Economistas defendem uso de 'stablecoins' pela China para reforçar papel global do yuan

Embora Pequim continue a encarar as criptomoedas como uma ameaça à estabilidade financeira e ao controlo de capitais, vários economistas consideram que existe agora uma oportunidade estratégica.
AP
Lusa 02 de Julho de 2025 às 07:08

Economistas e conselheiros políticos na China têm vindo a defender o uso de criptomoedas estáveis indexadas a moedas fiduciárias em pagamentos transfronteiriços, numa altura em que os Estados Unidos procuram reforçar a supremacia do dólar através desta tecnologia.

Apesar de manter uma proibição geral sobre atividades com criptomoedas, responsáveis do Banco Popular da China (banco central) reconheceram recentemente o potencial das 'stablecoins' - ativos digitais indexados a moedas tradicionais - no sistema financeiro global, reavivando o debate em torno da sua adoção.

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Durante um fórum financeiro em Xangai, em junho, o governador do banco central, Pan Gongsheng, afirmou que as 'stablecoins' podem revolucionar as finanças internacionais, sobretudo num contexto de crescentes tensões geopolíticas que evidenciam a vulnerabilidade dos sistemas de pagamentos tradicionais, frequentemente usados como instrumentos de sanção.

Na mesma ocasião, o antigo governador Zhou Xiaochuan alertou que 'stablecoins' indexadas ao dólar podem fomentar a dependência da moeda norte-americana, enquanto outros responsáveis de instituições financeiras do continente chinês e de Hong Kong sugeriram que versões em yuan poderiam reforçar os esforços da China para internacionalizar a sua moeda.

Embora Pequim continue a encarar as criptomoedas como uma ameaça à estabilidade financeira e ao controlo de capitais, vários economistas consideram que existe agora uma oportunidade estratégica.

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Citado pela agência de notícias Bloomberg, o economista-chefe do banco de investimento Morgan Stanley na China, Robin Xing, defendeu que "as 'stablecoins' não são novas moedas, mas novos canais de distribuição", apelando à indexação do yuan a uma criptomoeda como forma de manter a competitividade digital.

O Senado dos Estados Unidos aprovou já legislação para regular as 'stablecoins', numa vitória para o setor cripto e para a agenda de ativos digitais do Presidente norte-americano, Donald Trump. O secretário do Tesouro norte-americano, Scott Bessent, afirmou que as 'stablecoins' podem reforçar - e não ameaçar - a posição dominante do dólar.

A Morgan Stanley e outros analistas sugerem que a China poderia recorrer a Hong Kong para desenvolver 'stablecoins' em yuan fora do território continental, contornando as restrições internas. Empresas como a JD.com e a Ant Group já manifestaram intenção de solicitar licenças no novo quadro regulamentar lançado por Hong Kong, que permite emissões de 'stablecoins' referenciadas em moedas fiduciárias.

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A JD.com estima que o uso destas moedas pode reduzir os custos de pagamentos internacionais em 90% e os prazos de liquidação para menos de 10 segundos. A Zhejiang China Commodities City Group, operadora do maior mercado grossista do mundo, também planeia obter licença para emitir 'stablecoins'.

Analistas destacam que estas moedas digitais podem ajudar Pequim a capitalizar o crescente desconforto global com a dominância do dólar, sobretudo depois das sanções e congelamento de ativos impostos a Moscovo, na sequência da invasão russa da Ucrânia.

Em fevereiro, mais de 30% das trocas comerciais da China foram liquidadas em yuan - o valor mais alto da última década.

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Para Li Yang, presidente do Instituto Nacional de Finanças e Desenvolvimento, a China deveria adotar uma abordagem "em duas frentes": manter os esforços tradicionais de internacionalização do yuan - como os acordos de 'swap' cambial e o sistema de liquidação CIPS --- e explorar 'stablecoins' em yuan através de Hong Kong.

No entanto, analistas alertam que estas iniciativas podem enfrentar limitações se não forem acompanhadas por reformas económicas mais amplas. Segundo Eswar Prasad, professor da Universidade de Cornell, a eficácia das 'stablecoins' chinesas dependerá da unificação dos mercados cambiais interno e externo. Ainda assim, a sua adoção pode servir de incentivo para avanços em direção à liberalização financeira.

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