pixel

Negócios: Cotações, Mercados, Economia, Empresas

Notícias em Destaque
Jeffrey D. Sachs - Professor de economia reconhecido mundialmente, autor de "best-sellers", inovador educador e líder global em desenvolvimento sustentável.
11 de Abril de 2012 às 23:30

Liderança decisiva para o Banco Mundial

Uma avaliação feita pelas agências secretas dos EUA, divulgada em Fevereiro, refere que "nos próximos 10 anos, os problemas de falta de água contribuirão para a instabilidade em Estados importantes para os interesses de segurança nacional dos Estados Unidos".

No mês passado, apelei para que o Banco Mundial fosse liderado por um líder da área do desenvolvimento global, em vez de um banqueiro ou alguém dos meandros da política. "O Banco Mundial precisa de um consumado profissional que esteja pronto, logo à partida, para se ocupar dos grandes desafios do desenvolvimento sustentável", escrevi. Agora que o presidente norte-americano, Barack Obama, nomeou Jim Kim para o cargo, o mundo terá precisamente isso: um soberbo líder do desenvolvimento.

Obama demonstrou verdadeira liderança com esta nomeação. Ele colocou o desenvolvimento na linha da frente, dizendo explicitamente: "é altura de um profissional do desenvolvimento liderar a maior agência mundial do desenvolvimento".

A nomeação de Kim é um importante avanço para o Banco Mundial, que espero que se estenda também a outras instituições mundiais. Até agora, os Estados Unidos têm tido uma espécie de "carta branca" para nomearem quem quer que desejem para a presidência do Banco Mundial. Foi assim que o Banco acabou por ter vários líderes inadequados, incluindo vários banqueiros e políticos que não tinham os conhecimentos e interesse necessários para liderarem o combate à probreza.

Para acabar com esta tradição, e de modo a destacar a grande importância de colocar um líder do desenvolvimento à frente do Banco Mundial, encetei eu mesmo uma campanha e fiquei profundamente honrado com o apoio da opinião pública que recebi por parte de uma dúzia de países, bem como pelo apoio a título privado de muitas outras pessoas. A nomeação de Kim foi uma conquista para todos e foi com muito gosto que retirei a minha candidatura para o apoiar.

Kim é um dos grandes líderes mundiais na área da saúde pública. Trabalhou com outro grande nome desta área, Paul Farmer, sendo pioneiros no alargamento do tratamento da sida, tuberculose e outras doenças junto dos mais pobres do mundo. Mais recentemente, foi presidente do Dartmouth College, uma universidade norte-americana de renome. Assim, conjuga capacidades profissionais, experiência global e um conhecimento considerável de gestão – um conjunto de credenciais perfeitas para a presidência do Banco Mundial.

Trabalhei estreitamente com Kim ao longo dos anos. Ele é um visionário, vendo a possibilidade de levar cuidados de saúde onde estes ainda não estão disponíveis. É corajoso e está sempre pronto a assumir grandes desafios. E tem um raciocínio bastante sistemático, concebendo novos protocolos e sistemas para as comunidades com menores rendimentos. Liderou a iniciativa da Organização Mundial de Saúde para incrementar o tratamento da SIDA junto dos cidadãos dos países mais pobres, e fez um trabalho exemplar.

A nomeação dos EUA não é o final da história. Os 25 directores executivos do Banco Mundial, que representam 187 países membros, devem agora confirmar a escolha de entre três nomeados. Kim enfrenta um desafio por parte do estimado ministro nigeriano das Finanças, Ngozu Okonjo-Iweala, e por parte de José Antonio Ocampo, ex-ministro colombiano das Finanças. Ainda assim, Kim é o grande favorito para ocupar o cargo, especialmente devido ao seu excelente historial de feitos a nível mundial.

O mês passado trouxe outras lembranças sobre o porquê de o Banco Mundial ser tão importante e sobre o porquê de eu ter enfatizado a necessidade urgente de profissionalizar a sua liderança. Tragicamente, o governo do Mali foi derrubado num golpe militar. Ironicamente, estavam marcadas eleições para esta Primavera, pelo que o país em breve iria ter um novo governo.

Associo este golpe e o Banco Mundial pela seguinte razão: Mali é mais um exemplo de um país onde a extrema pobreza, fome, doenças e seca provocam instabilidade política e violência.

Conheço bem o país. Com efeito, o Earth Insitute (que eu dirijo) tem uma representação importante no Mali. Há alguns anos, o governo do Mali pediu-me ajuda para combater o agravamento da pobreza no país. Tentei encontrar apoio mundial para o Mali, mas o Banco Mundial e outros organismos poucas respostas deram. Não viram os perigos que eram tão evidentes para todos nós que trabalhávamos em aldeias de todo o país.

É certo que a pobreza não é a única causa da instabilidade no Mali. As divisões étnicas, o vasto mercado de armamento, a repercussão da violência da Líbia e outros factores desempenharam um papel preponderante. No entanto, em todo o mundo, a pobreza é uma condição de base que acelera e intensifica a violência.

A seca registada este ano piorou ainda mais a situação do Mali. Tenho dito e escrito, há anos, que as regiões de terras áridas, do Ocidente ao Oriente – do Senegal ao Mali, passando pelo Níger, Chade, Sudão, Somália, Iémen, Iraque, Irão, Paquistão e Afeganistão – são um barril de pólvora onde as alterações climáticas, a seca, a fome e o crescimento populacional estão a criar uma crescente instabilidade.

Essa instabilidade deriva, com uma terrível frequência, em guerra. Na qualidade de especialista do desenvolvimento a trabalhar no terreno, nestas regiões áridas, sei que nenhuma solução militar pode estabilizar esta vasta região enquanto a população continuar com fome, sem água, sem meios de subsistência e sem esperança. O desenvolvimento sustentável é o único caminho para a paz sustentável.

O governo norte-americano está finalmente a acordar para esta nova realidade assustadora. Uma avaliação feita pelas agências secretas dos EUA, divulgada em Fevereiro, refere que "nos próximos 10 anos, os problemas de falta de água contribuirão para a instabilidade em Estados importantes para os interesses de segurança nacional dos Estados Unidos". É claro que não é só a segurança dos EUA que está em jogo; o mesmo acontece com a segurança global e com a sobrevivência e bem-estar de uma imensidão de pessoas. E não há necessidade de esperar pelos próximos 10 anos: a implacável realidade prevista no relatório está já perante nós.

Tudo isto salienta a importância do Banco Mundial e do papel de Kim na sua liderança. O Banco pode estar onde o mundo disser que é preciso, de modo a lidar com os problemas – alarmantes, mas solucionáveis – em matéria de desenvolvimento sustentável, unindo governos, cientistas, académicos, organizações da sociedade civil e a opinião pública em prol de uma grande causa. Este é um imperativo global e todos nós podemos contribuir para o assegurar, garantindo que o Banco Mundial é uma instituição verdadeiramente destinada ao mundo, liderada com conhecimentos periciais e com integridade. A nomeação de Kim é um tremendo passo em direcção a esse objectivo.

Project Syndicate, 2012.

www.project-syndicate.org

Tradução: Carla Pedro

Ver comentários
Ver mais
Publicidade
C•Studio