçar novos desafios, novos projectos. Nós somos uma marca portuguesa e queremos ter também produção nacional.
No arranque do projecto de aquisição da Majora pelo Edge Group, houve a ideia de alastrar a marca a outros produtos, designadamente material escolar. Mantêm essa ideia?
Queremos obviamente desenvolver mais linhas de produto. Também temos a marca das edições Majora, de livros para crianças, que está dentro dos nossos objectivos. Uma outra linha que estamos a desenvolver é de actividades ao ar livre. Porque achamos que também é importante, não só promover o brincar através das relações combinadas, mas também a prática das actividades ao ar livre. Muitas vezes os miúdos saem para a rua e não sabem o que é que hão-de fazer. E é para dar umas ideias aos pais que saem com eles.
"Vamos internacionalizar a marca"
Para onde é que poderá crescer a Majora?
A Majora vai crescer, e, é nosso objectivo garantido, para fora das nossas fronteiras. Vamos internacionalizar a marca. Aliás, nós, no final deste ano, vamos já começar a trabalhar para a entrada da marca no mercado estrangeiro a partir de 2017.
Quando diz estrangeiro, está a falar de que mercados?
Nesta primeira fase, Espanha. Mas não queremos ficar por aí.
A partir de 2017?
Sim. Estamos a estabelecer parcerias com editoras, nomeadamente europeias e uma americana, e neste sentido o objectivo é trazer boa práticas e bons produtos que eles têm para Portugal. Mas também permitir um "cross selling" dos nossos produtos, feito por eles nos países onde operam.
Isso quer dizer que outros países da Europa poderão seguir-se a Espanha e que a vossa parceria com os norte-americanos serviria para outros mercados, não obrigatoriamente os EUA?
Sim, não obrigatoriamente. Porque estas editoras, depois, não operam só no mercado americano, operam na Europa, e noutros mercados, como o Vietname, etc. E, por isso, os nosso objectivos nesse ponto é trabalhar ao máximo para exportar a marca para todo o lado que conseguirmos.
Mas isto nunca antes de 2017?
Não. Em 2016 vamos só terminar o mercado nacional.
Nos primeiros 12 meses de entrada da Majora no mercado nacional, quais são as vossas perspectivas de vendas?
Aquilo que previmos é, no primeiro ano depois da entrada da marca nas prateleiras, facturar um milhão de euros. Não consigo avançar já com dados concretos.
Nas prateleiras será…
No último trimestre de 2016.
A Majora é composta hoje por quantas pessoas?
Nesta fase, três pessoas.
E isto terá que evolução nos próximos meses?
Vai com certeza crescer. Nomeadamente na componente operacional da marca, na parte toda de gestão de operações, logística, de assemblagem de alguns brinquedos – estas operações são cinco pessoas de certeza. E, depois, em tudo o que é gestão operacional também se trabalha com outsorcing, os números acabam por ser mais voláteis dependente da sazonalidade em que estamos. No Natal são maiores, de Janeiro a Julho desce, volta a subir no Natal.
LOJA ONLINE SURGIRÁ NO ÚLTIMO TRIMESTRE
A contratação do fornecedor digital já está fechada?
Ainda não está totalmente concluída. A nossa estratégia para o digital já arrancou. O que queremos fazer neste primeiro ano é lançar a nossa loja online.
Ainda este ano?
Sim. Também no último trimestre de 2016. A segunda fase ficará para 2017, com desenvolvimento de programas e conteúdos que não vão contra os valores aspiracionais da nossa marca, que é promover as relações humanas, brincar, olhar olhos nos olhos – tirar os olhos do ecrã e voltar olhar nos olhos para nós é muito importante. Não temos nenhuma intenção de desenvolveraplicações individuais para smartphones, mas conteúdos que promovam essa interacção entre as famílias. Uma marca que se posiciona para promover as relações humanas - não queremos promover o brincar sozinho. As crianças, hoje em dia, brincam cada vez mais sozinhas. E isso é uma coisa que esta marca, com seus produtos e os seus programas, vai tentar combater. Agora, o digital veio para ficar – isso já sabemos e não podemos evitar. Mas o digital tem muitas potencialidades que não sejam só brincar sozinho.
