Cultura e produtividade
A actual crise afectou fortemente as actividades culturais e criativas. É importante apoiar estas actividades, reforçando o seu contributo para melhorar o ensino, a inovação empresarial, ou o turismo. Existem oportunidades interessantes de reforço das pontes...
A actual crise afectou fortemente as actividades culturais e criativas. É importante apoiar estas actividades, reforçando o seu contributo para melhorar o ensino, a inovação empresarial, ou o turismo. Existem oportunidades interessantes de reforço das pontes entre a cultura e as escolas, as universidades e as empresas. Estas ligações podem melhorar a eficiência das actividades culturais.
Colocar cultura e produtividade na mesma frase pode parecer a alguns uma blasfémia.
Será que aprender a tocar violino pode ajudar alguém a ter melhores notas a matemática e a ser um engenheiro mais produtivo? Esta pergunta parece estranha para quem está habituado a separar as cigarras das formigas. No entanto, no ano passado, a melhor escola secundária pública de Portugal foi uma escola em que todos os alunos a aprendem a tocar um instrumento.
Coincidência? Talvez não. Muitos acreditam que a disciplina exigida pela aprendizagem da música cria método de trabalho, ou que aprender teatro pode desinibir, ajudando a falar em público, ou que ler livros contribui para escrever melhor, mesmo que seja um memorando, um relatório ou um email para um cliente.
O governo, na anterior legislatura, lançou várias pontes no ensino básico e secundário, nomeadamente no ensino da música, no estímulo à leitura ou no reforço das actividades culturais nas escolas.
Este seria um bom momento para reforçar as iniciativas culturais com as universidades. Há muito por onde melhorar a vida cultural nos campi universitários. O governo deve empenhar-se nisso. Mas os reitores e as associações de estudantes devem também colocar a agenda cultural no topo das prioridades académicas - muitos não o têm feito. Uma experiência académica marcada por uma vida cultural interessante cria novos públicos e forma melhores universitários.
Na ligação das actividades criativas ao mundo empresarial também há pontes a ser melhoradas. O design, a arquitectura ou a publicidade criam cada vez uma maior proporção do valor. Muitas empresas sabem disso. E, no entanto, há demasiados designers e arquitectos sub empregados e demasiadas empresas com produtos pouco apelativos, ou espaços mal desenhados. É importante estimular as escolas de criatividade a serem também escolas de empreendorismo, que formem pessoas capazes de responder a estas oportunidades.
A cultura deve ser também um elemento essencial da diferenciação do produto turístico português. As actividades culturais devem fazer parte do menu de quem nos visita. A iniciativa que animou o Algarve com concertos, exposições e outros eventos teve uma forte adesão do público - deveríamos pensar em estende-la a outras áreas. Ainda nesta área devemos valorizar mais a gastronomia, assim como o património histórico valorizado.
Um exemplo interessante está a surgir na cidadela de Cascais, onde vai aparecer um hotel que, em vez de descaracterizar, recuperou e vai abrir ao público um monumento quer estava ao abandono. O património vai ser recuperado, gerando receitas em vez de custos. Por que é que se tarda tanto em dar uma utilização mais nobre a tantos outros monumentos, como o convento da Graça ou o do Chiado?
Em muitos destes casos é possível uma solução, que mantendo o património em posse do estado, permita uma utilização que financie a sua recuperação. Trata-se de dar mais eficiência à utilização do património histórico que herdámos e de o abrir ao público em vez de o deixar degradar.
Falar de trazer mais eficiência às actividades culturais é para alguns também uma blasfémia - pecado chamado de economicismo.
No entanto, as actividades culturais e criativas movimentam 3,6 mil milhões de euros são responsáveis por 127 mil empregos (*), sendo um sector onde há muitas falhas entre os agentes culturais e o público, o Estado e as empresas.
Este é também um sector em que, sendo difícil definir o valor, se torna ainda mais importante avaliar os contributos de projectos alternativos com custos bem definidos, principalmente porque o Estado é muitas vezes chamado a dar um contributo importante do financiamento.
A nova ministra da Cultura, a pianista Gabriela Canavilhas, foi bem acolhida pelo sector. A sua experiência pode ajudar a fazer muitas das pontes e melhorias necessárias.
No entanto, as escolas, universidades, empresas e agentes culturais tem de também de construir as suas próprias pontes, e atravessar as que se abrem. A crise, que também afectou fortemente este sector, pode abrir oportunidades de uma melhor cooperação.
(*) De acordo com um estudo de Augusto Mateus e Associados. Departamento de Economia da Universidade do Minho Assina esta coluna quinzenalmente à quinta-feira
Departamento de Economia da Universidade do Minho
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