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José Crespo de Carvalho - Dean do Iscte Executive Education
07 de Outubro de 2025 às 11:15

IA e o futuro das escolas de gestão: alinhar regras de jogo?

O futuro da educação em gestão passará, inevitavelmente, por um equilíbrio entre pensamento crítico e aplicação tecnológica. O desafio não é escolher entre humanismo e algoritmos — é integrá-los. Ensinar gestão com IA significa ensinar a decidir melhor, com mais dados, mais cenários e mais consciência ética.

De tendência, ou até moda inicial, passou a estruturante, pelo que a IA está a redefinir a forma como ensinamos, aprendemos e trabalhamos. As escolas de gestão não podem continuar a olhar para a IA da mesma forma que até aqui. Ela é, hoje, o centro da transformação da educação e da gestão. Ignorá-la, ou adotá-la sem critérios comuns, é um risco que o ensino superior português não pode correr.

O recente artigo de Filipe Santos, dean da Católica Lisbon, é certeiro ao alertar para a urgência de internacionalizar e integrar a IA nos modelos de ensino. O passo seguinte é inevitável: precisamos de um acordo nacional entre escolas de gestão para definir princípios e práticas na utilização da IA — na docência, na investigação e na avaliação. Sem esse alinhamento, corremos o risco de caminhar em direções opostas, com incoerências éticas e académicas que podem minar a credibilidade de todo o sistema.

A demografia joga contra nós. Portugal envelhece e perde jovens candidatos ao ensino superior. Internacionalizar já não é estratégia — é sobrevivência. Contudo, para atrair talento global, as nossas instituições precisam de demonstrar modernidade e consistência no uso da tecnologia. Nenhum estudante estrangeiro se deixará seduzir por uma escola que encara a IA com desconfiança ou ausência de regras.

Ao mesmo tempo, o ensino enfrenta concorrência de novas formas de aprendizagem: plataformas digitais, programas empresariais internos, microcertificações e percursos de curta duração que respondem rapidamente ao mercado. Estas alternativas, muitas delas assentes em IA, desafiam diretamente o modelo universitário — mais concetual, mais lento e menos conectado à prática. A pergunta impõe-se: como podem as universidades competir se não forem as primeiras a dominar e a regular o uso inteligente da IA?

Estamos no tempo em que é preciso passar do diagnóstico à ação. As escolas de gestão portuguesas deviam, em conjunto, criar um código comum de adoção responsável da IA, que estabeleça orientações claras sobre:

— o que é admissível em avaliações e trabalhos académicos;

— o uso ético de IA generativa na investigação;

— a proteção de dados e da propriedade intelectual;

— e, sobretudo, a formação de docentes e estudantes para compreenderem o potencial e os limites desta tecnologia.

Este alinhamento não é burocracia: é visão. Tal como há anos definimos critérios de qualidade e acreditação (EQUIS, AMBA, AACSB), agora é hora de definir critérios de integridade e inovação digital. Um pacto nacional permitir-nos-ia reforçar a competitividade internacional e a confiança das empresas que nos procuram para formar as suas lideranças.

O futuro da educação em gestão passará, inevitavelmente, por um equilíbrio entre pensamento crítico e aplicação tecnológica. O desafio não é escolher entre humanismo e algoritmos — é integrá-los. Ensinar gestão com IA significa ensinar a decidir melhor, com mais dados, mais cenários e mais consciência ética.

O desafio fica lançado: que as escolas de gestão portuguesas — públicas e privadas, universitárias e politécnicas — se sentem à mesa, discutam e construam um referencial comum. A fragmentação só nos enfraquece. O futuro exige alinhamento, colaboração e coragem. Temos mesmo de colaborar. Até porque a IA não vai esperar por nós.

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