No que toca ao espólio da Majora, quais são os vossos planos? Havia a intenção inicial de fazer um núcleo museológico - mantêm?
Claramente ainda é um objectivo. Ainda não conseguimos calendarizar uma data concreta no tempo também porque não encontrámos o local ideal para o fazer. Mas a riqueza deste espólio é de facto muito grande e esta apresentação que no fundo é só uma parte desse espólio é a primeira vez que a Majora vai abrir ao público (a partir de 7 de Junho). Não estava aberto ao público na antiga fábrica da Majora. São mais de 300 jogos, desde jogos de tabuleiro, a livros, a jogos de destreza, tacos de golfe – tudo o que se possa imaginar. Representa a evolução histórica da marca e todos os campos onde a marca se pretendeu afirmar com produtos para crianças. Há uma aposta nas actividades ao ar livre que já vem daí. A Majora já tinha essa preocupação, há muitos, muitos anos atrás.
Mas quando fala em aposta da Majora em actividades ao ar livre, vai ser uma marca de tipo de actividades ou de espaço para actividades ao ar livre para crianças?
Não, de instrumentos para brincar ao ar livre. É uma linha que vamos ter para crianças este ano, mas que iremos continuar o seu desenvolvimento durante o ano de 2017.
"PORQUE NÃO NOVOS ACCIONISTAS?"
O accionista da Majora é, neste momento, o Edge Group a 100%?
Sim, é José Luís Pinto Basto.
Há hipótese de entrarem novos accionistas no médio prazo?
No médio prazo, se pensarmos a um ano, talvez não. Mas no médio, longo prazo, sim, com certeza. A marca vai crescer – porque não novos accionistas?
Mas é algo que estão à procura, que estejam a negociar?
Não, não. Neste momento ainda não.
O valor do investimento será de 1,6 milhões?
Sim, a marca foi adquirida por 600 mil euros e o restante valor é todo o montante que vamos necessitar para o relançamento da marca, produção de jogos, etc.
O "pay back" em princípio será atingido quando?
Está previsto a três anos, de todo o investimento.
A negociação com a distribuição está a correr bem?
Antes de passar por isso, muitas pessoas me pintaram um filme negro de terror. Mas não é verdade. São osso duros de roer, mas são pessoas bastante objectivas e francas e as coisas correm bem.
Com os fornecedores também?
Com os fornecedores portugueses sim, também. Os fornecedores polacos e ingleses têm já uma grande tradição e antiguidade na produção de jogos e, por isso, já falam uma linguagem um bocadinho diferente dos produtores nacionais. Mas os produtores nacionais, quando vamos falar com eles, quando lhes mostramos os projectos, eles têm imensas ideias e tentam, e procuram, e não ficam simplesmente de braços cruzados recusando as propostas. Eles procuram, até arranjar uma solução. Mas a concorrência está de facto agressiva. Tivemos produtores e fornecedores europeus a disponibilizarem-se a vir a reuniões a Portugal connosco só para ganhar um cliente. Já não há fronteiras nisto.
Nos livros – e vivendo hoje Portugal uma situação ímpar na ilustração, com artistas portugueses a serem premiados mundialmente – essa é uma parceria que pode acontecer no âmbito do desenvolvimento da Majora na área editorial?
Claro que sim. Estamos abertos a isso. Aliás, já tivemos algum contacto com alguns designers portugueses. Tanto que, neste trabalho feito pela BBDO, o redesign dos novos clássicos Majora foi de artistas muito bons. O nosso objectivo, um dos motes da marca, é claramente termos um bom produto e com design de qualidade, que foi, também, uma das características da Majora durante muitos anos. Nós queremos ter livros para crianças – não temos ainda definido se serão livros de actividades, de histórias ou outros, mas claramente está nos nossos objectivos. Ou, também, trabalhar com editoras nacionais que explorem as personagens da Majora por este lado.
Mas seja qual for a solução para a chancela editorial, só acontecerá em 2017?
Sim. Em 2016 vai ser mesmo só o relançamento dos jogos de tabuleiro.
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