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Filipe Santos - Dean da Católica Lisbon School of Business & Economics
09:15

Portugal a crescer acima de 3%

O relatório que desenvolvemos apresenta uma visão de copo meio cheio sobre o futuro de Portugal, focada em fatores estruturais e de competitividade.

A economia portuguesa cresceu 3,1% em 2023 e 2,1% em 2024 segundo os dados mais recentes do INE. O crescimento deste ano deverá ser de 2% e a expectativa para os próximos anos aponta para crescimentos entre 2 e 2,5%. Poderá que a Economia surpreender pela positiva e repetir o excelente desempenho de 2023? O relatório do Centro de Estudos Aplicados da CATÓLICA-LISBON que apresentei esta semana no Portugal Capital Markets Day sugere que sim, pois há condições estruturais para se iniciar um forte ciclo de investimento privado. Este ciclo de investimento tem origem na competitividade de Portugal em termos de infraestruturas e potencial de inovação, temas que o estudo analisou em profundidade.

Comecemos pelo Portugal do presente e o desempenho da economia de 2022 a 2025, anos em que houve um crescimento acumulado de 12,2%, o dobro da média europeia. Este crescimento é explicado pelo aumento do emprego em mais de 6%, para um recorde de 5,3 milhões de empregados. Este crescimento só foi possível pelo aumento anual de cerca de 100.000 da população residente, fruto de um saldo migratório positivo de 150.000 pessoas que mais do que compensou o défice demográfico, levando a um aumento anual de 1,5% da população empregada. É importante notar que, no campo da imigração, Portugal tem a enorme vantagem face aos outros países de 75% da sua imigração ser culturalmente próxima e 50% partilhar da mesma língua, sendo mais fácil de integrar no mercado de trabalho.

É notável este crescimento ter sido conseguido apesar de uma política orçamental restritiva, com excedentes orçamentais todos os anos desde 2023 e a mais rápida redução da dívida pública que há memória, de mais de 131,5% do PIB em 2016 para perto de 90% em 2025. Com o emprego em máximos e o desemprego abaixo de 6%, a poupança está a aumentar e a população em risco de pobreza ou exclusão reduziu-se para menos de 20% em 2024, valor abaixo da média europeia.

O potencial de crescimento da economia portuguesa, contando com o fator de conhecimento e o aumento do emprego, está já acima de 2,5%. No entanto, o investimento continua a ser o calcanhar de Aquiles da economia portuguesa. Se o investimento aumentasse, a economia podia crescer acima de 3% de forma sustentada. É aqui que o relatório analisa as vantagens infraestruturais e de inovação da economia portuguesa. Ao contrário da visão tradicional de uma economia muito dependente do turismo e de mão de obra barata, a economia portuguesa é hoje moderna e competitiva em dimensões-chave que estão alinhadas com as prioridades de investimento da Europa. Esta é a análise do Portugal do futuro.

Desde logo se destaca a competitividade energética de Portugal em produção de fontes renováveis, com uma posição única de liderança em três áreas — energia hídrica, eólica e solar. Este mix energético já permite produzir 75% da eletricidade consumida em Portugal e 35% do total de consumo de energia, o que permite ter custos da energia para clientes industriais abaixo da média europeia. Este é um fator competitivo chave para a reindustrialização e, em particular, para investimentos associados à economia digital. Junta-se a liderança de Portugal na penetração de telecomunicações de fibra ótica, com mais de 95% dos domicílios cobertos, a cobertura total de 5G no território nacional, e conexões privilegiadas de dados através de cabos submarinos com as Américas e África, fazendo de Portugal um hub de interconexão da economia digital e potenciando investimentos em centros de dados e tecnologias associadas à transição energética.

As vantagens estruturais de Portugal passam também pelos recursos naturais. As albufeiras portuguesas apresentam elevada disponibilidade de água, perto de 80% e acima da média histórica, numa fase em que a época mais chuvosa se aproxima. Teremos água em Portugal para o próximo ciclo económico de 3-4 anos, favorecendo a produção energética e o aumento das áreas de irrigação agrícola, processo que se tem desenvolvido, em particular no sul de Portugal, com o Alqueva, que tem levado a uma revolução da produtividade agrícola nos últimos anos. É também de aproveitar os recursos naturais únicos de Portugal, nomeadamente a floresta (essencial para setores como a pasta de papel, a cortiça, o azeite e a vinha, em que temos fortes posições ao nível mundial), a enorme zona marítima económica exclusiva de Portugal e a exploração das reservas de lítio, de que temos as maiores reservas da União Europeia.

A outra transformação de Portugal retratada pelo estudo foi a explosão de capital humano desde o ano 2000. Entre 2000 e 2025 a proporção da população com ensino superior mais do que triplicou, levando à capacitação da força de trabalho portuguesa no segmento dos 18–45 anos para o nível médio europeu. Fomos também o país da Europa que nos anos recentes mais aumentou o número de alunos no ensino superior, alavancado pela crescente internacionalização do nosso sistema de ensino superior, com particular expressão nas escolas de negócios, engenharia e ciências. O caso da gestão é paradigmático desse potencial, sendo, por exemplo, internacionais já metade dos 3000 alunos da CATÓLICA-LISBON. E aqui reside a outra força de Portugal no contexto global. Temos vantagens competitivas na atração de talento qualificado e beneficiamos de um crescimento expressivo da imigração qualificada e de pessoas com elevados recursos, estando Portugal nos tops mundiais de atratividade para expatriados e milionários.

A terceira âncora desta transformação de Portugal é o ecossistema de inovação vibrante que o país desenvolveu nos últimos anos. Existem polos de inovação que potenciam várias cidades portuguesas além de Lisboa, existindo inovação e atração de centros de competências de multinacionais por todo o país, em particular no Porto, Braga, Aveiro, Coimbra e Évora. Portugal hoje faz ciência de qualidade mundial e tem um ecossistema de transferência de tecnologia para o mercado e desenvolvimento de startups e scaleups, que, embora sejam empresas globais, desenvolvem centros de competência em Portugal.

A economia portuguesa é assim muito mais do que turismo e imigração. É talento e inovação concretizada em polos de inovação distribuídos pelo país, potenciando diferentes setores e geografias. E temos uma região do país — Sines — com características para se tornar um polo industrial e digital à escala global dado o seu porto de águas profundas, o acesso a energia renovável e as excelentes conexões energéticas e digitais. Os recentes anúncios de elevados investimentos energéticos, industriais e digitais em Sines não surpreendem.

É verdade que o contexto geopolítico é desafiante, mas Portugal apresenta condições vantajosas para competir num contexto de reafirmação da autonomia estratégia e industrial da Europa. A nossa indústria (calçado, têxtil, metalomecânica, entre outras) esteve 20 anos a modernizar-se desde o choque competitivo do Euro e da globalização, beneficiando agora do movimento de near-shoring das cadeias de valor europeias.

O relatório que desenvolvemos apresenta uma visão de copo meio cheio sobre o futuro de Portugal, focada em fatores estruturais e de competitividade. Na espuma dos dias dos pequenos escândalos, muitas vezes esquecemo-nos de olhar para o essencial. Não é por acaso que a economia portuguesa tem tido um desempenho acima da média europeia desde 2022. E há esperança de que este desempenho continue e se aprofunde. Não é a esperança baseada na miragem, mas a esperança alicerçada em fatores estruturais que reforçam a competitividade da economia e a sua capacidade de continuar a atrair talento e investimento, criando valor de forma sustentada.

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