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Hans-Werner Sinn - Presidente do Instituto Ifo
29 de Março de 2016 às 20:30

A imigração do Estado Social

Se querem manter a liberdade de movimentos dentro da Europa, os Estados sociais enfrentam uma decisão difícil: ou se ajustam ou entram em colapso.

Os conflitos armados que estão a afectar alguns países árabes geraram uma onda de refugiados em direcção à Europa. Cerca de 1,1 milhões de pessoas chegaram à Alemanha só em 2015. Ao mesmo tempo, a adopção do princípio da liberdade de movimentos dentro da Europa gerou uma migração maciça, mas pouco noticiada, intra-europeia. Em 2014, a Alemanha recebeu 304 mil pessoas de outros países europeus. E é provável que em 2015 o número tenha sido semelhante.

Alguns Estados-membros, como a Áustria, Hungria, Eslovénia, Espanha, França, e os, anteriormente, hospitaleiros Dinamarca e Suécia, optaram por, praticamente, suspender o Acordo de Schengen e repor os controlos fronteiriços. Na verdade, os economistas não estão surpreendidos com esta decisão. Nos anos 90, dezenas de estudos académicos abordaram o impacto da migração nos Estados sociais, tendo discutido muitos dos problemas de hoje. Eu próprio escrevi muito sobre o tema na altura, tentando – muitas vezes em vão – chamar a atenção dos decisores políticos.

Alguns Estados-membros, como a Áustria, Hungria, Eslovénia, Espanha, França, e os, anteriormente, hospitaleiros Dinamarca e Suécia, optaram por, praticamente, suspender o Acordo de Schengen e repor os controlos fronteiriços. Na verdade, os economistas não estão surpreendidos com esta decisão. Nos anos 90, dezenas de estudos académicos abordaram o impacto da migração nos Estados sociais, tendo discutido muitos dos problemas de hoje. Eu próprio escrevi muito sobre o tema na altura, tentando – muitas vezes em vão – chamar a atenção dos decisores políticos.

 

Está em jogo uma questão muito importante. Os Estados sociais estão definidos segundo o princípio de que os cidadãos com mais rendimentos pagam mais impostos e contribuições do que aquilo que recebem em serviços públicos. Já os cidadãos com menos rendimento pagam menos do que aquilo que recebem. Esta redistribuição, que canaliza os recursos públicos para os cidadãos com mais baixos rendimentos, é uma correcção à economia de mercado. Uma espécie de seguro contra as vicissitudes da economia de mercado e que tem pouco a ver com equidade.

Os Estados sociais são incompatíveis com a liberdade de movimento de pessoas entre países se os recém-chegados tiveram acesso total e imediato aos benefícios públicos nos países de acolhimento. Nestes casos, os países podem funcionar como ímanes sociais, que atraem mais imigrantes do que seria, economicamente, desejável porque os recém-chegados recebem, além do seu salário, um subsídio de migração em forma de transferências públicas. Só existirá uma auto-regulação eficiente da migração se os migrantes receberem apenas o salário.

O primeiro-ministro britânico, David Cameron, chegou à conclusão correcta: o magnetismo social não só leva a uma distribuição geográfica ineficiente das pessoas, como penaliza o próprio magnetismo. É por este motivo que Cameron exige a limitação do princípio da inclusão, mesmo para os migrantes económicos intra-europeus. Mesmo que estas pessoas encontrem trabalho, afirma Cameron, só devem ter acesso aos benefícios sociais quatro anos mais tarde. Actualmente, o período de espera só é aplicado a pessoas sem trabalho, que devem residir no Reino Unido durante cinco anos para obter acesso total aos benefícios públicos.  

A proposta não implica, necessariamente, maiores dificuldades para os migrantes da União Europeia. Significa apenas que, durante estes quatro anos, o apoio deve ser financiado pelos países de origem. Durante alguns anos, e até que o princípio da inclusão seja aplicado, o país de origem deve continuar a ser responsável pelo pagamento dos benefícios sociais. 

É difícil perceber porque é que um beneficiário alemão que não encontra trabalho deve ser suportado pelo Estado espanhol se decidir viver em Maiorca. Seria igualmente implausível negar a esta pessoa o direito de escolher o seu local de residência apenas para proteger o Estado espanhol. Se queremos levar a sério o princípio da liberdade de movimentos das pessoas, devemos acabar com a vaca sagrada da elegibilidade imediata dos benefícios sociais. Isto, como é óbvio, não se aplica aos migrantes económicos de países não europeus. E muito menos aos refugiados. O principio do país de origem seria impossível de aplicar nestes casos. Mas pelas mesmas razões expostas antes, estes migrantes não podem ser integrados no Estado social sem prejudicar a sua viabilidade.

Além disso, o actual sistema de substituição do salário por benefícios, aplicado a quem não tem trabalho, deve ser substituído por um sistema que oferece suplementos salariais e trabalho comunitário. Isto reduziria os custos e os incentivos para migrar. Andre Nahles, ministro alemão do Trabalho, sugeriu, recentemente, esta ideia, defendendo o que alemães chamam postos de trabalho de um euro, "one-euro-jobs", que basicamente convertem os benefícios sociais em salários.

Parece uma ideia sensata numa situação que, de outra forma, seria caótica. Se querem manter a liberdade de movimentos dentro da Europa – e se continuar a entrada maciça de cidadãos não europeus – os Estados sociais da Europa enfrentam uma decisão difícil: ou se ajustam ou entram em colapso.

 

Hans-Werner Sinn, professor de Economia e Finanças Públicas na Universidade de Munique, é presidente do instituto de pesquisa económica Ifo e conselhiero do ministro da Economia alemão. É autor do livro The Euro Trap: On Bursting Bubbles, Budgets, and Beliefs.

 

Direitos de Autor: Project Syndicate, 2016.

www.project-syndicate.org

Tradução: Ana Luísa Marques 

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