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Fernando Ilharco
14 de Julho de 2016 às 20:35

"Je suis portugais"

O futebol global é hoje a grande metáfora da vida colectiva. É uma representação do ser social que somos na luta pela afirmação.

"Nos festejos do golo, naquele abraço de grupo, deixei de sentir o meu corpo."

 

Éder, Telejornal, RTP, 13/07/2016

Evidentemente não se tratou de futebol. Foi um drama global, de uma comunidade de Portugal a França, de Timor à África do Sul, que festejaram o golo de Éder como se não houvesse amanhã. Foi um sonho desfeito com a lesão de Ronaldo, a esperança que não se apagava e o golpe final, o golo de Éder que iluminou a noite e cortou o tempo.

O futebol global é hoje a grande metáfora da vida coletiva. É uma representação do ser social, dos grupos na luta pela afirmação. Na final do Europeu, em si mesmo uma ilustração longínqua do duelo final, como em tantas finais que não do futebol, a experiência humana confirmou um dos seus hinos: ganha quem mais quer, quem melhor se adapta, quem não desiste de ganhar - "simples como as pombas, prudentes como as serpentes", nos ecos bíblicos das palavras de Fernando Santos.

Talvez estejamos demasiado perto para compreender o que os coletivos são ao longo de séculos e milénios. No abraço do golo dos jogadores, nas ruas de todo o país e por todo o mundo, não foi apenas Éder que deixou de sentir o corpo. Nem o corpo, nem a mente. A multidão é outra coisa, viva, com uma mente própria, emergindo imparável de tempos a tempos. No domingo à noite no centro do mundo, o Marquês de Pombal, cantou-se o hino nacional, deram-se vivas aos jogadores e ao país e o passado, as contrariedades e as injustiças, foram chamadas à colação quando se cantou "Ó Platini vai…", "Ó Napoleão vai…".

Os milhões que iluminaram o mundo com o vermelho e verde são um só. Cercando o autocarro dos jogadores, correndo junto dele, mantendo-o envolvido, fundiram-se com a seleção de Portugal, com os 23 jogadores e o seu treinador, foram o mesmo, sem diferença. E isso é o que é verdadeiramente final.

Somos os mesmos há quinhentos anos. A nova lenda portuguesa, Ronaldo, saiu de cena, destroçado; mas regressou. Não voltou Dom Sebastião mas, como no mito do herói, voltou Ronaldo; mais forte, renovado e para fazer a diferença. Mas não se tratou apenas de nós, portugueses. Tratou-se também do poder da vontade e do que se pode conseguir com inteligência, esforço, determinação e mérito. É um tempo português global, um tempo de uma certa hospitalidade ontológica que tantos povos conhecem, bem visível no abraço que o jovem Mathis, português de nome estrangeiro e que fala francês, deu ao desolado adepto de França no domingo à noite.

Professor na Universidade Católica Portuguesa

Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico

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