Bruxelas prepara reforço das competências do regulador europeu nas cripto e ações
A presidente do regulador europeu acredita que a mudança é essencial para alcançar mercado de capitais mais competitivo. No entanto, a medida deve conhecer resistência de vários países.
A porta já tinha sido aberta por Bruxelas em março deste ano, mas agora a ideia parece que vai mesmo materializar-se. Segundo a presidente da Autoridade Europeia de Mercados de Valores Mobiliários (ESMA, na sigla anglo-saxónica), a Comissão Europeia já está a preparar legislação para transferir as competências de regulação das bolsas de valores, empresas de criptoativos e de serviços de "clearing" das autoridades nacionais para a ESMA.
Em entrevista ao Financial Times, Verena Ross defende que a mudança é essencial para assegurar que a "Europa tem um mercado de capitais mais integrado e competitivo a nível global" e que consegue "responder à contínua fragmentação dos mercados" dos 27 países que compõem a União Europeia (UE). A presidente do organismo, criado em 2011 para alcançar uma maior harmonia entre os Estados-membros, dá o exemplo do setor dos criptoativos para demonstrar como a regulação a nível da UE poderia ser mais eficiente.
"Embora estejamos a trabalhar arduamente para garantir que a implementação do Regulamento Europeu sobre o Mercado de Criptoativos (MiCA) esteja alinhada, é evidente que isso exige um grande esforço da nossa parte e das autoridades nacionais de supervisão", afirmou Ross ao jornal britânico. "Isso também significa que foi necessário criar novos recursos e conhecimentos específicos 27 vezes em diferentes autoridades nacionais de supervisão, o que poderia ter sido feito de forma mais eficiente uma única vez a nível europeu", adicionou ainda.
No entanto, estes planos não colhem consenso entre os países da UE. Enquanto países como França, Itália e Áustria estão a favor de uma transferência das competências para a ESMA, outros Estados-membros como é o caso do Luxemburgo, Malta e até mesmo a Irlanda são contra a centralização da regulação. Recentemente, Claude Marx, presidente do regulador irlandês, referiu mesmo que esta mudança poderia criar um "monstro" no seio do território europeu.
Em março deste ano, Bruxelas já tinha aberto a porta a esta hipótese. Na estratégia para a União da Poupança e Investimento, a Comissão Europeia já admitia a transferência de certas tarefas de supervisão das autoridades nacionais para as da UE, citando a necessidade de alcançar uma supervisão forte e harmonizada para assegurar a estabilidade e integridade dos mercados financeiros da região.
Ainda no mês passado, Maria Luís Albuquerque, comissária portuguesa responsável pelos Serviços Financeiros e União da Poupança e dos Investimentos, referiu que estava em cima da mesa "uma proposta para transferir os poderes de supervisão para a ESMA no que diz respeito às entidades transfronteiriças mais significativas". "Tudo isto implicaria mudanças nos processos de governança e tomada de decisão da ESMA", referiu Albuquerque na edição deste ano do Eurofi Fórum, em Copenhaga.
Questionada pelo Negócios sobre esta possível transferência de competências a nível dos criptoativos, em abril, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) explicou que existe "uma margem relevante de progressão da atividade da ESMA" e que uma maior convergência nas tarefas de supervisão pode vir a ser benéfica em "situações em que o risco sistémico ou a existência de uma atuação transfronteiriça apresente relevância para o mercado comum".
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