Coelho bitolar
Tantos anos a formatar "T" e "Pi" deitados para acabar tudo estatelado na horizontal. No eixo do desvario orçamental, o TGV acabou por despenhar-se a alta velocidade sem nunca ter saído do papel. A crise abateu o sonho, desconhecendo-se a factura final deste pesadelo. Com o defunto ainda longe de ser autopsiado, eis que o Governo já carrilou uma alternativa.
Tantos anos a formatar "T" e "Pi" deitados para acabar tudo estatelado na horizontal. No eixo do desvario orçamental, o TGV acabou por despenhar-se a alta velocidade sem nunca ter saído do papel. A crise abateu o sonho, desconhecendo-se a factura final deste pesadelo. Com o defunto ainda longe de ser autopsiado, eis que o Governo já carrilou uma alternativa.
Na passada quarta-feira, durante uma visita a Sines, o primeiro-ministro anunciou a construção, "a ser executada até 2014", de uma linha de mercadorias em bitola europeia a ligar o porto alentejano a Espanha com destino além-Pirinéus. Todos ouvimos e calámos.
Quatro dias depois, em rodapé, o "Expresso" dava conta que "a linha de mercadorias para Espanha gera dúvidas", avançando que "este projecto está longe de ser simples". Anteontem, o "Público" puxava para manchete que "Passos anunciou linha ferroviária que não tem continuação em Espanha". É que, no país vizinho, essa bitola só começa em Barcelona, não existindo por parte do governo espanhol qualquer compromisso em fazer a migração da bitola nos cerca de 1.200 quilómetros que separam Badajoz da fronteira francesa.
Ao tirar da cartola este descamisado "coelho", Passos pôs-se, mais uma vez, a jeito para ser acusado de firmar certezas sobre matérias que não conhece com a profundidade que se exige a um primeiro-ministro. E o PS, que mostrou um profundo desconhecimento desta "bitolada" até os jornais revelarem a marosca, foi lesto a vir a público dizer que Passos "não estudou o dossiê" da alta velocidade e substituiu o TGV por uma alternativa que pode ser só uma "ilusão".
Pior: a linha agora inventada nem sequer é desejada pelos operadores ferroviários. Olhe-se para o exemplo do braço português da alemã DB Schenker, que há dois meses arrancou com uma pioneira (em Portugal) ligação regular de transporte ferroviário de mercadorias a passar os Pirinéus , seguindo para a Alemanha. Fá-lo na perfeição, a um preço concorrencial e "imbatível" no tempo de trânsito. Diferenças de bitola, de sistemas de alimentação e de sinalização? Tudo ultrapassado com distinção. Afinal, há soluções logísticas alternativas às megalómanas e impraticáveis. E sem ajudas públicas!
Coordenador do Negócios Porto Visto por dentro é um espaço de opinião de jornalistas do Negócios
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