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António Gomes Mota
06 de Junho de 2006 às 13:59

Centralizar

A implementação dos acordos de Bolonha na minha Escola, a IBS – ISCTE Business School, deu-me uma oportunidade única de entender, na prática, o valor do centralismo em circunstâncias excepcionais.

Em poucas palavras, a forma como Bolonha foi implementado, significou alterar repentinamente o percurso de todos os alunos já estudar nas licenciaturas (com excepção dos que transitam para o último ano), criando-se planos de transição, para os diferentes anos, visando a convergência com os novos planos de estudos, com novas disciplinas, criando-se uma complexa rede de equivalências e um extenso conjunto de regras de transição. E como acontece nestes casos, duas situações verificam-se sempre: por mais explícitos que sejam os documentos, há inevitavelmente dúvidas de interpretação; por mais que se antecipem cenários, há invariavelmente casos concretos que não foram previstos.

Acresce uma envolvente de alguma insegurança e ansiedade com alterações tão significativas. E acresce ainda, algum oportunismo, geralmente dos mais medíocres, procurando atalhar caminho aproveitando algum aspecto ou regra menos clara.

Nesta ocasião e durante duas semanas transformei-me no interlocutor oficial dos alunos e docentes. Respondi a centenas de e-mails e tive dezenas de reuniões esclarecendo dúvidas, prestando informações adicionais, recolhendo críticas e sugestões. Transformei-me num verdadeiro centralizador de todo o fluxo informativo do processo de Bolonha.

As vantagens pareceram-me claras. Em primeiro lugar, uniformizar e homogeneizar a informação prestada, reduzindo ruído e contra informação. Em segundo, gerar credibilidade na informação prestada, evitando sucessivos pedidos de informação em vários meios e estruturas.

Em terceiro, ter acesso directo a dúvidas pertinentes, a críticas com sentido, a sugestões interessantes, sem distorção ou retenção nos canais de transmissão habituais. Finalmente, capacidade de correcção rápida, top – down, sem grande necessidade de discussões e consensos.

Este procedimento possibilitou emprestar velocidade no processo de discussão e decisão, uma clara acalmia após o choque inicial do anúncio das significativas mudanças, uma eficiente incorporação no processo de todos os contributos válidos.

Trouxe-me ainda outro ensinamento, que apenas intuía e provavelmente pouco popular e politicamente correcto, numa instituição universitária.

O esclarecimento é totalmente contraproducente quando feito a um número significativo de estudantes, parecendo que é amputação da dimensão de participação, mas na verdade é justamente o contrário. Desde logo, porque a maioria dos presentes pretende analisar o seu caso concreto, gerando informação específica, que muita vez confunde e baralha; depois, porque o grau de atenção não é uniforme, percebendo – se o que se não disse, e não se percebendo o que se esclareceu. Depois, porque os factores de inibição/desinibição alteram prioridades nas questões e na relevância dos temas. Finalmente, porque raramente há a serenidade para equacionar no momento aspectos não antecipados podendo haver respostas precipitadas e menos reflectidas. Trabalhando-se de forma individual ou com pequenos grupos, despende-se, é bom sublinhá-lo, muito mais tempo, mas os resultados são infinitamente superiores.

Em período de crise a centralização revelou-se eficaz e trouxe benefícios a todos os envolvidos.

O desafio que se enfrenta agora é o oposto. Descentralizar, retomando a normalidade. E enfrentam-se dois riscos. Da parte dos utilizadores (alunos), há naturalmente a tentação de continuar a usar um canal que se revelou eficiente, rápido, credível. Da minha parte a tentação de agilizar a resolução de problemas, dificuldades, perturbando definitivamente os normais canais de decisão.

A centralização benigna é um exercício de equilíbrio difícil no tempo. Se de menos, não chega a ser sequer eficaz. Se demais, perverte e desregula canais e processos de decisão descentralizados, mesmo que há muito implantados.

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