O fim da realidade
Os factos deixaram de importar, porque já ninguém se importa em saber se eles são verdadeiros ou não. As redes sociais tornaram-se o laboratório destes dias.
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Não é "1984" de George Orwell que define estes dias. Nem, talvez, o injustamente esquecido "Admirável Mundo Novo" de Aldous Huxley. Embora uma frase deste anda ecoe: "A ditadura perfeita terá a aparência da democracia, uma prisão sem muros na qual os prisioneiros não sonharão sequer com a fuga. Um sistema de escravatura onde, graças ao consumo e ao divertimento, os escravos terão amor à sua escravidão." Talvez o mais visionário de todos, sobre este novo tempo, tivesse sido Philip K. Dick. Foi o desaparecimento da realidade que ele antecipou nestes tempos de Donald Trump, de Jair Bolsonaro, de Salvini, Órban ou Steve Bannon. Ou dessas figuras menores e vazias como André Ventura. Em que o caos destrói, sem remorsos, a pretensa ordem e o desarticulado contrato social no qual julgávamos viver. Muitos, nesta era de globalização económica e financeira, se espantam com o regresso das fronteiras estanques. Com os votos em Bolsonaro, arauto de um Brasil que quer ordem, porque todos necessitam de acreditar em algo. Não se percebe a admiração: se escutarmos música este é o tempo definido por George Clinton e os Parliament, com o seu álbum novo, "Medicaid Fraud Dogg" ou, se atentarmos à cultura, pelo significado do quadro de Bansky adquirido por 1.185.000 euros e que se autodestruiu segundos depois. Porquê a admiração? Alguém comprava um nome e não uma obra. De que serve a realidade nestes dias?
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