E que tal multar os municípios?
Regras sem sanções para os incumpridores costumam ter poucos resultados e não há nenhuma razão para achar que será diferente com os municípios. Perante o incumprimento, em alguns casos reiterado, do que está previsto na lei do Orçamento do Estado, o Governo devia aplicar a penalização devida.
Na sequência da dupla tragédia dos incêndios do Verão passado, o Governo incluiu uma norma no Orçamento do Estado para 2018 que obriga todos os municípios a elaborar ou actualizar o plano municipal de defesa das florestas contra incêndios até 31 de Março. E mais, foram fixadas sanções pesadas e imediatas para as autarquias que não cumprissem a regra, com a retenção, logo no mês seguinte, de 20% do duodécimo das transferências correntes do Fundo de Equilíbrio Financeiro.
Chegados a 31 de Março, qual era o balanço? Segundo um levantamento feito pelo Negócios na altura revelava que meia centena de municípios não possuía ainda um plano de combate aos fogos. E, tal como o Negócios escreve hoje, um mês depois da data-limite: são agora 40 as câmaras sem plano, uma parte aguarda ainda parecer positivo do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, enquanto outros tiveram mesmo parecer negativo.
Se é obrigatório apresentar um plano, se há uma data-limite para o fazer e se estão previstas penalizações para quem não o cumprir, o que se esperaria? Que os infractores fossem penalizados. Mas não, nada disso está a acontecer. Quem o admite é o próprio presidente da Associação Nacional dos Municípios Portugueses, Manuel Machado, presidente da Câmara de Coimbra, capital de um dos distrito que mais ardeu no ano passado e que não actualizou o seu plano de combate aos incêndios, que data de 2009.
E o Governo, o que diz? Nada. Apesar das sucessivas questões colocadas pelo Negócios, o gabinete do ministro da Administração Interna entendeu ser desnecessário prestar qualquer esclarecimento.
Este plano municipal, que integra as intervenções das diferentes entidades ao nível da prevenção, sensibilização, vigilância, detecção de incêndios florestais, já era obrigatório antes. Tal como o Negócios noticiou no final de Outubro, dos 57 municípios mais afectados, 35% não tinha um plano municipal de defesa da floresta contra incêndios. Entre as câmaras que não possuíam este documento estavam Pedrógão Grande, Castanheira de Pêra, Alijó, Melgaço, Monção, Pombal e Condeixa-a-Nova, algumas das mais fustigadas pelos incêndios do verão passado. Sete meses depois, continuam sem plano, confirmou o ICNF ao Negócios.
Não se pretende argumentar aqui que com este plano se teria evitado a tragédia, mas sim sublinhar a responsabilidade que os municípios têm em matéria de prevenção de fogos e a forma desleixada como a maioria tem actuado ao longo de décadas - atitude que parece tardar em mudar.
Uma das responsabilidades que foi ignorada, ano após ano, pela grande maioria das câmaras é a de limpar os terrenos e multar os proprietários que tratem dos seus terrenos. Este ano, o Governo fez, e bem, da limpeza dos terrenos um desígnio nacional, criando legislação nova e penalizações pesadas. Porém, pressionado pelas câmaras e pela oposição, o Governo não se cansa - e repetiu-o ontem pela voz de Eduardo Cabrita - de dizer que o objectivo não é aplicar multas. É fácil de antever que, no final do Verrão, não haverá uma única câmara negligente penalizada.
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