Comércio da UE com a Ucrânia atinge excedente recorde mas expõe dependência agrícola
O saldo comercial atingiu um máximo histórico de 6,4 milhões em excedente. No entanto, registou-se uma queda nas importações e um ligeiro recuo nas exportações no segundo trimestre.
O comércio de bens entre a União Europeia (UE) e a Ucrânia registou, no segundo trimestre de 2025, uma forte divergência entre importações e exportações. Segundo dados divulgados esta sexta-feira pelo Eurostat, as importações da UE provenientes da Ucrânia caíram 9,3% face ao trimestre anterior, enquanto as exportações para o país praticamente estagnaram, com uma ligeira descida de 0,1%.
Em comparação com o mesmo período de 2024, as importações recuaram 14,7% e as exportações cresceram 10,7%. O saldo comercial europeu com a Ucrânia atingiu assim um máximo histórico de 6,4 mil milhões de euros em excedente, de acordo com os dados do Eurostat.
No mesmo relatório, a agência estatística europeia destaca que a importância da Ucrânia nas exportações extra-UE aumentou de 1,3% no segundo trimestre de 2021 para 1,8% no mesmo trimestre de 2025, enquanto a sua participação nas importações recuou ligeiramente no mesmo período. Desde 2022, o bloco europeu passou a registar défices comerciais com a Ucrânia em categorias como alimentos, bebidas, tabaco e matérias-primas, reflexo do aumento das compras agrícolas ao abrigo das Medidas Comerciais Autónomas (ATM), que suspenderam tarifas e quotas. Em contrapartida, a UE aumentou a venda de maquinaria, veículos e outros bens industriais destinados a sustentar a capacidade produtiva e a infraestrutura ucraniana, num esforço de apoio económico em plena guerra.
Dependência agrícola agrava-se
Os dados também revelam que a dependência europeia dos produtos agrícolas e florestais ucranianos se intensificou. Entre 2021 e 2024, a quota da Ucrânia nas importações da UE subiu de 36% para 45% no óleo de soja e de 87% para 94% no óleo de girassol. No milho, passou de 51% para 67%, ao passo que nas sementes de colza/rape aumentou de 39% para 56%. Também a madeira reforçou a posição da Ucrânia no mercado europeu, passando de 10% para 12% das importações, tornando-se o segundo maior fornecedor depois da China. Já no ferro e aço, o peso da Ucrânia caiu de 11% em 2021 para 5% em 2024, num contexto de reconfiguração dos fluxos globais, em que Índia, Coreia do Sul e China ganharam quota às custas de Rússia e Ucrânia.
No que toca às exportações, os principais grupos de produtos enviados da UE para a Ucrânia foram combustíveis, maquinaria elétrica, veículos, maquinaria pesada e produtos farmacêuticos. Todos registaram aumentos entre 2021 e 2025, sendo o maior ganho observado nos combustíveis, com mais 1,2 mil milhões de euros exportados nesse período.
De acordo com a Comissão Europeia, em 2024 o comércio total de bens entre a UE e a Ucrânia ascendeu a 67,2 mil milhões de euros, dos quais 24,5 mil milhões corresponderam a importações da Ucrânia e 42,7 mil milhões a exportações. Atualmente, mais de metade do comércio internacional da Ucrânia é feito com o bloco europeu.
Pressões políticas e futuro do acordo comercial
O enquadramento político também poderá alterar a trajetória deste comércio. Em junho de 2025, a UE iniciou a revisão do Acordo de Comércio Livre com a Ucrânia (DCFTA), com vista a introduzir mecanismos de quotas e novas exigências regulatórias em áreas como pesticidas ou bem-estar animal. Segundo cálculos citados pela Reuters, Kiev poderá perder até 3,5 mil milhões de euros por ano caso as preferências comerciais sejam totalmente eliminadas. Em contrapartida, a UE lançou recentemente um mecanismo de garantias públicas de exportação, no valor de 300 milhões de euros, para apoiar empresas europeias que exportam para a Ucrânia, tendo a Dinamarca sido o primeiro país a aderir ao esquema, de acordo com a agência.
No balanço do segundo trimestre de 2025, o comércio da UE com a Ucrânia evidencia assim uma dupla realidade: por um lado, um excedente recorde que reflete a força das exportações europeias; por outro, uma dependência crescente de bens agrícolas e matérias-primas ucranianas que poderá tornar-se um ponto sensível.
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