Indiretos e desiguais
Em 2016, o consumo de combustíveis em Espanha subiu 3,2%, em linha com o aumento do PIB. Em Portugal subiu apenas 0,2%... Não há milagres.
A FRASE...
"A receita fiscal líquida do subsetor Estado, até dezembro de 2016, registou um aumento de 1.375,4 milhões de euros (+3,5%) face ao período homólogo, explicado pelo desempenho favorável da receita dos impostos indiretos."
Síntese de Execução Orçamental, DGO, 29 de janeiro de 2017
A ANÁLISE...
Em 2016, o Governo aumentou o ISP sobre os combustíveis rodoviários em 6 cêntimos, reduzidos depois a 4. Já em 2017 o imposto sobre o gasóleo, o combustível mais utilizado pelos portugueses, aumentou mais 2 cêntimos.
Segundo os dados de execução orçamental da DGO, Direção-geral do Orçamento, as receitas com este imposto aumentaram 551,4 milhões de euros em 2016 face a 2015. Como o consumo de combustíveis em Portugal praticamente não aumentou, a decisão do Governo retirou diretamente 678,2 milhões de euros, 551,4 acrescidos de 126,8 milhões de 23% de IVA, dos bolsos dos condutores portugueses para financiar um aumento de 610,6 milhões de euros de despesas de pessoal, e um aumento de despesas de pensões não quantificável com os dados disponíveis na DGO. Tal medida é, porém, uma medida legítima do Governo na cobrança e afetação de receitas do Estado.
Contudo, o ISP é um imposto "cego" e não progressivo. Ou seja, atinge igualmente ricos e pobres ao contrário do IRS. O Governo, cumprindo as suas promessas de reposição de rendimentos nas pensões mais altas e salários acima dos 1.500 euros, penalizou em quase 700 milhões de euros todos os que necessitam da viatura para se deslocar, independentemente da sua condição social. Aumentou a desigualdade entre os que vivem nas cidades e os que vivem nos subúrbios ou nos meios rurais, na interioridade desfavorecida, nos agricultores ou nos professores que se deslocam para dar aulas, p.e., longe da oferta dos transportes públicos dos centros urbanos. E os défices de exploração dos metros de Lisboa e Porto continuam a ser pagos por todos os portugueses, mesmo que não os usem.
Para lá destas questões de desigualdade social e regional, o efeito imediato é o aumento da diferença de preços entre Portugal e Espanha e desvio do consumo e de receitas fiscais correspondentes. Em 2016, o consumo de combustíveis em Espanha subiu 3,2%, em linha com o aumento do PIB. Em Portugal subiu apenas 0,2%... Não há milagres.
Artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico
Este artigo de opinião integra A Mão Visível - Observações sobre as consequências directas e indirectas das políticas para todos os sectores da sociedade e dos efeitos a médio e longo prazo por oposição às realizadas sobre os efeitos imediatos e dirigidas apenas para certos grupos da sociedade.
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