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José Veiga Sarmento - Economista
02 de Novembro de 2020 às 19:29

Obviamente, demito-o

“Obviamente, demita-o” poderia ser uma conclusão aplicável neste final de 2020, pela desconexão evidente entre as necessidades que decorrem da realidade e as soluções que promete a acção política.

A tirada bombástica que, em 1958, o rebelde general candidato à Presidência da República lançava com fragor num jogo político viciado, tinha tanto de óbvio como de ficção: todos sabiam que, apesar de essa ser a conclusão natural para o estado das coisas, tal não iria acontecer.

Eram, sem dúvida, fundadas as razões pelas quais um filho dilecto do regime tinha concluído que arrastar a situação política vivida na altura não conduziria a um futuro melhor. Os problemas eram reais, existenciais e nunca poderiam ser solucionados com a fórmula política instalada. No entanto, ninguém, nem muito provavelmente ele, tinha ilusões. O mundo do faz-de-conta tinha alicerces suficientemente fortes para fazer frente à realidade. E lá partimos para a guerra nas colónias e para a emigração em massa com destino a França e Alemanha.

Hoje, vivemos uma situação em que, apesar das enormes diferenças relativamente a 1958, se intui alguma similitude:

- Temos um primeiro-ministro que, num momento de crise existencial para a sua comunidade, ignora as preocupações da maioria do país e se fecha sobre as soluções do pequeno mundo que encontra na extrema-esquerda;

- Temos um líder que, numa situação crítica de saúde pública, se dedica a provocar os profissionais de saúde com que conta para fazer frente à pandemia;

- Temos um Governo que, conhecendo o manancial de ajuda externa de que irá dispor para preparar o futuro, não se preocupa em construir pontes e consensos duradouros que possibilitem a transformação do milagre instantâneo dos pães, em obras que naturalmente levam anos, legislaturas, a concretizar-se.

“Obviamente, demita-o” poderia ser uma conclusão aplicável neste final de 2020, pela desconexão evidente entre as necessidades que decorrem da realidade e as soluções que promete a acção política.

No entanto, um ponderoso conjunto de razões parece conjugar-se para assegurar a sobrevivência do mundo do faz-de-conta: desde o Presidente da República compreensivo à natureza das oposições políticas e à força opressora da pandemia. A própria gestão do calendário europeu com as ajudas financeiras aí à porta e a presidência portuguesa do Conselho Europeu no 1.º semestre de 2021 desaconselham adicionar turbulência à complexidade da situação. Porque não consegue a democracia portuguesa encontrar soluções que nos assegurem um melhor futuro colectivo?

Merecemos melhor.

Um ponderoso conjunto de razões parece conjugar-se para assegurar a sobrevivência do mundo do faz-de-conta.
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