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Pedro Santana Lopes - Advogado
16 de Outubro de 2014 às 00:01

As conversas estragadas

O País vive nestas contradições permanentes. Tomemos como exemplo o futebol: até aqui há dias, a geração dos jogadores que foram ao Mundial do Brasil (talvez fora o caso de Cristiano Ronaldo) estava acabada, precisava de renovação, e o drama é que não tinha sucessão à altura.

 

Cheguei a ler que, pela primeira vez desde há muitos anos, uma geração acabava sem que se vislumbrasse substituta. Agora, Portugal qualificou-se para o Europeu de Sub-21, fez belas exibições contra a Holanda, um país com poder também no futebol, e, de repente, eis que rapidamente, em poucas semanas, voltámos a ter uma nova grande geração de futebolistas que está para chegar. Todos eles "meninos fantásticos". É um pouco também como as discussões sobre as cheias em Lisboa. Agora, discute-se se o problema é o plano de drenagem ou não. Como, pelos vistos, consideram que nunca houve plano de drenagem, então de cada vez que chovia em igual quantidade e coincidia com a maré - que, nestas coisas, na versão oficial, coincide quase sempre -, então as cheias deviam ser sempre iguais. Ora, como já choveu anteriormente em iguais proporções, não havia também o tal plano de drenagem, não houve cheias tão grandes, como explicar, como resolver a equação?

Depois, a nível do Governo. É constantemente acusado de insensibilidade social e de obsessão excessiva com o cumprimento do défice. Ora, depois da saída da troika e dos chumbos do Tribunal Constitucional, o Governo entendeu que não tinha de castigar mais a população e decidiu acrescentar mais duas décimas ao défice previsto. Pois, eis que alguns espíritos se começaram logo a incomodar, por o Governo não cumprir o défice. Então como é que queriam? Como resolver esta equação? Se o Tribunal Constitucional decidiu como decidiu, se as despesas, nomeadamente com prestações sociais, tiveram evolução em função da crise, que golpe de feitiçaria é que podia aumentar a receita e diminuir a despesa para haver mais alguma sensibilidade social? Todos queriam a subida do salário mínimo, todos queriam uma reduçãozinha nos impostos, então como acomodar tanta opção de sensibilidade social sem o défice subir um bocadinho?

Passamos a vida na conversa estragada e pouco conclusiva. Constrói-se um enredo e depois passa-se a agir em conformidade, como, por exemplo, na colocação de professores. Alguma vez o PS pediu a demissão da ministra da Educação quando houve manifestações em 2008 no Terreiro do Paço de 100 mil professores? Alguma vez o PS pediu a demissão de Maria Lurdes Rodrigues? Quantos professores havia por colocar na altura? E em 2010, já com Isabel Alçada, quantos professores entraram também no caos processual de colocações?

Posso estar enganado, mas tenho ideia de que o PSD, com Luís Filipe Menezes, quer em março de 2008, com essas gigantes manifestações, e com Manuela Ferreira Leite em 2010, nunca pediu a demissão do ministro da Educação. Não estou com isto a dizer que o PSD é melhor do que o PS, estou a dizer que é preciso em política, como em tudo na vida, coerência e autoridade moral. Apesar da enorme contestação de que Maria de Lurdes Rodrigues foi alvo e apesar do caos de 2010 com Isabel Alçada, nunca vi o PS vacilar no apoio aos seus ministros. E já agora, o caos na colocação de professores de 2004, como o próprio David Justino, ministro da Educação de Durão Barroso, sempre reconheceu - que honra lhe seja feita -, não foi responsabilidade do meu Governo. O problema do País é exatamente este, está cheio de contradições, de incongruências, de conversa de propagada, de conversa estragada. É fácil dizer que era igual ao Governo de Santana Lopes. Pois! Mas leiam as entrevistas de David Justino de maio a setembro de 2004.

Pode-se gostar ou não de Pedro Passos Coelho, mas uma coisa tem de se reconhecer: o seu discurso e as suas atitudes têm sempre o mesmo fio condutor: É bom? É mau? Essa é outra questão. O que é mesmo mau é não se saber de alguém qual é o fio condutor do que diz e do que faz. Esse foi um consolo cuja importância aprendi muito novo, quando trabalhei com Francisco Sá Carneiro. Podíamos estar dois meses fora, porque ao voltar sabíamos sempre que ele não tinha mudado de posição, de princípios, de valores e de regras nas atitudes. Por isso mesmo, independentemente do que penso sobre a frescura ou de algum estado de cansaço de alguns membros do Governo, tenho de reconhecer mérito ao primeiro-ministro e aos ministros mais contestados nas últimas semanas: a da Justiça e o da Educação, independentemente da diferente simpatia pessoal que cada um de nós sinta por cada um dos referidos membros do Governo.

Advogado

Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico

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