Prioridades de política económica
As eleições legislativas estão à porta e a campanha continua dominada pela espuma dos dias, nomeadamente os casos que afetam os políticos, bem como um conjunto de promessas de benesses à população. No entanto, governar bem é fazer escolhas criteriosas com recursos escassos, e para fazer escolhas é necessário balizas e prioridades.
As eleições legislativas estão à porta e a campanha continua dominada pela espuma dos dias, nomeadamente os casos que afetam os políticos, bem como um conjunto de promessas de benesses à população. No entanto, governar bem é fazer escolhas criteriosas com recursos escassos, e para fazer escolhas é necessário balizas e prioridades. Elenco um conjunto de balizas e prioridades-chave que deveriam preocupar quaisquer futuros governantes e sobre as quais deveria ser possível encontrar um consenso entre os principais partidos:
1-Continuada redução da dívida pública: Portugal tem tido uma história cíclica de crises financeiras públicas, a resolução das quais acarreta sempre um custo enorme para a economia e para os cidadãos. A mais recente, e porventura a mais grave, foi a crise de 2010-11 que obrigou Portugal a aceitar o apoio internacional da troika e iniciar um processo de reformas, doloroso, mas eficaz, até 2014. Uma década após o fim dessa crise, Portugal tem tido um desempenho das contas públicas excecional com saldos anuais positivos desde 2023, tendo mesmo um recorde mundial de redução da dívida pública de 135% do PIB em 2021 para cerca de 95% no final de 2024. Défices públicos não são tabus, mas qualquer governo deveria prosseguir a estratégia de redução da dívida pública sobre o PIB (o que obriga a manter um défice inferior a 2%), com o compromisso adicional que qualquer aumento do défice deverá ser para financiar investimento público e não para medidas que aumentem de forma permanente a despesa.
2-Aumento do investimento público: um aspeto negativo do equilíbrio das contas públicas é ter sido conseguido em grande parte através de uma redução histórica do investimento público, o que é notório num conjunto de setores, nomeadamente a habitação. Acresce o desafio da previsível redução dos fundos europeus que têm financiado durante décadas muito investimento público. Em 2025 e 2026 teremos ainda um recorde de fundos europeus, com a fase final do PRR e o Portugal 2030 a entrar em velocidade de cruzeiro. No entanto, é já claro que a disponibilidade de fundos europeus vai reduzir-se em ciclos futuros, pois a política europeia de competitividade industrial e de defesa vai sobrepor-se às políticas de coesão. Portugal terá de começar a fazer uma análise muito séria de prioridades de alocação de fundos e quais as despesas subsidiadas por fundos que terão que determinar e quais as que devem ser substituídas por Orçamento de Estado e alinhadas com as prioridades de investimento.
3-Política demográfica inteligente: com a quarta população mais envelhecida do mundo e a segunda mais envelhecida da Europa, Portugal tem de pensar seriamente a sua política demográfica, nas vertentes de natalidade e imigração. Isso exige investir a longo prazo através de políticas de promoção da natalidade, dando capacidade às famílias de classe média de terem mais filhos e conseguirem educar esses filhos. Os efeitos do envelhecimento da população só não são mais notórios e penalizantes para a economia devido ao elevado nível de imigração, em particular nos últimos três anos, o qual tem levado a um aumento da população todos os anos e colocado o nível de emprego em máximos históricos. É de salientar que, sem imigração, Portugal perderia mais de 15% da sua força de trabalho em idade ativa nos próximos 20 anos (cerca de 1 milhão de pessoas). Com a imigração, não só a população e a força de trabalho estão em recordes históricos, como a economia portuguesa tem conseguido incorporar de forma produtiva trabalhadores imigrantes de diferentes níveis de qualificação, permitindo o crescimento de um conjunto importante de setores. É fundamental que os portugueses percebam que a força recente da economia e o excedente das contas públicas se deve largamente à imigração. É fundamental uma política de imigração regulada, mas aberta e convidativa ao talento mundial. E este trabalho nas áreas da natalidade e imigração deve ser complementado com uma reflexão profunda sobre o tema da longevidade, incluindo cuidados de saúde para pessoas mais idosas, modelos de trabalho flexíveis no final da carreira profissional, bem como a sustentabilidade do sistema de pensões.
4- Política fiscal: a primeira prioridade fiscal deve ser a redução da carga fiscal para a classe média (pois a classe média-baixa já praticamente não paga IRS). Taxas elevadas de IRS incidem sobre rendimentos médios numa progressividade das tabelas de IRS que é desajustada face ao nível económico de muitos portugueses e coloca uma carga fiscal superior a 50% sobre o fator trabalho, ao contar o IRS e as contribuições para a Segurança Social. Isso deve ser alterado sob o risco de penalizar a criação de emprego, o aumento de salários e a competitividade da economia, bem como a qualidade de vida da população. Sem uma classe média forte e com perspetivas de futuro, o país pode aumentar uma classe de pessoas que alimentam os extremos. A segunda prioridade deve ser a criação de incentivos fiscais para a promoção do investimento privado pelas empresas na investigação e desenvolvimento, na formação contínua dos seus colaboradores e na atração de emprego qualificado, reforçando a base de capital humano e tecnológico que permite construir uma economia mais competitiva num contexto de mudança tecnológica acelerada.
Por fim, a reflexão que se impõe é também estratégica sobre o posicionamento de Portugal no novo contexto geopolítico mundial. Em que áreas da Defesa queremos focar os nossos esforços para aproveitar os investimentos europeus que serão dirigidos a este setor? Como vamos continuar a atrair para Portugal os centros de competências das multinacionais europeias no processo em curso de reconfiguração das cadeias de valor globais? Como vamos conseguir enquanto país continuar a ser um destino atrativo para o talento e investimento globais? Como potenciar a vantagem energética, de localização, e de telecomunicações para crescer a economia nas áreas digitais? As eleições são também uma oportunidade de discutir os caminhos do nosso desenvolvimento e prosperidade num contexto desafiante, mas pleno de oportunidades.
Mais lidas