Uma questão de higiene
Se as razões justificavam tão longo adiamento ainda está por provar mas a verdade é que a suspensão apenas foi levantada 15 anos mais tarde, em 2001, e a regulamentação aprovada em 2002. Para produzir efeito prático em 2005.
Os anos deveriam ter servido para a adaptação das empresas, mas muito poucas o fizeram. Um estudo da Dun & Bradstreet revelava que 2.820 empresas (de um universo 21.253) se encontravam em incumprimento do artigo 35. Tendo em conta que há cerca de 350 mil sociedades, pode avaliar-se o número de empresas afectadas, mesmo descontando aquelas que se encontram na prática inactivas.
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Perante tais previsões, logo surgiu o coro a favor de um novo adiamento. Por muitas e boas razões, onde avultam as dificuldades provocadas pela recessão dos dois últimos anos.
O problema é que haverá sempre muitas e boas razões para continuar a adiar o inadiável, sendo que a atitude complacente dos últimos 20 anos não provocou nenhum milagre económico português. Bem pelo contrário, permitiu a permanência no mercado de entidades que vivem praticamente à margem do sistema, desvirtuam a concorrência, prejudicam as empresas saudáveis e impedem a modernização do tecido económico. No «Portugal 2010», estudo da McKinsey que detectou que Portugal apresentava, em média, uma produtividade de cerca de metade dos países desenvolvidos, a «informalidade da economia» foi identificada como a principal causa do desvio.
Cerca de 150 mil empresas, metade do universo registado, apresentam sistematicamente prejuízos e, consequentemente, nada pagam ao Estado. Mas se muitas e boas razões existem para que assim seja, ninguém consegue explicar porque motivo permanecem no mercado sociedades que nunca conseguem alcançar aquela que devia ser a sua razão de ser: ter lucro.
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Adiar a entrada em vigor do artigo 35 é, por isso, transigir com esta realidade. Defender a sua aplicação é uma questão de higiene.
Há que reconhecer que, desta vez, a generalidade dos representantes patronais é a favor da aplicação da lei, embora defenda mecanismos (como a reavaliação dos activos defendida pela CIP) que suavizem o seu impacto.
Mas o problema não é exclusivo dos empresários. O Estado, que tutela empresas públicas que são sociedades anónimas, tem pela frente necessidades de financiamento da ordem dos 2.000 milhões de euros, de acordo com o levantamento realizado pelo Jornal de Negócios. Não espanta portanto que do próprio Governo surjam sinais de que se pretende abrir «excepções» para as empresas de capitais públicos. Uma intenção muito pouco moralizadora e que esquece que o exemplo tem de vir de cima.
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