O abandono das medidas quantitativas por parte da Fed

Embora seja uma preocupação válida e digna da devida consideração, não pensamos que um aumento indiscriminado das taxas de rendibilidade (yields) das obrigações seja muito provável quando a Reserva Federal começar a abandonar a sua política expansionista quantitativa (QE).
David Buckle 24 de Junho de 2013 às 11:00

Já sabemos há algum tempo que Ben Bernanke tem estado preocupado com o aumento dos riscos decorrentes da procura de rendimento por parte dos investidores que, em última análise, deriva da política monetária extremamente acomodatícia da Fed. Por outro lado, também sabemos que Bernanke está inteiramente ciente dos riscos associados a uma recuperação brusca das yields a partir dos actuais níveis baixos. De facto, caso as yields das obrigações subissem demasiado rapidamente no início do processo de abandono, esperaríamos que a Fed gerisse as expectativas do mercado, possivelmente abrandando ou até invertendo temporariamente o processo de normalização.

É interessante registar que, no seu discurso de 1 de Março, Bernanke sublinhou que, se os aumentos das taxas fossem implementados demasiado cedo, isto levaria mesmo a uma queda das yields das obrigações. Embora não tivesse explicado porquê, na nossa opinião uma das razões pelas quais isto poderia acontecer seria o aumento inicial das yields causar a subida dos custos dos juros, levando a uma diminuição do rendimento disponível e a um abrandamento da procura na área da habitação.

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A comparação com 1994

Dos quatro ciclos de subidas de taxas que ocorreram desde 1988, só no ciclo de 1994 é que a yield norte-americana a 10 anos encerrou o ciclo mais de 75 pontos base acima do nível a que se situava no início do ciclo. Assim, só em 1994 tivemos um impacto relativamente indiscriminado da normalização da política da Fed, com o ciclo de aumento das taxas a resultar em perda de capital das obrigações. No entanto, com os cupões a 2% ou menos, os aumentos das yields de 25 pontos base ou mais por ano gerarão perdas de capital.

Para ser claro, sempre que as taxas da política monetária são normalizadas, as yields das obrigações sobem. No entanto, isto não significa que suceda necessariamente o que ocorreu em 1994. É difícil afirmar qual será a nova Fed Funds Rate ‘normal’ . Com base em expectativas de uma inflação média de 2,5% e numa taxa de curto prazo real média de 1,5%, 4% talvez seja razoável. A Fed considera que a yield das obrigações é decomposta na taxa de inflação prevista mais taxa de curto prazo real média mais um prémio de prazo. Por exemplo, uma taxa de inflação prevista de 2,5% + uma taxa real de 1,5% e + um prémio de prazo de 1%, resultam numa yield de 5%. Mas é a rapidez da subida que tem uma importância fundamental quer para os investidores quer para a economia. A boa notícia é que o mercado actualmente acredita que a Fed Funds Rate levará mais de 10 anos a normalizar, o que implica uma subida das yields lenta e passível de ser gerida.

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O maior motivo de preocupação para os investidores será a pressão ascendente exercida sobre as yields decorrente das expectativas de maior inflação face à melhoria e normalização da economia. Por exemplo, tal situação poderia ocorrer se o comité de política monetária dos EUA (FOMC) mantivesse uma política expansionista por um período demasiado longo mesmo que a inflação estivesse a aumentar. Apesar de não pormos inteiramente de parte este risco, pensamos que isto será pouco provável uma vez que a Fed afirmou claramente que só alterará a política monetária acomodatícia quando o desemprego diminuir suficientemente e/ou se a inflação ultrapassar os níveis previstos. A referência à inflação é muito importante porque tem como objectivo específico tranquilizar o mercado quanto ao facto de a Fed não permitir que a inflação se torne incontrolável.

Outro factor de risco que deve ser considerado é o aumento do prémio de prazo. A causa mais provável seria uma deterioração da situação fiscal nos EUA que levasse a um aumento da aversão dos investidores às Treasuries. No entanto, embora isto também não se deva pôr inteiramente de parte, ainda vemos pouco paralelismo com a situação em 1994, quando o ajustamento da política monetária por parte da Fed levou a um aumento acentuado das yields num período de tempo relativamente curto. A grande diferença entre o momento actual e 1994 é a grande melhoria verificada na comunicação da Fed com o mercado. Em 1994, as yields subiram rapidamente porque o mercado foi efectivamente surpreendido pelas intenções do FOMC – nessa altura, só recentemente é que o FOMC tinha começado a emitir comunicados sobre política monetária. Hoje, no entanto, sabemos que a Fed dá uma enorme importância às suas indicações ao mercado. Por isso, só é provável que haja um grande aumento das yields se a Fed alterar inesperadamente a sua atitude no que se refere à forma como pretende normalizar a política. Embora tal mudança em termos de percepção do mercado e de intervenção da Fed seja possível, pensamos que não é provável.

A sequência do processo de abandono é mais difícil de prever porque a Fed vai querer manter-se o suficientemente flexível para tomar decisões à medida que o processo avança. No entanto, o fim das medidas expansionistas quantitativas será certamente o primeiro passo, seguido da liquidação progressiva da dívida em títulos garantidos por hipoteca (MBS) do tesouro e das agências que estava a ser renovada – embora este processo se vá desenrolar ao longo de muitos anos. Como próximo passo, é possível que a Fed aumente as taxas de juro relativas às reservas excedentárias dos bancos (IOER) diminuindo gradualmente a quantidade das suas reservas através de repos (compras com acordo de revenda) e oferecendo às instituições depositárias depósitos a prazo. A venda de activos será o último recurso para reduzir a dimensão do balanço – sendo utilizado apenas quando a Fed deseja drenar as reservas mais rapidamente do que actualmente prevê.

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*Head of Quantitative Research da Fidelity

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