Merkel e a difícil decisão
As sondagens para as eleições em Berlim são desanimadoras e, face ao desaire, Merkel terá de preparar o anúncio de recandidatura a um quarto mandato à frente do Executivo alemão.
Mais do que nova vitória social-democrata dia 18, deixando uma vez mais os conservadores em posição subordinada na coligação que desde 2011 governa a capital, será a entrada para o parlamento estadual dos populistas de direita a condicionar as opções da chanceler.
Em Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental, a CDU (19% dos votos) foi, pela primeira vez desde o pós-guerra, superada por um partido à direita, a Aliança pela Alemanha (21%), empenhada no repúdio por emigrantes e refugiados.
Num estado pouco relevante – 1,6 milhões de habitantes, acolhendo apenas 12 mil pessoas da vaga de mais de um milhão de migrantes de 2015 – a AfD confirmou a capacidade para captar novos eleitores e descontentes de partidos de direita e extrema-direita, esquerda e extrema-esquerda.
No estado natal de Merkel, o SPD voltou a triunfar (31%) domingo, mas operários, trabalhadores de baixos salários e qualificações, desempregados, na faixa entre os 30 e os 65 anos, revelaram particular atracção pelo populismo anti-emigrantes.
O apelo da AfD, fundada em 2013 para reivindicar a saída do euro e presente em nove Parlamentos estaduais, vai comprovadamente além dos votantes no Leste e irá fazer sentir-se em Berlim.
Na Saxónia-Anhalt, antigo estado da RDA, a AfD chegou aos 24% nas eleições de Abril, e este ano conseguiu igualmente 13% na Renânia-Palatinado, a ocidente, e 13% em Baden-Württemberg, no sudoeste.
A entrada do partido liderado por Frauke Petry no Parlamento federal no Outono de 2017 é um dado adquirido e, caso se confirme também o retorno dos liberais que ficaram abaixo da barreira de representação de 5% nas últimas eleições, será difícil aos cristãos-democratas de Merkel e cristãos-sociais bávaros aspirarem a uma aliança de governo apenas com o SPD.
A estridência antimuçulmana da AfD exclui o partido do eixo de alianças para o executivo federal ou governos estaduais onde se enquadram, à esquerda, a Aliança '90/ Verdes e Die Linke.
O discurso xenófobo de protesto marca, contudo, a discussão política um ano depois do "Wir schaffen das" de Merkel.
A chanceler do "Nós conseguimos" optou por uma política de aceitação irrestrita de migrantes que tentou em vão impor a outros estados da UE, sustentando um imperativo ético de ajuda no argumento economicista de que emigrantes jovens dinamizariam a prazo uma Alemanha carente de mão-de-obra.
Os custos de adaptação, a rejeição de integração, as dificuldades das camadas não-empregáveis Merkel surgem agora nas estatísticas.
Das 322 mil pessoas aceites com estatuto de refugiado, 141 mil estão desempregadas.
A aguardar deportação encontram-se 220 mil, mas a maioria sem condições de retorno dado o estado de guerra nos países de origem.
No primeiro semestre foram acolhidos 220 mil migrantes, acentuando-se a tendência decrescente devido ao bloqueio das rotas de fuga no Sudeste Europeu e ao acordo de contenção de migrações negociado entre a UE e a Turquia.
Predomina a percepção de candidatos a refugiados e emigrantes oriundos do Médio Oriente, Magrebe, Corno de África, Balcãs e Afeganistão como responsáveis pelo incremento da criminalidade e factor acrescido de ameaças terroristas.
Em Munique, Horst Seehofer critica abertamente Merkel, mas o conservadorismo dos aliados bávaros não encontra quem apoiar no desafio à chanceler na CDU.
A ética luterana de Angela Merkel dificilmente lhe permitirá retirar-se, aceitando a ideia de fracasso em tempos altamente incertos, e, assim ao chegar à Convenção da CDU em Colónia no final do ano a sua opção terá, quase por certo, um eco musical.
Tal como num dos derradeiros quartetos de cordas de Beethoven, a resposta a "uma questão difícil" estará no "Es muß sein!"
A chanceler não se poderá furtar a esse andamento e a este "Tem de ser!".
Jornalista
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