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Um modelo económico ideal?

A crise económica e financeira prolongada desacreditou, em primeiro lugar, o modelo norte-americano de capitalismo e, posteriormente, a versão europeia. Nos dias de hoje, parece que a abordagem asiática sofreu também um abanão. Tendo chegado depois do falhanço do capitalismo de Estado, quererá isto significar que não há uma forma correcta de organizar a economia?

A crise económica e financeira prolongada desacreditou, em primeiro lugar, o modelo norte-americano de capitalismo e, posteriormente, a versão europeia. Nos dias de hoje, parece que a abordagem asiática sofreu também um abanão. Tendo chegado depois do falhanço do capitalismo de Estado, quererá isto significar que não há uma forma correcta de organizar a economia?

No rescaldo da crise do "subprime" e do colapso do Lehman Brothers, os dedos eram apontados aos Estados Unidos como um exemplo de o quanto as coisas podiam correr mal. O modelo norte-americano supostamente falhou e a sua reputação enfraqueceu, em primeiro lugar, devido à invasão do Iraque, e depois devido à crise financeira. Qualquer pessoa que tenha sonhado com o estilo de vida norte-americano (American way of life) parece agora estúpida.

Imediatamente a seguir ao colapso do Lehman Brothers, o então ministro das Finanças da Alemanha, Peer Steinbrück, diagnosticou que os desafios que se seguiam não iam ser enfrentados apenas pelos Estados Unidos, mas também por outros países – em particular o Reino Unido – que tinha o seu sistema financeiro "americanizado". O problema, na opinião de Steinbrück, residia na confiança excessiva depositada em instrumentos financeiros muito complexos, difundidos pelas instituições americanas a nível global: "a crise financeira é acima de tudo um problema norte-americano. Os outros ministros das Finanças do G-7 partilham desta opinião".

Mas as críticas aos Estados Unidos não se ficaram por aqui. O sucessor de Steinbrück, Wolfgang Schäuble, manteve o mesmo discurso, atacando a "desfasada" política monetária norte-americana que foi, aparentemente, delineada apenas para alimentar o monstro financeiro americano.

Contudo, estas críticas ignoram os problemas que os bancos que não utilizaram ou negociaram com produtos financeiros complexos enfrentam. Os reguladores há muito que insistiam que os instrumentos financeiros mais seguros eram as emissões de obrigações por parte dos países industrializados mais ricos. E, posteriormente veio a crise da dívida soberana, com as raízes nas descuidadas finanças de alguns países (maioritariamente do sul da Europa).

As críticas têm, assim, um novo foco. Naturalmente, muitos conservadores norte-americanos ficaram encantados com o iminente falhanço do modelo europeu baseado em impostos e gastos ao qual se soma um Estado Social, dispendioso e ineficiente.

Mas eles não são os únicos críticos. O "chairman" da "China Investment Corporation", Jin Liquin, falou com cepticismo sobre a proposta que previa que a China participasse no resgate à Europa, que ele apelidou de uma sociedade que tem por base um Estado-Providência que "está desgastado" e cujas leis estão "desactualizadas" o que acaba por conduzir à dependência e à preguiça.

As críticas às amplas transferências que têm lugar na Europa podem ter alguma justificação na medida em que os contribuintes da França, da Grécia e da Itália podiam, de facto, reformar-se cedo. E leis laborais restritivas desencorajaram, de facto, empresas a contrataram novos funcionários. Mas estas críticas vão de encontro apenas a uma pequena parte dos problemas da Europa.

Os problemas orçamentais da Grécia e da Espanha são também o resultado de elevados gastos com alta tecnologia e com projectos de elevado prestígio como os Jogos Olímpicos, novos aeroportos e linhas ferroviárias de alta-velocidade. E quer a Espanha quer a Irlanda, antes da crise, não tinham qualquer problema orçamental, devido ao rápido crescimento económico proporcionado pelo “boom” imobiliário que criou a ilusão de uma nova era de milagres económicos.

Um dos termos mais utilizados pelos chineses, nos últimos anos é ???? (xìng zai lè huò), sendo que a melhor tradução é "schadenfreude": alguém – ou uma sociedade – que tropeçou numa grande casca de banana política. Os críticos provenientes da Ásia ao observarem os Estados Unidos e a Europa poderiam facilmente convencer-se que o modelo de capitalismo democrático do Ocidente está a entrar em colapso.

Todavia, não fez também a China investimentos financeiros semelhantes e proporcionou elevados preços às propriedades, o que acabou por representar um papel importante na transformação do país desde a década de 1990, do século XX? Os cidadãos chineses não são os únicos, que neste momento, estão frustrados com as cada vez mais óbvias imperfeições e com a falta de adequação dos comboios de alta velocidade. Os cidadãos chineses estão também a questionar-se se os seus governantes estabeleceram as prioridades de forma correcta.

Assim, o termo "schadenfreude" chega com vários sabores. O primeiro-ministro da Rússia, Vladimir Putin e a presidente da Argentina Christina Kirchner gostam de pensar que as suas versões de economia controlada e construção da sociedade, depois de um incumprimento da dívida externa, oferecem uma alternativa viável ao capitalismo cosmopolita internacional. Por esta altura, ambos enfrentam graves problemas dado que a sua população está desiludida.

Em suma, as grandes economias mundiais partilham mais vulnerabilidades do que habitualmente se imagina. Uma resposta aos desafios mundiais baseada simplesmente em "schadenfreude" pode - no curto prazo - dar uma sensação de bem-estar, com as pessoas a pensarem na sorte que têm ao terem escapado à confusão originária de outra geografia. Mas rapidamente se deparam com a sua própria casca de banana; de facto, a economia mundial está em guerra com os modelos económicos. E amanhã a cacofonia vai ouvir-se ainda mais alto.

Portanto, não há qualquer certeza quanto ao caminho para organizar a vida económica? Se a questão se coloca no sentido de um caminho que assegure de forma perpétua a segurança e o domínio, aí a resposta é "não".

O apoio a comparações entre modelos diferentes surge devido à vontade de encontrar um caminho verdadeiramente seguro para a criação de riqueza e prosperidade. Contudo, numa economia de mercado, a competição rápida leva a que os benefícios associados à inovação acabem por ser transitórios. Olhando para uma perspectiva de longo prazo, há apenas momentos de relativa riqueza, assim como apenas há momentos de sucesso aparente na forma particular de fazer negócios.

Durante a Revolução Industrial na Europa Ocidental, no final do século XVIII e no início do seculo XIX, os pioneiros e os inovadores nos ramos do têxtil, do aço e das ferrovias não tiveram, no geral, como recompensa uma grande fortuna: os seus lucros diminuíram fruto da concorrência. O final do século XIX e no século XX criaram um novo estilo de crescimento uma vez que as políticas públicas e os recursos podiam ser utilizados para proteger a riqueza acumulada que, caso contrário, iria acabar por ir desaparecendo em resultado da pressão da concorrência.

Por trás da ideia de um determinado modelo de crescimento está a crença de que um Estado sensatamente ordenado poderia, de alguma forma, capturar e eternizar os frutos do sucesso económico. Goste-se ou não, os Estados não podem organizar-se a si próprios e ter um desempenho melhor do que o dos indivíduos.

Harold James é professor de História e de Relações Internacionais na Universidade de Princeton e é professor de História no Instituto Universitário Europeu de Florença. É autor do livro intitulado "The Creation and Destruction of Value: The Globalization Cycle".

© Project Syndicate, 2012.

www.project-syndicate.org

Tradução: Ana Laranjeiro

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Tradução: Ana Laranjeiro

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