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Armindo Monteiro amonteiro@anje.pt
21 de Agosto de 2006 às 13:59

Forte com os fracos ou fraco com os fortes?

Ao cruzar variáveis como o volume de negócios e os impostos arrecadados nos cofres do Estado, a Direcção-geral dos Impostos (DGCI) constatou que, quanto maior é uma empresa, menor é a taxa efectiva de IRC que paga.

Em 2004, as empresas com proveitos entre 150 e 500 mil euros pagaram 20% de IRC sobre os lucros, enquanto as empresas que facturaram entre 75 e 250 milhões de euros desembolsaram apenas 16% de IRC. Esta incongruência é justificada pela capacidade que as grandes empresas têm de desenvolver estratégias eficazes de planeamento fiscal e de maximizar as deduções e benefícios fiscais.

Em Portugal, é usual as grandes empresas negociarem directamente com o Estado benefícios fiscais para determinados projectos de investimento, algo que, devido à sua escala diminuta e reduzido poder negocial, não está ao alcance das PME. Acresce que os grupos económicos têm a capacidade de mitigar a tributação de lucros distribuídos pelas entidades que controlam ou de absorver o prejuízo fiscal das empresas que adquirem, por exemplo. Estes e outros expedientes tornam legítima a conclusão de que o nosso sistema fiscal está formatado à medida dos interesses das empresas com maior volume de negócios, as quais se concentram, sobretudo, nos sectores da banca, construção e imobiliário.

Para lá da subversão do princípio de equidade fiscal, que em abstracto determina que quem mais lucra pague mais impostos, a realidade denunciada pela DGCI vem dar razão aos que, como eu, pensam que o actual ambiente fiscal penaliza seriamente a competitividade das micro, pequenas e médias empresas. Esta situação é tanto mais preocupante quanto tivermos em conta que o nosso tecido empresarial é constituído esmagadoramente por PME. Em Portugal existem entre 350 e 400 mil sociedades, mas apenas cerca de 1000 são consideradas grandes empresas? As outras são micro (80%), pequenas (15%) e médias (3%) empresas, as quais são responsáveis por 75% do emprego e mais de 60% do volume de negócios.

Não faz, pois, muito sentido que no capítulo fiscal se privilegie uma minoria de empresas, em prejuízo claro da restante maioria delas. Trata-se de uma má opção estratégica para o país, para além revelar a persistência, entre o poder político, de uma atitude de reverência e até deslumbramento perante o grande capital.

Obviamente que defendo a criação de grupos com dimensão à escala global e considero importante atrair investimento estrangeiro estruturante, designadamente de multinacionais tipo Autoeuropa. Também não nego a pertinência dos chamados projectos PIN, uma fórmula encontrada pelo Governo de José Sócrates para acelerar a concretização de investimentos considerados prioritários. Mas tal não impede que, paralelamente, os decisores políticos tracem uma verdadeira estratégia de apoio às PME, para lá do esforço, bastante meritório, sublinhe-se, que o IAPMEI tem desenvolvido neste âmbito.

Importa salientar que é entre as PME que se encontram os melhores exemplos de inovação e avanço tecnológico. Nesta medida, as empresas de pequena e média dimensão têm contribuído sobremaneira para a mudança de paradigma do aparelho produtivo português. Graças a uma nova geração de PME, Portugal começa já a vislumbrar a ansiada Economia do Conhecimento, ao mesmo tempo que abandona modelos de produção onde existe uma utilização extensiva de mão-de-obra.

Bem sei que o actual Governo parece genuinamente sensibilizado para a importância do empreendedorismo (sobretudo o empreendedorismo com uma base de conhecimento), cuja actividade se desenvolve, precisamente, nas PME. Mas no capítulo fiscal essa aparente sensibilidade não se traduz em benefícios concretos ou, se quisermos, numa discriminação positiva das PME comprovadamente competitivas e capazes de produzir valor acrescentado.

A persistir, a discrepância revelada pela DGCI poderá, a médio ou mesmo curto prazo, gerar desequilíbrios profundos no tecido empresarial português, com consequências ao nível do emprego e da criação e distribuição de riqueza. Isto para não falar dos efeitos restritivos na taxa de actividade empreendedora (entendida como negócios nascentes ou novos negócios com menos de 3 anos e meio), que, aliás, tem vindo a decrescer em Portugal.

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