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João Carlos Barradas - Jornalista
18 de Setembro de 2013 às 00:01

Polícia sem bastão

Pífio e canhestro na gestão da crise síria, Obama cedeu a mão a Putin, descredibilizou as suas ameaças de uso da força militar e irremediavelmente deixa em aberto um final de mandato que oscilará entre a tentação da intervenção musculada ou das tiradas ocas de cooperação multilateral.

Implausível e impraticável o acordo russo-americano para eliminação dos arsenais químicos da Síria evita uma derrota política a Obama na altura em que tem de negociar questões orçamentais no Congresso e adia para data incerta a impopular decisão de atacar militarmente o regime de Bashar al Assad.

O compromisso negociado por John Kerry e Sergei Lavrov é benéfico para Damasco e o seu aliado iraniano e revela a profunda relutância norte-americana em envolver-se directamente em novos conflitos militares no Médio Oriente.

A credibilidade da ameaça de uso da força por parte dos Estados Unidos para impedir o Irão de obter armas atómicas sofreu um sério revés e os estrategos e ideólogos de Teerão têm caminho aberto para optar, se assim o entenderem, por levar até ao extremo limite um programa nuclear militar.

Salvo a realização de testes nucleares, o Irão pode desenvolver sistemas de operacionalização militar de armas atómicas sem risco de intervenção norte-americano tendo a temer sobretudo um ataque israelita que Washington tenderá a conter.

Assad, o cumpridor

É do interesse de al Assad cumprir os termos do acordo que acatou, solicitando no último fim-de-semana a adesão à "Convenção de Armas Químicas", e fornecer até sábado uma lista compreensiva dos arsenais, sua localização, além de instalações para produção, pesquisa e desenvolvimento de armas químicas.

Até Novembro, a inspecção preliminar dos locais indicados pelo governo sírio deve estar completa e os técnicos da "Organização para a Proibição de Armas Químicas" terão de concluir a destruição de equipamentos de produção e municiamento.

Presumindo que o novel subscritor da Convenção Internacional que proíbe a produção, armazenamento e uso de armas químicas e seus percursores (tratado que continua por convencer os governos de Angola, Sudão do Sul, Egipto e Coreia do Norte) respeita os seus compromissos, até ao final do primeiro semestre do próximo ano a eliminação dos arsenais e instalações estará completa.

O plano é impraticável porque exige a presença no terreno e liberdade de movimento de centenas de técnicos e a cooperação das autoridades que, de acordo com os dados e provas circunstanciais tornadas públicas pelos peritos das Nações Unidas, utilizaram armas químicas nos arredores de Damasco a 21 de Agosto.

A dimensão dos arsenais de sarin, VX, e gás mostarda é ainda desconhecida e nas condições de guerra civil dificílima de apurar com rigor.

As técnicas ideais utilizadas para destruição de armas químicas implicam o recurso a incineração, separando componentes tóxicos e invólucros metálicos, ou neutralização de elementos tóxicos por hidrólise.

Estes processos delicados e morosos obrigam ao uso de instalações especializadas ou transporte seguro de gases em condições estáveis para o exterior do país.

Métodos expeditos como o lançamento de armas e produtos tóxicos ao mar, utilizado para destruir os arsenais nazis, ou a queima em poços ao ar livre, praticado após a queda de Saddam Hussein, são inaceitáveis ao abrigo da boa consciência ecológica.

Obama, o incerto

A guerra civil em curso impedirá, contudo, a prossecução do plano propiciando pretextos de todo o tipo a qualquer das partes para denunciar o seu incumprimento quando politicamente conveniente.

Aqui, Obama acaba encurralado.

Se alegar incumprimento da parte de Bashar al Assad terá de cumprir a ameaça de ataque militar, que, ou segue o pedido inicial entretanto suspenso de autorização do Congresso, e será de duração e impacto muito limitado, ou assumirá um cunho mais destrutivo requerendo difícil negociação na Câmara de Representantes e Senado.

Nas Nações Unidas, os Estados Unidos terão de assegurar uma autorização do Conselho de Segurança praticamente impossível de obter sem aval de Moscovo.

Os Estados Unidos não têm aliados ou clientes entres os protagonistas de uma guerra civil sem fim nem vencedores a curto prazo.

Os fundamentalistas sunitas acabarão por prevalecer, sendo incerto o destino da minoria alauíta fadada à irrelevância ou confinada a um mini-estado étnico nas margens do Mediterrâneo e é esta premissa que condiciona todos os cálculos.

O arrastamento do conflito gera, no entanto, impoderáveis cada vez maiores sobre as reacções que vai suscitando no Iraque, Líbano, Jordânia, Turquia e Israel.

As monarquias do Golfo e o Irão prosseguem a guerra por interpostos agentes e pouco confiáveis clientes, num confronto agravado pela ausência de mediação do Egipto onde os generais, apoiados pela minoria copta e alguns sectores laicos tentam esmagar os "Irmãos Muçulmanos".

Pífio e canhestro na gestão da crise síria, Obama cedeu a mão a Putin, descredibilizou as suas ameaças de uso da força militar e irremediavelmente deixa em aberto um final de mandato que oscilará entre a tentação da intervenção musculada ou das tiradas ocas de cooperação multilateral.

Nada que convença seja quem for em terras habituadas à lei da força.

* Jornalista

barradas.joaocarlos@gmail.com

http://maneatsemper.blogspot.pt/

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